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Benefício Continuado - O difícil direito à tranqüilidade

2008 . Ano 5 . Edição 45 - 05/07/2008

Por Durval Guimarães, de Belo Horizonte

Equecido pelos holofotes que dirigem o seu foco apenas para o desempenho do Bolsa Família, outro programa social, o Benefício de Prestação Continuada de Assistência Social (BPC), vem se revelando uma mão protetora no amparo aos brasileiros idosos ou com deficiência incapacitante para a vida independente e para o trabalho. A dimensão do seu trabalho é gigantesca: ao final do ano passado, o número de pessoas beneficiadas já alcançava 2,68 milhões, e elas recebem um salário mínimo mensal - bem acima dos valores pagos pelo Bolsa Família. Com isso, o BPC somou gastos públicos de R$ 11,5 bilhões em 2007, e para este ano tem orçamento previsto de R$ 15,4 bilhões, quase 50% acima dos R$ 10,4 bilhões que o Programa Bolsa Família repassará este ano. Segundo a assistente social Juliana Rochet, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o BPC é uma importante inovação da política social e se fundamenta no princípio da solidariedade social para com as pessoas incapacitadas.

"O programa é pioneiro na concessão de benefícios voltados para pessoas até então excluídas de qualquer mecanismo público de transferência de renda e sua criação trouxe uma mudança no padrão de proteção social brasileiro no campo da garantia de renda, tradicionalmente identifico como os seguros sociais", diz ela.

Mas o BPC não é vitalício. A cada dois anos o benefício é revisto para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. Se a revisão constatar que o beneficiário não mais atende aos critérios de sua concessão, o benefício pode ser suspenso ou encerrado. A avaliação é feita por assistentes sociais, por meio de visitas domiciliares e em instituições de abrigo, para atualizar os dados de composição familiar, renda e outras informações sobre o beneficiário.

No caso da pessoa com deficiência, pode ser realizada uma nova avaliação médica pericial para verificação de alterações na sua situação física. No entanto, as permanentes avaliações, realizadas como um mecanismo de defesa do programa contra fraudes, acabaram resultando em imensa insegurança para os beneficiários. São freqüentes os cancelamentos dos benefícios, que provocam numerosas demandas administrativas e judiciais, pois não há unanimidade no reconhecimento das perícias médicas.

Esses conflitos levaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a assinar, no ano passado, um decreto que alterou as regras de recebimento do Benefício de Prestação Continuada, com prazo para implantação até o final de julho deste ano. Essa medida buscou corrigir algumas distorções acumuladas nas constantes mudanças de leis e normas sobre o BPC. Por exemplo, até agora, a pessoa com deficiência que conseguia um trabalho perdia o benefício e não podia requerê-lo de volta caso saísse do emprego.

REGULAMENTAÇÕES Direito constitucional estabelecido pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado em 1993 pela Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) - a Lei nº 8.742 -, o BPC começou a ser concedido em 1996. Mas sua regulamentação tem sido, há tempos, objeto de debate e controvérsias. A Constituição definiu o direito ao BPC, indicando de maneira genérica o beneficiário como aquele idoso ou deficiente que não possui meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, fixando o valor do benefício em um salário mínimo mensal. Foi a Loas que definiu a idade de acesso para os idosos em 70 anos, com gradual redução para 65 anos, que vigora atualmente, e determinou que o beneficiário precisa ter renda mensal familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo (hoje, esse valor é de R$ 103,75 mensais).

Baixado em 1995 para definir e organizar os processos de gestão daquele benefício, o Decreto nº 1.744 alterou a definição de "pessoa portadora de deficiência" (PPD), o que passou a ocasionar freqüentes divergências de entendimento, gerando heterogeneidade nas avaliações pela perícia médica responsável por atestar a incapacidade, uma vez que o Brasil não possui metodologia unificada para a classificação de deficiências e avaliação de incapacidades com vistas ao acesso a políticas públicas.

