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Wellington Moreira Franco - O Estado tem que estimular a atividade econômica

2011 . Ano 8 . Edição 69 - 21/11/2011

Foto: João Viana

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Pedro Cavalcanti e Fernanda Carneiro – de Brasília

“O Estado tem que estimular a atividade econômica”

Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República comenta as transformações ocorridas no Brasil na última década. As marcas desse período, segundo ele, são a ascensão social de milhões de pessoas e a ampliação do mercado interno. Para Moreira Franco, o Ipea terá atuação decisiva no planejamento do desenvolvimento dos próximos anos.

Desafios do Desenvolvimento - Como tem sido a atuação da SAE e quais os planos da sua gestão?

Wellington Moreira Franco - A SAE foi criada na época em que o presidente do Brasil era Fernando Collor de Mello. Com o fim dos órgãos de investigação, como o SNI, entendeu o governo brasileiro que precisava reorganizar na administração a apuração, o manejo e a reflexão sobre informações estratégicas e um planejamento estratégico. Foi criada a SAE, com outro nome na época. Tiveram vários titulares, todos muito ilustres, o Eliezer Batista, o Almirante Mário César Flores, o Ronaldo Mota Sardenberg e o Luiz Gushiken. Finalmente, no governo do presidente Lula, ele resolveu transformar a Secretaria em Ministério. E vieram outros dois ilustres pensadores. O professor Mangabeira Unger e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. A Secretaria tem uma história antiga, mas o nível de institucionalização ainda é muito precário.

Desenvolvimento - O senhor falou em dar mais institucionalidade à SAE. Como será feito isso?

Moreira Franco - O órgão público exige isso, não dá para você deixar que o produto do trabalho dele seja estritamente dependente dos impulsos intelectuais daquele que está, eventualmente, no comando. Segundo ponto, a SAE é um órgão do Poder Executivo, então, em que pese o Ipea estar vinculado à SAE, ela é diferente do Instituto. O Ipea é um órgão de pesquisa aplicada, que tem não só demandas do governo, como também perguntas a serem respondidas pelo seu quadro técnico. Ele busca fazer pesquisas para servir à administração pública e que sustentem políticas públicas, diferentemente da universidade que, quando define um tema de pesquisa, não há nenhum compromisso com a aplicação na realidade. Ela tem sim valores e medidas no plano teórico, com nível de abstração alto. A lógica de avaliação acadêmica é diferente da avaliação dos trabalhos do Ipea e da SAE. Um órgão do Poder Executivo tem que produzir, tem que ter nos seus desafios o compromisso em apresentar um produto. O produto da SAE é a formulação de política, seja social, seja na área econômica, seja agora na área de defesa. Essas são as três áreas nas quais a SAE está organizada para atuar, pensar e produzir. Fez-se um esforço, na área social, econômica e agora na área de defesa para saber quais os desafios para que possamos ter o país que queremos no futuro.

Desenvolvimento - Que país a SAE vislumbra?

Moreira Franco - Um país que seja justo, que seja democrático, que seja rico e que, como a presidenta Dilma diz, seja a quinta economia do mundo. Isso implica mudanças de qualidade. Não chegaremos a ser a quinta economia do mundo com a qualidade de educação que é oferecida, com o ambiente de inovação e empreendedorismo que existe no país, ainda muito limitado e muito acanhado para esse desafio.


Perfil

Wellington Moreira Franco nasceu em Teresina, Piauí, em 1944, e mudou-se ainda jovem com a família para o Rio de Janeiro. Aos 15 anos de idade, iniciou-se na política estudantil secundarista e seguiu o mesmo caminho quando entrou na universidade. Em 1964, ingressou na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil. Três anos depois transferiu-se para o curso de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Doutorou-se na França pela Sorbonne. “Voltei e dei aula na Universidade Federal Fluminense, na Faculdade de Economia e Administração”, conta ele. Em 1974, foi eleito deputado federal pelo MDB. Dois anos depois, venceu as eleições para a prefeitura de Niterói. Exerceu no total três mandatos de deputado federal e foi eleito governador do Rio, em 1986. Mais tarde, foi assessor especial do presidente Fernando Henrique Cardoso. Em 2002, elegeu-se novamente deputado federal e, em 2007, foi vice-presidente da Caixa Econômica Federal. Agora é ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos.

