resep nasi kuning resep ayam bakar resep puding coklat resep nasi goreng resep kue nastar resep bolu kukus resep puding brownies resep brownies kukus resep kue lapis resep opor ayam bumbu sate kue bolu cara membuat bakso cara membuat es krim resep rendang resep pancake resep ayam goreng resep ikan bakar cara membuat risoles
Endividamento - A sedução do crediário

2008 . Ano 5 . Edição 42 - 15/04/2008

Por Luiz Fernando Dutra, do Rio de Janeiro

Com expansão vertiginosa, o crédito no Brasil foi elevado à condição de estrela pelos meios de comunicação. Em fevereiro deste ano, o volume de empréstimos e financiamentos concedidos pelo sistema financeiro foi de R$ 957,6 bilhões, com crescimento de 1,1% em relação a janeiro deste ano e de 27,9% ante fevereiro de 2007. A relação entre o crédito e o Produto Interno Bruto (PIB) chegou a 34,9%, ante 30,9% em fevereiro do ano passado. Os empréstimos para pessoas físicas alcançaram R$ 250,7 bilhões, com crescimento de 25% em 12 meses e de 1,7% na comparação com janeiro deste ano. E a inadimplência manteve-se estável, em 7,1%. Todos os dados são do Banco Central (BC).

Embora tenha informações completas sobre o que ocorre com o crédito no Brasil, o site do BC não informa o que aconteceu com quem pegou o dinheiro emprestado. Será que o tomador de empréstimo continua empregado? Teve aumento de salário? Quanto de sua renda está comprometido com o pagamento de empréstimos? São respostas difíceis de encontrar, porque ainda não existe no Brasil uma pesquisa que revele o grau do endividamento das famílias e das empresas e que sirva como base para os gestores de políticas públicas tomarem decisões.

BANCOS Uma força-tarefa formada pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda, pelo BC e pelo Ministério da Justiça (MJ) está realizando um estudo sobre a regulamentação do segmento de crédito no Brasil. O trabalho inclui a realização de uma pesquisa para identificar o perfil dos consumidores que utilizam cartões de crédito. Segundo uma fonte envolvida nessa tarefa, ela ainda está em fase preliminar e deverá ser concluída em junho.

Alguns bancos, como o Bradesco, fazem pesquisas, para uso interno, sobre o comprometimento da renda dos seus clientes. Segundo o diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do banco, Octavio de Barros, são informações importantes para as decisões na área de financiamentos. "Uma pesquisa nesse sentido seria muito boa para o mercado e para o próprio governo. É importante saber as mudanças que a expansão do crédito trouxe para a economia. Esse crescimento mudou a 'cara' do mercado de crédito", diz Barros.

Outro argumento dele a favor da realização desse tipo de pesquisa é que "as que temos atualmente são feitas com informações secundárias e superficiais". Barros prevê que o crédito no Brasil chegará perto de 40% do PIB até o final do ano. "Com exceção do crédito hipotecário, que representa apenas 1,5% do PIB, o que é muito baixo se comparado ao que acontece em outros países, no crédito ao consumidor o Brasil não está defasado com relação aos demais países."

A empresa de consultoria Tendências elaborou um indicador, o Índice Tendências de Endividamento Oneroso (Iteo), que avalia a taxa de expansão do crédito em comparação ao aumento da capacidade de endividamento das pessoas físicas. E a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), segundo seu economista-chefe, Nicola Tingas, chegou a planejar uma pesquisa sobre o endividamento das pessoas físicas, mas o projeto ainda não foi adiante. Por enquanto, ninguém bateu na porta do consumidor de crédito para saber como ele vai pagar as prestações agora que, por hipótese, ficou desempregado.

FAMÍLIAS "Do ponto de vista macroeconômico, é importante saber, por exemplo, o que aconteceria no caso de uma inflação alta, que desestabilizasse o orçamento doméstico. É preciso entrevistar as famílias e desenvolver uma metodologia para aferir o grau de endividamento delas", afirma João Sicsú, diretor de Estudos Macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A falta de uma pesquisa como essa não é uma falha apenas brasileira. De acordo com o professor Fernando Cardim de Carvalho, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), essa é uma lacuna não preenchida em quase todos os países. "O sistema financeiro mais avançado do mundo", diz Cardim, "com os reguladores considerados os mais preparados do mundo, como é o caso americano, deixou passar o crescimento da faixa subprime do financiamento imobiliário a um ponto que só agora começamos a avaliar." Nem o reverenciado Alan Greenspan, quando era presidente do Federal Reserve Board (FED, o banco central dos Estados Unidos), se deu conta do que estava acontecendo, acrescenta.

