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Planejamento - Dedicação ao desenvolvimento brasileiro - No aniversário de 45 anos do Ipea, Lula reforçou importância de pensar o futuro

2009 . Ano 6 . Edição 54 - 30/10/2009

Ipea: Pensando o futuro do Brasil

Ao completar 45 anos, o Ipea se prepara para retomar participação no planejamento estratégico de longo prazo do país. Fundamental para assegurar o crescimento econômico, com bem-estar social, e o futuro do Brasil, o planejamento volta a ocupar posição de destaque nos debates acadêmicos e de instituições brasileiras Pensando

Por Gilson Luiz Euzébio - de Brasília

Depois de décadas, o Brasil dá os primeiros passos para retomar o seu planejamento estratégico. Por enquanto, a visão ainda está muito presa ao médio prazo, com iniciativas isoladas. Mas a necessidade de ter diretrizes e objetivos claros para o longo prazo se impõe como condição essencial para o desenvolvimento econômico e social do país. E ganha maior relevância ainda em um ano marcante, como 2009, por comportar a maior crise do capitalismo pós-1929. Passados 80 anos, o mundo se vê no centro de um novo furacão econômico, com impacto social e econômico sem precedentes, inclusive sobre a geopolítica mundial. Mesmo em épocas mais calmas, pensar o longo prazo é fundamental. "Só acredito que a sociedade possa se desenvolver de forma planejada", afirma Carlos Lessa, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e integrante do Conselho de Orientação do Ipea. E, claro, as diretrizes estabelecidas no planejamento têm que ser seguidas. Sem planejamento, grandes oportunidades podem se transformar em pesadelo: "O planejamento sempre foi e continua sendo fundamental para qualquer país que queira colocar em prática uma política de crescimento, de desenvolvimento. Não dá para acreditar que essas coisas venham espontaneamente", acrescenta Mário Theodoro, diretor de Estudos, Cooperação Técnica e Políticas Internacionais do Ipea.

O objetivo "é, em última instância, a qualidade da nossa sociedade, de cidadania e qualidade de vida da população", afirma Pérsio Davison, técnico de planejamento e pesquisa desde 1973 e atual chefe de gabinete da Presidência do Ipea. É um desafio que se impõe à sociedade, sobretudo aos meios acadêmicos e instituições de pesquisa, como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Com a economia estabilizada e situação fiscal controlada, o país tem agora que enfrentar o grande desafio de planejar o seu futuro para daqui a, digamos, 20 anos. Isso significa tomar decisões hoje e implantar projetos de forma coordenada, pensando em resultados num prazo que perpassa diversos governos. Aos 45 anos, completados neste mês de setembro, o Ipea passou por uma ampla reorganização interna para atender a demanda por estudos e colaborar na formulação de propostas de longo prazo para o país, pensando agora nos próximos 45 anos. Na verdade, é a retomada do seu papel histórico: criado em setembro de 1964, o instituto participou ativamente da elaboração dos grandes planos nacionais de desenvolvimento. "A história (dos últimos 45 anos) não pode ser contada sem a colaboração do Ipea", resumiu o presidente Marcio Pochmann. Coube ao Ipea fazer o diagnóstico da situação brasileira, que balizou a montagem do primeiro plano de ação do governo militar, afirma Jorge Abrahão, diretor de Estudos e Políticas Sociais da instituição. O instituto foi criado numa época difícil do país. Logo depois do golpe militar de 1964. Mas, se colocar na balança, o resultado do trabalho do Ipea é muito positivo, declarou o presidente Lula, em discurso na sede do instituto.

