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Desenvolvimento - A maldição do petróleo

2009 . Ano 6 . Edição 48 - 10/03/2009

Por Erich Decat, de Brasília

O Brasil vive hoje um grande dilema: definir o que será feito com as riquezas, de valores ainda inestimáveis, oriundas das reservas petrolíferas na camada do pré-sal. As jazidas, encontradas pela Petrobras, situadas a 7.000 metros abaixo da superfície do mar, se concentram entre o litoral do Espírito Santo a Santa Catarina, ao longo de 800 quilômetros de extensão por até 200 quilômetros de largura. O petróleo encontrado na região engloba três bacias sedimentares - Santos, Campos e Espírito Santo. O governo entende que, para atingir o objetivo, o atual modelo precisa ser inteiramente revisto. A maioria das cidades pequenas e médias que recebem anualmente milhões de reais por meio de royalties, por exemplo, apresenta baixíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). É o que os especialistas chamam de "a maldição do petróleo".

Não há uma estimativa concreta do potencial do pré-sal. Os mais pessimistas falam em algo entre 30 bilhões e 50 bilhões de barris, o que elevaria em cerca de quatro vezes as reservas do País. Mas há quem diga que esse valor pode ser seis vezes maior. Segundo o ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP) Newton Monteiro, o pré-sal pode guardar 338 bilhões de barris. Caso esse número se confirme, o Brasil poderá ser o maior detentor de reservas provadas do mundo. De acordo com os cálculos de Monteiro, se as estimativas estiverem corretas e considerando-se uma produção inicial de 1 milhão de barris por dia e 45 milhões de metros cúbicos de gás diários, o pré-sal poderá render mais de R$ 47 bilhões em arrecadação de royalties, participação especial e impostos, nos próximos 50 anos.

Diante dessa perspectiva, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva considera a descoberta como "uma ponte direta entre riqueza natural e erradicação da pobreza". Mas, para que essa transformação, de fato, ocorra, as autoridades do setor, a classe política e a sociedade organizada têm pela frente o desafio de construir os alicerces dessa plataforma. No centro do debate está a necessidade de uma atualização do sistema regulatório de exploração de petróleo e gás do País. A necessidade de mudança se torna cada vez mais urgente, visto que as regras atuais incentivam a concentração das compensações financeiras pagas pelo uso das jazidas. As distorções dos repasses são reveladas no estudo Sobre Maldições e Bênçãos: é possível gerir recursos naturais de forma sustentável? Uma análise sobre os royalties e as compensações financeiras no Brasil, realizado pelos pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Bruno Cruz e Márcio Bruno Ribeiro.

A pesquisa revela que, apenas em 2007, o Estado do Rio de Janeiro recebeu, sem incluir os recursos do Fundo Especial, mais de 80% dos royalties arrecadados com o petróleo. Mais de 70% do montante foram distribuídos entre os municípios. O Fundo Especial é formado por uma parcela dos royalties paga pelas concessionárias que atuam na plataforma continental. A alíquota cobrada pode variar de 7,5% a 10% das compensações. O recurso é repassado para todos os estados, territórios e municípios, para ser aplicado em políticas públicas. Em 2008, o valor distribuído foi de R$ 855 milhões.

Levantamento feito por Desafios mostra que, no ano passado, o quadro de concentração dos royalties no Rio de Janeiro praticamente se manteve. Dos R$ 3,2 bilhões repassados aos estados produtores de hidrocarbonetos, R$ 2,2 bilhões foram destinados ao Rio. Em 2008, segundo a ANP, um total de R$ 10,9 bilhões de royalties foi rateado entre os estados, municípios, Comando da Marinha, Ministério de Ciência e Tecnologia e o Fundo Especial.

Do montante destinado aos municípios (R$ 3,7 bilhões), apenas 908 (16,3%), divididos em 17 estados (RJ, SP, ES, MG, RN, SE, BA, PE, CE, AL, PB, RS, SC, PR, PA, AM e AP), receberam compensação financeira pela exploração do petróleo e derivados. Os royalties, que incidem sobre a produção do campo produtor, são recolhidos mensalmente pelas empresas concessionárias por meio de pagamentos efetuados, em moeda nacional, para a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), até o último dia do mês seguinte em que ocorreu a produção.

RISCOS GEOLÓGICOS A partir de 1997, após a instituição da Lei do Petróleo, a alíquota dos royalties passou de 5% para até 10% da produção, podendo ser reduzida a um mínimo de 5%. No cálculo desses percentuais são considerados os riscos geológicos, as expectativas de produção e outros fatores pertinentes. Para se chegar ao valor final dos royalties, é preciso avaliar o preço de mercado do petróleo, gás natural ou condensado; as especificações do produto e a localização do campo, que pode estar na plataforma continental ou em alto mar. Atualmente, a maior parte do petróleo extraído no País vem dessa segunda alternativa. Nesse caso, o repasse dos royalties das empresas que pagam alíquotas acima de 5% é feito da seguinte forma: 25% para o Ministério da Ciência e Tecnologia; 22,5% para os estados confrontantes com campos; 22,5% para os municípios confrontantes com campos; 15% para o Comando da Marinha; 7,5% para o Fundo Especial; e 7,5% para os municípios afetados por operações nas instalações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural.