Desenvolvimento - Como a SAE se articula com o demais ministérios?

Moreira Franco - Temos duas linhas de respostas. Uma são aquelas feitas aqui dentro, são os nossos produtos. Por exemplo, na área social, temos colocado cinco pontos sobre os quais estamos trabalhando. Um é no programa de erradicação da miséria. A SAE, com os técnicos que tem, vem participando junto ao Ministério do Desenvolvimento Social na formulação do plano, nos levantamentos e nas avaliações das políticas. Nós temos um programa para a primeira infância, de zero a três anos. Pretendemos, no máximo, até o começo do ano que vem, oferecer uma política estruturada e colocar à disposição dos Estados, municípios e da própria União. Vamos testar essa política na cidade do Rio de Janeiro e na cidade de Niterói. Estamos iniciando um trabalho sobre favela, um grande desafio que se tem. Há mais de um século se pensa em habitação popular, em vilas operárias, conjuntos residenciais, grandes, pequenos, médios, programas de melhorias em áreas de favela, mas a questão central não está enfrentada ainda pelo poder público no Brasil. A política é de remoção ou a política é de melhoria, de qualificação de transformação em bairro? O poder público, as lideranças políticas, o pensamento político brasileiro não fez uma opção clara. O próprio Favela- -Bairro, de alguma maneira, contorna o problema. Para resolver, para remover, tem de fazer o que Negrão de Lima fez, Lacerda fazia, etc. Para fazer a melhoria do bairro, nós temos que enfrentar um grande desafio que é a regularização fundiária na área urbana. Hoje é mais grave que na área rural.

Foto: João Viana
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Desenvolvimento - Qual é a dimensão do problema?

Moreira Franco - Se você vai às áreas metropolitanas, sobretudo nas regiões periféricas, essa questão imobiliária é um problema gravíssimo. Você tem volume brutal de ativos. Pessoas trabalham, investem e melhoram suas casas, e aquilo não tem dono. Quer dizer, se houver qualquer problema, ele não tem os instrumentos legais para ir ao Poder Judiciário e arbitrar conflito nenhum. Se a política é de melhoria, e a experiência internacional mostra que essa linha é melhor que a outra, certamente vamos ter de enfrentar a questão da legalização fundiária. Na cidade do Rio de Janeiro, mais de 50% das residências não são legais.

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Desenvolvimento - É um problema social, mas também econômico.

Moreira Franco - Exatamente. Você trabalha, investe e aquilo não tem valor nenhum, valor econômico, é um ativo morto. E nós não conseguimos, no Brasil, até agora, uma política adequada para a questão da juventude, duramente falando, nas áreas de periferia, das grandes cidades. Se o jovem não vai ser jogador de futebol ou funkeiro, a probabilidade de ele ser absorvido pelo tráfico é imensa. Você pega todos os índices, são muito ruins. A educação formal, a educação profissionalizante, o acesso à cultura, a qualificação pro emprego, é tudo muito ruim. A expectativa de vida é muito baixa, tem áreas na cidade do Rio de Janeiro em que a expectativa de vida chega a 22 anos. Você tendo seu irmão, seu vizinho, seu amigo, seu colega, ao seu lado, morrendo e, normalmente, com morte violenta, o valor que você dá à vida é nenhum. Aquilo passa a ser uma coisa absolutamente frugal.

Desenvolvimento - A SAE é uma instituição propositiva, talvez seja por isso que o “conselhão”, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), tenha sido integrado à Secretaria. Qual a importância desse conselho?