"É assim que se aprende", continua Cardim. "Endividamento de famílias nunca pareceu um problema importante de regulação financeira. Era nas relações com empresas ou entre instituições financeiras que estavam os focos tradicionais de instabilidade. Agora, o mundo está descobrindo que informações mais adequadas e detalhadas sobre o endividamento de famílias podem ser cruciais para a formulação de regulação prudencial", assinala o professor. Com a economia do mundo cada vez mais globalizada, a inadimplência de um, multiplicada pela inadimplência de outros milhões, pode provocar um verdadeiro terremoto na economia brasileira, americana ou mundial. Tudo depende da escala, explica Sicsú, do Ipea.

"No Brasil, a maior parte do aumento do crédito vem do crescimento do emprego com carteira assinada. Este trabalhador tem muito pouco poder de barganha, ao contrário do camelô ou do autônomo, que não dependem de uma renda estável como o salário para viver. Em caso de desaceleração da economia, o aumento do desemprego também provoca o não pagamento das dívidas. O sistema financeiro sofre o primeiro impacto, mas como ele é muito capilarizado no sistema produtivo, este também acaba sendo atingido. O passivo dos indivíduos é o ativo dos bancos. O desemprego do consumidor endividado pode potencializar a desaceleração da economia", afirma Sicsú, mas esclarece que "ninguém espera um quadro desses para o Brasil nos próximos anos".

CICLO SADIO Para Tingas, da Febraban, uma pesquisa sobre o nível de endividamento será muito útil para o país, embora ele não veja riscos para o Brasil nesse momento. "O fator de propulsão do crédito é o aumento da renda e da produtividade", diz. Ele qualifica o ciclo atual como sadio, mas considera que "seria bom, e muito mais seguro, se houvesse um acompanhamento do grau de endividamento das famílias". Para o economista, "quando o consumidor compromete mais de 30% da sua renda líquida com pagamento de dívidas, a situação fica perigosa. Em 1989, durante o Plano Verão, ainda não havia o hábito de planejamento financeiro. Os bancos correram muitos riscos, e as perdas acabaram sendo enormes".

Tingas diz acreditar que a chegada do cadastro positivo será benéfica para o sistema financeiro, pois vai reduzir o risco das instituições financeiras na hora de conceder o crédito. Ele também ressalta que surgiram modalidades mais seguras, como o crédito consignado, cujo risco é muito baixo. "Por enquanto a expansão do crédito tem acontecido de maneira sadia, acompanhando o crescimento da economia. Acredito que essa situação continue nos próximos anos. A previsão dos bancos, para a carteira total de crédito, é de 21,82% para 2008 e de 19,57% para 2009. Para o segmento de pessoas físicas, as previsões são de 25,92% neste ano e de 23,31% em 2009", diz.

De acordo com o professor Cardim, o problema está na demanda. Para ele, a oferta de crédito no país é mapeada razoavelmente pelo BC e pelas associações e instituições privadas, mas a demanda é "um verdadeiro buraco negro", pois "sabe-se muito pouco sobre como os agentes privados financiam seus gastos, sua solvência e liquidez. Dados assim são fundamentais para a análise de flutuações da economia, como se está vendo no momento na crise americana", afirma.

"Conhecer com alguma precisão o grau de comprometimento de suas rendas correntes com o pagamento de juros e da liquidação dos seus débitos, no caso das famílias, devidamente classificadas por critérios relevantes com classe de renda, tipo de emprego, localização geográfica, entre outros, permitiria conhecer o grau de fragilidade de sua posição financeira", acrescenta. Este tipo de informação, segundo o professor, teria utilidade também para análises de longo prazo, permitindo identificar as formas de passivos mais funcionais para o financiamento de gastos das famílias. "O mesmo valeria para as empresas, uma informação ainda mais importante para a análise macroeconômica", diz.

COMÉRCIO A pesquisa Perfil do Consumidor, feita em vários estados pelas federações do comércio, é um dos poucos parâmetros que o mercado tem para avaliar o orçamento familiar dos brasileiros. Segundo João Carlos Gomes, economista da Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio- RJ), na pesquisa realizada em fevereiro, uma pergunta feita aos consumidores era se tinham algum pagamento atrasado. O sim recebeu 15% do total e o não, 84%. Outra pergunta foi: depois de pagar todas as contas, o seu orçamento tem sobra e/ou fica em equilíbrio? A resposta foi positiva em 72% dos casos. "O resultado da pesquisa mostra que ainda existe um potencial significativo para a expansão do crédito no Brasil", diz. Gomes projeta esse crescimento para 40% do PIB neste ano, 45% em 2009 e 50% em 2010.