Nesses 45 anos, o Brasil passou por profundas mudanças: em 1964 era um país rural, exportador de produtos primários (85,4%), com 40% da população com mais de 15 anos analfabeta. Hoje, mais de 80% da população vivem em áreas urbanas e a taxa de analfabetismo caiu para 10%. A mortalidade infantil caiu de 112 por mil para 26,6 por mil, e a população cresceu de 71 milhões de habitantes para 190 milhões. As exportações brasileiras saltaram de US$ 1,4 bilhão para os US$ 197 bilhões registrados no ano passado. Da mesma forma, as reservas internacionais passaram de US$ 244 milhões para US$ 206 bilhões. Nesse período, a economia brasileira se modernizou, e a indústria ganhou peso na formação do Produto Interno Bruto (PIB).

Foram transformações resultantes da intervenção planejada do setor público, com destaque para o 1º e 2º planos nacionais de desenvolvimento (PND). O Brasil de 2009 é um novo país se comparado ao de 45 anos atrás. Mas que também precisa pensar no seu futuro, em projetos de longo prazo. "Historicamente, o Ipea cumpriu esse papel", lembra Carlos Lessa. Desta vez, o Ipea assumiu o compromisso público de apresentar até o final do próximo ano vários estudos técnicos para subsidiar o debate sobre o futuro do Brasil. Em seu planejamento estratégico, feito ao longo de 2007 e 2008, com a participação dos técnicos da casa, o instituto estabelece prioridade para estudos e pesquisas em áreas importantes para o longo prazo, de forma a contribuir para o processo de definição das estratégias para o país. Assim, o instituto cumpre sua missão de "produzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro".

Para o Ipea, as estratégias de desenvolvimento para os próximos 45 anos devem surgir de um amplo e profundo debate com a sociedade, envolvendo os principais líderes sociais de todas as regiões do país. Tal processo deverá culminar na formulação de um documento-base que apresentará as propostas que irão nortear a estratégia de desenvolvimento econômico-social do Brasil para os próximos 45 anos. O planejamento ganha maior relevância ainda com a crise mundial, que coloca em pauta a discussão dos modelos econômicos e geopolíticos internacionais. Os Estados nacionais têm que estabelecer o seu papel no cenário internacional e sua política interna visando ao desenvolvimento com bem-estar social. Cabe ao Ipea dar suporte e promover esse debate.

A decisão de promover essa discussão é um marco na história do instituto, que estabeleceu sete eixos básicos para suas pesquisas e estudos, em consonância com a necessidade de planejamento do país. Foram selecionados os seguintes temas: inserção internacional soberana; macroeconomia para o pleno emprego; infraestrutura econômica, social e urbana; estrutura tecnoprodutiva integrada e regionalmente articulada; sustentabilidade ambiental; proteção social, direitos e oportunidades; fortalecimento do Estado, das instituições e da democracia. É uma tarefa que exigiu alterações nos modelos estratégico e de gestão do Ipea, que agora retoma seu papel como centro de excelência que participa da formulação, análise, acompanhamento, avaliação e prospecção de políticas públicas.

"Os eixos implicam os principais focos dos temas do desenvolvimento, não só sobre o enfoque econômico. Acho que um dos méritos desse debate que o Ipea produziu internamente é trazer coesões sobre as prioridades para nossos estudos e pesquisas", diz Pérsio Davison. Assim, o Ipea alinha-se com o consenso já formado na sociedade, empresariado e governo sobre a importância do planejamento. "Não é o retorno aos anos 1970 (época dos grandes planos de desenvolvimento), mas é uma volta às possibilidades da construção estratégica do futuro da sociedade brasileira", afirma ele.

"A recuperação da capacidade de planejamento de longo prazo do Estado brasileiro está em curso", afirma Glauco Arbix, ex-presidente do Ipea. As instituições trabalham para reconstruir a capacidade perdida nas décadas de 1980 e 1990. "É preciso todo um esforço de remodelagem e reordenamento institucional. É preciso um esforço para se repensar as instituições do Estado brasileiro, em geral criadas no período desenvolvimentista, e que, atualmente, são chamadas a intervir na vida econômica e social de um modo totalmente distinto. Essa tarefa está longe de ser trivial", comenta ele. "Para inovar no planejamento, o setor público brasileiro precisa inovar institucionalmente. Ou seja, deve agir para liberar o potencial da população, das empresas, da economia, e não pretender substituí-los na nossa economia", aconselha. O desenvolvimento, com a diminuição da pobreza e das desigualdades, é o anseio da sociedade brasileira, ressalta.