Moreira Franco - O Conselho é um órgão político da maior importância. Ele é sobretudo eficaz em momento de crise, por reunir lideranças de diversos setores da sociedade: empresários, trabalhadores, movimentos sociais, intelectuais, personalidades que formam opinião. Essas pessoas são convidadas a discutir as questões que afligem, que mobilizam, que estão presentes. O Conselho, nesse período de crise, ajudou o presidente Lula e os próprios setores que o compõem a compreenderem a crise. Quando o presidente Lula disse “nós temos que consumir”, o Conselho trouxe quais as dificuldades que naquela época existiam lá embaixo para o trabalhador, para a dona de casa e para a família aumentar seu consumo. Foi criado um ambiente no qual se colocam ao redor de uma mesa pessoas que tem interesses divergentes e que discutem e formulam.

Desenvolvimento - O que deve pautar as discussões do Conselho?

Moreira Franco - Temos uma pauta muito comprometida com a questão tributária. Ou seja, temos de enfrentar os gargalos para que tenhamos um país com um ambiente estimulante para o empreendedorismo, para a inovação e em que possamos sonhar em ter as mesmas facilidades que o inventor do Facebook teve. Se aquele rapaz estivesse aqui hoje no Brasil, ele jamais conseguiria ter uma empresa com o patrimônio que tem, porque o ambiente institucional não é favorável. Vai ter que se mudar tanto a parte tributária, parte fiscal, parte de organização e da engenharia legal.

Desenvolvimento - Alguns setores criticam o Estado planejador e interventor como uma limitação à democracia. O que o senhor acha dessa questão?

Moreira Franco - Velha, já passou... O grande avanço que nós tivemos é que algumas questões tanto macroeconômicas como macropolíticas, macroideológicas, já foram superadas. Nós temos a questão macroeconômica resolvida. A sociedade brasileira não quer inflação. A presidenta Dilma entendeu claramente esse sentimento, tanto que tem mantido uma posição muito atenta e muito rigorosa, para evitar que a inflação volte. Diante desse quadro, eu creio que o Estado tem que ter presença, o Estado tem que fazer e estimular a atividade econômica, sobretudo em áreas que você não tem a presença do setor privado. O Estado tem que estimular e criar condições para que o país cresça.

Desenvolvimento - Sobre a presença do Estado, o senhor não acha que ainda temos muito a avançar na gestão pública?

Moreira Franco - Este é outro problema. Acho que, hoje, tanto o pensamento econômico, político, social quanto a prática governamental estão muito mais voltados para o micro, para a microeconomia e para os problemas concretos, do que propriamente para as grandes questões. Os fundamentos macroeconômicos já estão dados, vamos resolver o problema da infraestrutura, vamos resolver o problema do crédito, vamos resolver o problema do sistema bancário, que está sendo pressionado por uma clientela nova de 49 milhões de pessoas que chegaram e que têm operações financeiras com seus créditos. Outra coisa é a qualidade das políticas públicas, tanto sociais quanto econômicas etc. Isso é um grande desafio. Agora há a necessidade de termos um sistema de avaliação de política pública. A avaliação evidentemente não pode ser feita por quem executa. É necessário montar uma governança desse processo que permita que as políticas sejam elaboradas, executadas e acompanhadas pelos órgãos de controle e que elas sejam avaliadas. Os programas têm que ter foco. Não adianta você ter programas que tenham vários objetivos, porque você perde o foco.

Foto: João Viana

O Conselho é um órgão político da maior
importância. Ele é sobretudo eficaz
em momento de crise, por reunir
lideranças
de diversos setores da
sociedade: empresários, trabalhadores,
movimentos sociais, intelectuais,
personalidades que formam opinião

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Desenvolvimento - Quais devem ser as prioridades do Brasil para os investimentos, para o longo prazo, o desenvolvimento sustentável?