Apesar do conceito restrito de deficiência, o decreto de 1995 não havia definido o conceito de incapacidade, dando margem que questões relacionadas ao tema fossem decididas em âmbito judicial (o decreto de 2007 re tomou a definição da Loas). Entretanto, logo após o início da concessão do benefício, nova legislação alterou as regras: a Medida Provisória nº 1.473, de 1997, transformada na Lei nº 9.720, de 1998, redefine o conceito de família utilizado no cálculo da renda per capita para fins de concessão do benefício.

E, em 2003, o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741) estabeleceu que o benefício já emitido a qualquer pessoa idosa da família não conta no cálculo da renda familiar per capita, mas não estendeu essa vantagem às pessoas com deficiência, e atualmente tramitam no Congresso Nacional vários projetos de lei que, caso sejam aprovados, beneficiarão as famílias em que a deficiência afeta mais de uma pessoa, tais como as deficiências de origem genética.

BENEFICIÁRIOS Um exemplo das pessoas assistidas em todo o país é o da empregada doméstica paraibana Marlete Quaresma Mendes, de 37 anos. Seu terceiro filho, Tiago, hoje com 14 anos, é portador de síndrome de Dandy-Walker, que é um tipo de deficiência intelectual provocada por malformação congênita. O garoto apresenta problemas de visão e não consegue se locomover sem auxílio. Graças exclusivamente à proteção do BPC, a mãe teve acesso aos remédios e alimentos para o filho. No caso de Marlete e seus três filhos, as dificuldades excederam em muito às exigências da legislação, pois ela dispõe de emprego regular somente em meio horário e a sua carteira profissional registra apenas o ganho de metade do salário mínimo.

O programa é gerenciado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social, também responsável pelo acompanhamento e avaliação. A execução da perícia para a eleição dos beneficiários e a revisão dos benefícios a cada dois anos são feitas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e os recursos são oferecidos pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS).

As transferências do BPC são feitas mensalmente, usando o sistema bancário, cada beneficiário tem um cartão magnético para o saque do dinheiro. A simplicidade facilita a vida de beneficiários como Marlete. Alguns bancos operam por meio de agências dos Correios, casas lotéricas e estabelecimentos comerciais, o que aumenta substancialmente os espaços de distribuição de benefícios. No caso de os beneficiários não poderem receber o benefício pessoalmente, outra pessoa pode se responsabilizar pelo recebimento das transferências em seu nome.

Isso torna indispensável a inclusão de assistente social na avaliação, pois há grande margem para cada perito determinar quem está ou não inserido no programa. Uma pesquisa mostrou que uma pessoa com deficiência renal crônica seria considerada elegível apenas por 28% dos médicos. Uma criança com anemia falciforme, uma doença genética prevalente em afrodescendentes, com crises regulares de dor, seria elegível ao BPC apenas para 14% dos médicos peritos. Mas, se essa mesma criança tivesse apresentado dois acidentes vasculares cerebrais, o índice de aprovação seria de 90%.

PERFIL DESCONHECIDO Embora o programa seja dedicado exclusivamente a idosos e deficientes físicos em estado de penúria, são escassos os dados disponíveis sobre o perfil dos beneficiários. As principais fontes são os registros administrativos obtidos no momento do cadastramento de novos beneficiários e os dados levantados ao longo dos processos de revisão dos benefícios. Mas o último relatório oficial sobre o tema é de 2002. Diante da precariedade de informações, os técnicos se valem de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), publicada há dois anos.

Segundo essa pesquisa, há a predominância de beneficiários das zonas urbanas, que totalizam 93,2% do universo, com ligeira maioria de mulheres entre os beneficiários, com 52,7% do total. Também entre os idosos, as mulheres são maioria, mas nesse caso pode ser simples decorrência da maior longevidade feminina, já apontada pelas estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em relação à escolaridade da população beneficiada, a pesquisa aponta que 54,4% não possuem sequer um ano de estudos. Em relação aos idosos, 59% não foram alfabetizados.