Além dos royalties, as concessionárias devem pagar ao governo bônus de assinatura realizado no ato do contrato e pela ocupação ou retenção de área. Apenas no ano passado, a arrecadação desse último dispositivo foi de R$ 139 milhões. Os campos mais rentáveis e de larga produção também pagam participação especial de até 40% sobre a receita líquida trimestral. As alíquotas dependem da localização da lavra (onshore ou offshore), do número de anos da produção e do volume trimestral de produção. Em 2008, foram arrecadados R$ 11,7 bilhões com a participação especial. Desse total, R$ 5,8 bilhões foram transferidos para a União.

Em 2008, a produção de petróleo e gás natural da Petrobras no País (em barris de óleo equivalente) foi de 2.175.896 barris/ dia. Esse volume é 5,4% superior ao registrado em 2007. De acordo com a companhia, a produção exclusiva de petróleo atingiu a média diária de 1.854.655 barris, com um aumento de 3,5% sobre 2007, e a de gás natural chegou a 51 milhões de metros cúbicos diários e ficou 17,8% maior do que a média do ano passado.

LUGAR ERRADO Além da disparidade na distribuição dos recursos, outra questão que chama a atenção dos pesquisadores do Ipea é o fato de o maior volume das compensações financeiras ficarem com as cidades consideradas ricas. "Quando se analisa a situação econômica dos municípios, observase que, além dos recursos dos royalties estarem concentrados em poucos, grande parte deles estaria em regiões classificadas como Alta Renda e Dinâmica segundo a tipologia adotada pelo Ministério da Integração Nacional e, portanto, considerados não elegíveis segundo os critérios da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR)", destaca trecho do estudo.

No topo da lista dos que tiveram os cofres recheados pelos royalties do petróleo estão cinco cidades do Rio de Janeiro: Campos dos Goytacazes (R$ 559 milhões), Macaé (R$ 406 milhões), Rio das Ostras (R$ 162 milhões), Cabo Frio (R$ 144 milhões) e Quissamã (R$ 101 milhões). O valor dos repasses realizados, em 2008, para as prefeituras dessas localidades é maior do que o total transferido a todos os outros municípios dos 16 estados beneficiados pelos royalties.

Apesar de ser líder em volume de repasses, Campos dos Goytacazes aparece na 445º posição no ranking nacional de desenvolvimento municipal realizado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Já o município de Quissamã é apenas o 1.290º da lista. O levantamento realizado pela entidade abrange, com igual ponderação, as três principais áreas de desenvolvimento humano: emprego e renda, educação e saúde. Em relação aos municípios fluminenses, Campos dos Goytacazes e Quissamã ocupam a 17º e a 45º colocação, respectivamente.

"A literatura empírica mais recente traz algumas evidências que apontam que os recursos recebidos não têm gerado retornos às localidades beneficiadas na área social e ambiental. Tampouco, não têm promovido a justiça intergeracional, no sentido de compensar as gerações futuras, sob a forma de poupança ou de investimentos, pela exploração presente de uma fonte de energia esgotável", adverte Ribeiro.

CUSTEIO DA MÁQUINA Pesquisa realizada pelo economista Sérgio Gobetti revela que parte dos royalties é aplicada para cobrir gastos com o custeio da máquina pública. Tal iniciativa fere a Lei 7.990/89 que veda a aplicação dos recursos em pagamento de dívida e no quadro permanente de pessoal. "As despesas com pessoal do Poder Legislativo, por exemplo, estão limitadas ao teto de 6% da Receita Corrente Líquida (RCL) na esfera municipal. Isso significa que o aumento das transferências provenientes de royalties cria um estímulo, via aumento da RCL, para que as Câmaras de Vereadores utilizem o espaço fiscal que possuem para elevar suas despesas", destaca Gobetti, doutor em Economia pela Universidade de Brasília (UnB).

Após analisar dados do Tesouro Nacional, o economista constatou que o gasto per capita com os legislativos é maior entre os municípios mais beneficiados pelas rendas do petróleo. Na amostra, feita com 4.364 localidades, a despesa com vereadores representa R$ 32,34 por habitante na média total. Esse valor sobe para R$ 49,09 entre os 100 maiores beneficiários pelos royalties do petróleo. Já entre os beneficiários de outros tipos de royalties, a média é de R$ 36,28. E entre os que chamados "sem royalties", R$ 30,90.

De acordo com o estudo, de maneira geral, os gastos totais com pessoal são mais elevados no grupo dos 100 principais beneficiários dos royalties, ultrapassando em 33% a média per capita dos demais municípios recebedores desse tipo de compensação financeira. Gobetti revela, ainda, que o montante destinado para investimentos praticamente é o mesmo entre os grupos de municípios. Ou seja: os que recebem mais tendem a gastar em obras o mesmo valor daqueles com menor repasse.