Moreira Franco - Acho que temos três problemas. Precisamos melhorar o ambiente institucional para o empreendimento. Criar ou fechar uma empresa no Brasil é muito complicado. Isso desestimula você a se organizar, a exercitar sua capacidade criativa. O mundo hoje mudou muito, valores como permanência em emprego hoje é uma coisa que tem bolor, é bolorento. Antigamente você media a eficácia de uma pessoa, sua referência e competência pelo tempo que ela estava no mesmo trabalho. Do jeito como as coisas são hoje, esse tempo que você está no mesmo trabalho é visto ao contrário de antes. A pessoa boa está numa rotação que muda não só de trabalho, de empresa, mas muda de cidade, de país. A mobilidade é muito grande. Você precisa mudar o ambiente. A segunda coisa que eu acho é que a poupança privada e pública no Brasil é muito baixa. Consequentemente, o investimento passa a ser baixo.Temos que aumentar a nossa capacidade de poupar, se nós quisermos ser a quinta economia do mundo.

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Desenvolvimento - Há muita dificuldade do Estado para planejar o investimento e efetivar esse investimento. O País ainda precisa superar o problema, para conseguir avançar na infraestrutura? Há muita polêmica envolvendo a preparação para Copa e Olimpíadas, por exemplo....

Moreira Franco - A questão está vinculada diretamente ao custo Brasil. É muito caro viver no Brasil, tudo é muito caro. A cidade do Rio de Janeiro chega a ser uma coisa afrontosa. É cara a comida, é caro o vestuário, é caro o transporte. É caro o metro quadrado do apartamento. E evidentemente isso é consequência de uma debilidade na nossa capacidade de infraestrutura. Para diminuir o custo Brasil nós precisamos investir em infraestrutura. O sistema portuário é totalmente ineficaz, o sistema de acesso aos portos. Nós destruímos nosso sistema ferroviário há quase um século e não conseguimos remontar. Não temos aqui sistema fluvial. Nós vemos na imprensa, porque vamos ter os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo, os aeroportos. Isso é uma bobagem total. São três milhões de pessoas a mais durante um pequeno espaço de tempo que vão demandar a nossa rede de aeroportos. Mas o problema não são os três milhões, o problema são os trinta milhões de brasileiros que entraram no sistema e que usam aviões e aeroportos. Você toma um café no aeroporto, há uma fila, uma coisa complicada. O avião atrasa, não respeita, ninguém sabe, muda de finger. Esse problema também é uma questão de cultura. A relação do poder público com o cidadão no Brasil melhorou muito depois da Constituição de 1988. Mas o Estado trata muito mal o cidadão. No fundo, quando nos livramos de Portugal, na Independência, nós pensávamos que estávamos rompendo um laço colonial, mas na realidade o Estado brasileiro se transformou na corte, em Portugal. O cidadão continuou colonizado.

Desenvolvimento - O senhor citou essa nova classe consumidora. Qual deve ser a atuação do governo federal nesse sentido, para intensificar o processo de ascensão dessas pessoas?

Moreira Franco - Nós não sabemos quem é a nova classe média. Quais os valores da nova classe média? Segundo, por que uns conseguiram entrar e outros não. Foi deficiência da política social? Ou é um problema da pessoa? Se é uma deficiência da política social, vamos mudá-la. Se é um problema das pessoas, vamos saber que problema é, para ver como ajudá-las a superar isso. Nem todos foram para a nova classe média. A política social é uma ferramenta que o Estado coloca à disposição do cidadão para ele aproveitar o ambiente de crescimento econômico. A política social sem crescimento econômico não existe. O que existe é um assistencialismo que você dá diretamente porque não tem nada, só aquele dinheiro que o Estado dá. É a única política que tem. Ela tendo um ambiente de movimentação econômica, você então dá uma ferramenta para que o cidadão aproveite aquele ambiente e vá em busca da sua realização. Tivemos na última década uma situação extremamente favorável. Criaram-se 15 milhões de novos empregos. Há permanência do emprego.