Na ponta da linha desse programa e no contato direto com os beneficiários está o órgão operador, o INSS, cujo rosto nessa relação são os seus médicos e assistentes sociais, que realizam as perícias, avaliações e concedem ou cancelam os benefícios. Uma das assistentes sociais é Amarillis Las Casas, coordenadora de Serviço Social do INSS em Belo Horizonte. Ela foi admitida por concurso em 1984, ainda muito jovem. Apaixonada pelo seu trabalho, ela considera que foi uma obra do destino colocar a operação do BPC na instituição. Quando o programa foi criado, a operação deveria ser realizada pela Legião Brasileira de Assistência (LBA), instituição federal de caridade social, hoje extinta.

Nos primeiros tempos, a concessão e revisão dos benefícios eram realizadas por qualquer médico e por um funcionário público municipal nas cidades onde residiam os beneficiários. Mas começaram a pipocar denúncias de concessões movidas por interesse político, sem preencher todas as exigências do programa. Houve casos, também, de médicos que trabalhavam no serviço público municipal e que foram demitidos por não concordar em assinar laudos fraudulentos.

Desde que toda a operação passou a ser feita pelo INSS, o quadro melhorou por conta da sua larga experiência na realização de perícias para concessão de licenças e aposentadorias por invalidez. Amarillis esclarece que, no início, não foi tarefa fácil, pois a experiência da autarquia era apenas com o trabalhador, gente que demanda o INSS a partir de 16 anos de idade. "Os benefícios do BPC por incapacidade são concedidos logo depois do nascimento do beneficiário", esclarece.

PAPEL DA ASSISTENTE A assistente social mostra-se otimista com a possibilidade de realização de um novo concurso público para admissão de outras 900 profissionais em todo o país, o que não é realizado há 24 anos, desde que Amarillis foi admitida. Porém, o concurso anunciado no ano passado foi abandonado após a extinção da Contribuição Provisória sobre a Movimentação de Natureza Financeira (CPMF) porque o governo tomou a decisão de reduzir seus custos administrativos.

Caso o concurso seja retomado, os novos funcionários terão como uma das principais tarefas a de participar, junto com os médicos, das perícias para a revisão dos benefícios concedidos a deficientes físicos, que ocorrem a cada dois anos. No momento, essas avaliações são realizadas apenas por médicos, com resultados que ela nem sempre considera satisfatório. Ela cita o exemplo de uma moça sem capacidade de locomoção e residente na favela do Cafezal, em Belo Horizonte. Ela foi considerada apta para o trabalho que lhe foi oferecido no centro da cidade, mas o médico desconsiderou do fato de que não havia ninguém para retirá-la de casa, localizada no alto de um morro, e levá-la ao ponto de ônibus. "Do ponto de vista médico, ela poderia ser capaz, mas, do ponto de vista funcional, não tinha vida independente e, portanto, não poderia trabalhar", afirma.

Amarillis reconhece que, ao se aproximar a época das revisões, os beneficiários se mostram tensos e muitos ficam doentes. A assistente social faz questão de separar os conceitos da incapacidade física, como a paralisia infantil, com o de doenças como câncer ou tuberculose. A enfermidade não é condição para a concessão de benefícios. "As pessoas ficam doentes porque temem perder o dinheiro, tão vital para elas. Às vezes, dez centavos a mais na renda familiar é suficiente para excluir uma pessoa do programa", diz, com certo exagero, mas ressalvando que uma família não é instituição estática.

As pessoas que fazem parte de um núcleo familiar se tornam maiores de idade e obtêm algum emprego, e, com isso, é ultrapassada a renda per capita máxima para se obter o benefício, conta a assistente social. Mas ela pessoalmente considera irrisório o valor de R$ 103,75 mensais, que corresponde a menos de R$ 4,00 por dia. Pelas suas contas, esse é o dinheiro que os miseráveis levam no bolso ao sair de casa para pedir esmolas no centro da cidade. "E isso porque eles saem só com a passagem de ida, já que a passagem de volta e sua alimentação são obtidas com a caridade pública", diz. No entanto, Amarillis qualifica o BPC como uma importante ação de solidariedade social, que contribui fortemente para retirar as pessoas da condição miserável.

 
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