Os economistas Denis Blum e Ana Carla Abrão Costa, da Tendências Consultoria, responsáveis pela criação do Iteo, explicam que o índice quer descobrir a partir de quando o crédito se torna oneroso para as famílias. A proposta do índice, segundo Blum, é avaliar se a expansão do crédito, nos 12 meses anteriores, foi superior ao aumento da capacidade de endividamento. "O exemplo é simples: com taxa de juros e prazos melhores, um consumidor, com a mesma prestação, consegue um financiamento maior. Se antes ele podia financiar parte do carro, agora, com as condições mais favoráveis, consegue colocar o carro inteiro dentro da prestação, comprometendo a mesma parcela de renda", explica Blum.

O índice, segundo o economista da Tendências, não apura o grau de endividamento das famílias ou o comprometimento da renda das famílias brasileiras com o pagamento de empréstimos. Numa breve análise, Blum e Ana Carla explicitam o objetivo do estudo: "Do ponto de vista agregado, o mercado de crédito no Brasil ainda é pequeno, concentrado nas regiões mais ricas e caracterizado ainda por prazos muito reduzidos. Com isso, é de esperar que haja, mantidas as condicionantes de renda, emprego e estabilidade macroeconômica, um espaço grande de expansão saudável. E é essa conjectura que iremos explorar".

"Acho que uma pesquisa para mensurar o grau de endividamento das famílias não vai ter precisão absoluta. O BC, que tem acesso aos dados necessários para essa pesquisa, teria que estudar uma maneira de utilizar as informações, como número de tomadores, classe a que pertencem, entre outros. O BC já trabalha com alguns instrumentos, como a exigência de os bancos informarem todo crédito acima de R$ 5 mil. Mas ainda não é o ideal. Seria bom se tivéssemos uma idéia sobre como, por exemplo, temos 50 mil pessoas tomando crédito, mas o universo é de 400 mil", diz Blum.

Segundo ele, a expansão da capacidade de pagamento das famílias absorveu 100% do crédito concedido no ano passado. No final de 2007, segundo Blum, houve uma pequena deterioração. "Muito menor que a de 2005. A inadimplência ficou um pouco maior. Mas não esperamos uma forte reversão no cenário brasileiro", avalia, acrescentando que essa pequena deterioração mereceria uma "luz amarela fraca". "O problema deve se ajustar, mas se não começar a melhorar até junho, aí sim vai preocupar", alerta.

MASSA SALARIAL Para Fábio Silveira, economista da RC Consultores, especialista em crédito, ainda não existem motivos para preocupação no curto prazo. O sinal de alerta dele começa no segundo semestre deste ano, quando o ritmo de atividade econômica deverá diminuir um pouco, tornando-se ainda mais lento a partir de 2009. "Estamos longe de uma crise de crédito, mas ficaria preocupado se a curva de crescimento do crédito se mantivesse em 25% ao ano e o da massa salarial se estabilizasse a partir de 2009."

Segundo Silveira, a atual explosão do crédito deve-se à estabilidade econômica alcançada nos últimos 12 anos e às taxas de juros relativamente mais baixas, embora o juro real brasileiro ainda seja o mais alto do mundo. "O bom momento deve ser aproveitado com sabedoria", adverte, "para evitar problemas como os ocorridos em 1997 e 1998", quando várias redes de lojas - como Mappin, G. Aronson e Mesbla - quebraram após expandirem fortemente o crediário, com o lançamento de cartões próprios, quando a taxa básica de juros Selic estava muito mais elevada do que hoje.

"Foi uma loucura. A economia parou de crescer e todas elas quebraram. O Brasil ainda está atrás dos grandes países emergentes em matéria de crédito. Mesmo assim, o crescimento tem sido muito rápido. Há cinco anos, o crédito era três vezes maior que a massa salarial, e atualmente é oito vezes maior", compara.

Embora afirme acreditar que o nível de fragilidade financeira das famílias e empresas privadas no Brasil ainda seja muito pequeno, o professor Cardim considera importante a criação de uma pesquisa sobre o grau de endividamento das famílias. Para ele, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) poderia realizá-la.

"Seria como uma pesquisa contínua com uma amostra de famílias. Não há razão nenhuma para que uma instituição como o IBGE, com sua experiência, não possa empreender um trabalho deste tipo", diz Cardim, acrescentando que as informações sobre o grau de endividamento das famílias poderiam ser utilizadas na formulação de regras de regulação prudencial, por exemplo, evitando-se o risco de crise como a do segmento subprime do crédito imobiliário americano.

 
Copyright © 2007 - DESAFIOS DO DESENVOLVIMENTO
É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação sem autorização.
Revista Desafios do Desenvolvimento - SBS, Quadra 01, Edifício BNDES, sala 1515 - Brasília - DF - Fone: (61) 2026-5334