Em janeiro de 2010, pela primeira vez tivemos a população economicamente ativa majoritariamente formalizada. Tivemos uma política de salário mínimo que deu ganho real, efetivo. Isso tudo gerou um ambiente de muita confiança. As pessoas saíram das aflições da luta pela sobrevivência para aspirarem a ter seu apartamento, a dar uma melhor qualidade de vida aos próprios filhos...

Desenvolvimento - Mas a volta de uma crise pode comprometer a confiança. Como nos prepararemos?

Moreira Franco - Hoje há um personagem político novo no cenário político e eleitoral brasileiro. Na eleição futura, de 2014, provavelmente o número de jovens da nova classe média será um eleitorado maior que a soma da A e da B. Há uma demonstração de pujança nisso. Nós queremos preservar esse ativo. Para sermos a quinta economia do mundo, precisamos ter uma classe média sustentando isso. E que seja a ampla maioria do país.

Desenvolvimento - As desigualdades regionais também têm diminuído. Como o país pode intensificar essa mudança?

Moreira Franco - Outra coisa é o regional. Eu acho que esse é um grande desafio que nós temos. O presidente do Ipea, o Marcio Pochmann, me trouxe aqui uma ideia pela qual, segundo ele, vem lutando há algum tempo. Nós precisamos de planejamento regional. Até o Sudeste precisa. O problema do Sudeste não é o problema do Nordeste. Temos uma região que vai de Campos até São Paulo, pega um pouco de Minas Gerais, que é o maior PIB da América do Sul. Lá há uma concentração de centros de pesquisa e universidades, onde a inovação, mesmo baixa, se dá de forma mais elevada na América do Sul. É onde você tem a mais complexa infraestrutura, os mais diversos equipamentos culturais. E que as decisões tomadas ali influem, não só no Brasil, mas em todas as capitais. Aquilo precisa ser pensado como uma unidade. Da mesma maneira que você precisa no Nordeste, você precisa na Amazônia e você precisa no Centro-Oeste. E no Sul. Todo o esforço que os governos estaduais e o próprio governo federal fizeram para a montagem de organismos que aglutinassem pessoas com capacidade intelectual, teórica e acadêmica para pensar o planejamento regional, caiu. Não foi bem sucedido, por diversas razões. Eu creio que seria útil nós pensarmos, e é o que ele propõe, você começar a pegar o que sobrou de experiência do Ipea. O Ipea foi criado para ser o órgão nacional. E o próprio governo federal estimulava os Estados a terem seus órgãos de pesquisa aplicada. E não deu certo. Nós temos que pegar o que deu certo e tentar levar esse gérmen para esses locais, para aglutinar esse pensamento. Com o tempo, cada um se forma, vai ter sua personalidade, vai ter seu caráter e sua organização própria.

Mas, neste momento, eu concordo com ele que é preciso haver um certo estímulo protecionista, e acho que a melhor maneira seria dar ao Ipea a condição organizacional regional, para que ele aglutine economistas, pesquisadores, engenheiros e cientistas de boa qualidade para pensar o desenvolvimento regional.

Desenvolvimento - O Ipea tem 47 anos. Qual é a sua avaliação sobre o Instituto?

Moreira Franco - O Ipea foi uma referência de pensamento, de reflexão e de estudos para várias gerações, mesmo sendo um órgão de governo. Acho que temos uma dívida com o ministro [João Paulo dos Reis] Velloso. Ele, em plena ditadura, preservou o Ipea. E isso permitiu o debate sobre a distribuição de renda. O grande ponto de inflexão foi o tal milagre econômico. Ele começou a ser questionado quando se disse “mas que tipo de cidadão, de brasileiro, nós estamos produzindo com esse milagre?”. Que distribuição, qual estrutura social do País? E veio do Ipea, do governo, e incendiou a sociedade brasileira inteira, todas as universidades e centros de pesquisa. Os pensadores todos passaram a nutrir a pergunta de que país nós estamos construindo. Isso foi a semente que nos fez chegar à Constituição de 1988. Sem falar de questões como a qualidade da produção acadêmica, da qualidade da produção científica, da qualidade da produção das políticas públicas, da qualidade dos quadros que ao longo desses 47 anos entraram e saíram do Ipea para os diversos órgãos da administração pública, esse simples fato de o Ipea ter sido uma força motriz do processo de se pensar o Brasil e mudar o Brasil é um legado que esses 47 anos deixa para a sociedade.