"As evidências reunidas indicam, portanto, que há um sobrefinanciamento de alguns nichos da esfera municipal e que isso não está gerando nem retorno social à população das localidades impactadas pelas atividades petrolíferas, nem ações preventivas no sentido de preparar economicamente essas regiões para um futuro sem petróleo. Mais do que isso, podemos dizer que, em alguns casos específicos, há fortes indícios de desperdício de recursos públicos, o que coloca na ordem do dia a discussão sobre novos critérios de partilha das rendas do petróleo", ressalta.

ECONOMIA A diferença entre volume de royalties e o crescimento da economia local também é outra realidade que chama atenção. Pesquisa realizada pelo economista Fernando Postalis mostra que os municípios contemplados com tais recursos crescem menos do que aqueles que não recebem os repasses. Além disso, segundo o estudo, quanto maior o volume de royalties transferidos, menor tende a ser o crescimento econômico do município.

"Os resultados confirmam a chamada 'maldição dos recursos naturais' da literatura mundial, mostrando que os municípios contemplados com royalties cresceram menos que os municípios que não receberam tais recursos. Em geral, para cada 1% adicional de royalties observa-se uma redução de cerca de 0,06% na taxa de crescimento do município", destaca Postalis, doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP).

Um dos exemplos clássicos da maldição dos recursos naturais, lembrada por Postalis, ocorreu na Holanda na década de 1960. Na ocasião, a descoberta de jazidas de gás natural gerou resultados pífios no campo social e econômico. O boom exportador do produto levou à valorização da moeda local e consequentemente a um crescimento das importações. A busca por mercadorias importadas tirou a competitividade dos produtos holandeses e levou a indústria local à recessão. Esse fenômeno é conhecido como "doença holandesa". "Acho que de certa forma estamos passando por essa maldição. E se nada for feito, principalmente quanto à divisão dos recursos, a situação pode se agravar", avalia Marcio Bruno.

FANTASMAS Diante do desafio de espantar a maldição dos recursos naturais, pelo menos em relação ao pré-sal, a União começa a preparar o terreno. Desde o ano passado, técnicos do Palácio do Planalto estudam a criação de uma estatal que atuará nos moldes do sistema implantado na Noruega, terceiro maior exportador de petróleo do mundo. Entre as medidas adotadas pelo país nórdico está a criação de um fundo centralizado no governo federal. Caso esse modelo seja adotado no Brasil, as empresas privadas, a princípio, não participarão da exploração do présal, ou seja, as novas descobertas ficariam totalmente com a União. A proposta, no entanto, ainda deve ser concluída e encaminhada ao Congresso Nacional.

Nesse meio tempo, congressistas buscam apoio para a aprovação dos próprios projetos que tramitam na Câmara e no Senado. Atualmente, apenas no Senado, existem 30 projetos de lei sobre royalties. Quase a metade foi criada no ano passado. Embora a maioria dos autores das propostas defenda mudanças do atual modelo de distribuição, não há consenso quanto ao destino dos repasses.

Para o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), os recursos provenientes da participação especial e dos royalties excedentes a 5% do valor da produção de petróleo e gás deveriam ser aplicados em ações nas áreas de educação de base e de ciência e tecnologia. "Diferentemente dos impostos, cujas receitas não podem ser vinculadas, nada há a obstar a previsão ou determinação de que os royalties sejam utilizados na implementação de ações que beneficiem a população e o desenvolvimento de novas tecnologias. É com essa preocupação que vislumbramos a possibilidade de atrelar esses recursos, exclusivamente, a ações na área de educação de base e de ciência e tecnologia, conferindo uma aplicação mais nobre para esses recursos", diz. "Quem sabe, com isso, estaremos acenando para um futuro mais promissor para um segmento significativo da população".

O senador também é autor de um segundo projeto que cria o "royalty verde". De acordo com a proposta, a parcela que exceder os 10% da produção deve ser destinada à conservação da Floresta Amazônica. Os recursos seriam geridos pelo Ministério do Meio Ambiente.

Já o senador Expedito Júnior (PR-RO) defende que o dinheiro repassado ao Fundo Especial do Petróleo seja aplicado na área de saúde. "No ano de 2007, o Fundo Especial arrecadou R$ 576 milhões. Não é muito, se considerarmos as carências de saúde em nível nacional. Mas o Fundo poderá alcançar um montante muito maior em futuro próximo, se considerarmos o potencial dos gigantescos campos de petróleo recém-descobertos em nossa plataforma continental", ressalta o parlamentar

Os pesquisadores do Ipea Márcio Bruno Ribeiro e Bruno de Oliveira Cruz ressaltam que a maior parte destes projetos, a princípio, não assegura às futuras gerações os benefícios provenientes das riquezas do petróleo. "Quando se analisa as propostas mais recentes de mudança na legislação que tratam das compensações financeiras no Brasil, percebe-se que, em sua maioria, procuram combater ou reduzir as distorções ocasionadas pela legislação em vigor, buscando estabelecer maior destinação de recursos para as áreas de educação, saúde, previdência social e infraestrutura e, ao mesmo tempo, uma redução dos recursos destinados aos entes subnacionais. Contudo, ainda são minoria as propostas que tenham alguma preocupação com as gerações futuras, visando objetivos como a preservação ambiental ou a formação de poupança", asseguram os pesquisadores.

 
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