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Desenvolvimento - A questão dos royalties do pré-sal trouxe para a discussão a estrutura federativa do País. Nosso federalismo é competitivo? É um obstáculo ao desenvolvimento do país?

Moreira Franco - O pré-sal nos coloca tantos problemas... Os Estados brigam. Esse modelo tributário brasileiro é um modelo equivocado. Ele tem de ser repensado. Primeiro porque o Estado não é dono de dinheiro, é um equívoco o governador falar do “meu orçamento”, do “meu dinheiro”, “eu estou perdendo”, “o Estado está perdendo”. O dinheiro não é dele, você só perde o que é seu. O que é de todos é de todos. Isso é de todos. Eis aí uma questão federativa. É absolutamente incompreensível que a energia você pague na origem e o petróleo você pague na boca, no consumidor, no destino. Por que ter dois critérios? Por que a energia elétrica é uma sistemática e o petróleo é outra? Além disso, o ganho que o pré-sal desenha é um ganho do País. E olha que sou do estado do Rio de Janeiro e acho que, no ambiente em que nós estamos vivendo, o Rio fez bem em brigar como brigou, pois essa é a regra do jogo.

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O Conselho é um órgão político da maior importância. Ele é sobretudo eficaz em momento de crise, por reunir lideranças de diversos setores da sociedade: empresários, trabalhadores, movimentos sociais, intelectuais, personalidades que formam opinião

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Desenvolvimento - Há um estímulo à competição entre os Estados?

Moreira Franco - Exatamente. Acho que essa regra tem de ser questionada. Não acho que ela seja a regra que mereça existir num país que nós queremos que seja a quinta economia do mundo. A regra que obriga você a pagar 25% de ICMS na telefonia e é um absurdo total. Não tem cabimento. Nós pagamos o imposto mais caro do mundo: 25% na eletricidade que você usa... E aí o custo da eletricidade está provocando a desindustrialização do Brasil. Um caso concreto: é mais barato produzir gás no Golfo do México, trazer pro Brasil, vender no Brasil e pagar todos os custos de importação, do que produzir no Brasil, por causa do preço da energia. Como pode uma coisa dessas? Eu creio que temos de começar a questionar esse grande arcabouço legal, institucional, que estamos vivendo. Ele já dá sinais de exaustão. Ele já não atende a necessidade do povo brasileiro. No caso dos royalties do pré-sal, o dinheiro é da nação. O orçamento dos Estados não é dinheiro do Estado, no fundo o caixa é um só. Nosso federalismo é muito conceitual. Se você pega a história do Brasil até agora, você vê momentos de abertura e momentos de centralização. O que não corresponde a práticas democráticas. Também tivemos momentos de ditaduras e de democracia, mas esses períodos não são coincidentes. Não é porque estamos na ditadura que nós centralizamos. A Constituição de 1988 colocou mais recursos no município. O bolo foi distribuído numa proporção menor para os Estados e menor para a União. Em plena democracia, com o Congresso funcionando, com o País crescendo, o que a União fez com apoio do Congresso? Foi mudando a legislação, criando espantalhos, monstros, que fizeram, ao longo do tempo, a inversão desse sistema. Então a federação é uma ficção teórica porque o pressuposto primeiro dela é o recurso. Aqui não, aqui nem sei qual é o pressuposto primeiro. Creio que a discussão sobre a federação, em algum momento terá que vir. Acho que não há ambiente ainda para ela ser discutida. Mas não tenho dúvida de que em algum momento vai haver, porque é impossível um país deste tamanho, com a diversidade regional que tem, viver com os recursos concentrados na União. Não dá. A gente vive e mora no município.

 
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