Curto prazo - Durante a fase de inflação alta, desequilíbrio das contas públicas e instabilidade, o país ficou preso à administração do curto prazo, e as instituições que costumavam pensar em horizontes um pouco mais à frente, como o Ipea, foram relegadas a segundo plano. Não eram a prioridade do momento. Hoje, a necessidade do planejamento estratégico volta a se impor. Um plano de desenvolvimento, defende ele, deve ser um amplo plano de Estado e não de governo. Deve definir diretrizes e objetivos a serem alcançados pelo país num período mais longo, de 20 a 30 anos, com uma visão de crescimento econômico com inclusão social, distribuição de renda e sustentabilidade ambiental.

A vantagem é que o país, segundo Arbix, tomou consciência da necessidade de construir uma estratégia de longo prazo. "O momento é de reforço da ideia de planejamento, de discutir o futuro do Brasil", afirma Bruno Cruz, diretor-ajumto de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Ipea. "O Brasil está remontando sua estrutura de planejamento, que foi praticamente desmantelada na década de 1980 e primeira metade da década de 1990, com a crise fiscal que o Estado brasileiro sofreu", acrescenta Luiz Cezar Loureiro de Azeredo, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea. Para continuar a cumprir sua missão, instituto fez concurso público e contratou novos servidores. "A chegada de novos técnicos dá maior capacidade de resposta à instituição", diz Bruno Cruz.

O importante, porém, é que a questão está na pauta nacional. "Minha grande satisfação é que essa discussão foi retomada, que a palavra desenvolvimento entrou no vocabulário dos partidos políticos, dos economistas e dos sindicatos", comenta Sicsú. Há pouco tempo as duscussões eram sobre inflação e dívida externa. "Entendemos que o desenvolvimento é uma necessidade permanente, inclusive para os países desenvolvidos, que estão sempre procurando se desenvolver mais. A grande vitória que a socidade conquistou foi colocar na pauta o desenvolvimento. Não existe desenvolvimento sem planejamento estatal, desenvolvimento não cai do céu", comenta ele. Embora imprescindíveis, planejamento e desenvolvimento foram esquecios por um bom tempo no Brasil. "Na década de 1990, por exemplo, planejamnto virou quase um palavrão, e o mundo embarcou na crença de que o mercado era tudo", lembra Marcio Wohlers, diretor de Estudos e Políticas Setoriais, Inovação, Produção e Infraestrutura (Diset) do Ipea. Para ele, o estouro da crise internacional em setembro do ano passado resgatou o papel do Estado na condução do desenvolvimento econômico e social.

Para Azeredo, os atuais casos de sucesso no Brasil são resultado do planejamento estratégico da época dos militares. A descoberta do petróleo na camada do pré-sal, por exemplo, não seria realidade se o país não tivesse apostado na capacidade da Petrobras para explorar campos submarinos como resposta à crise do petróleo de 1973. Na ocasião, o governo também adotou a estratégia de buscar novas fontes de combustível. Recebido com ceticismo, o programa do álcool, Proalcool, "foi a gênese de importantes projetos de produção de biocombustíveis", que permitiram ao Brasil um papel de destaque no desenvolvimento de tecnologia e de fontes alternativas de energia.

Outro programa polêmico na época, o de energia nuclear, criado pelo presidente Ernesto Geisel, hoje é necessário, o que mostra a importância de planejar ações de longo prazo. A Ferrovia Norte-Sul, iniciada na segunda metade da década de 1980, é, para ele, outro exemplo de ação estratégica: hoje todos reconhecem a importância do projeto para o desenvolvimento regional brasileiro. A falta de planejamento já foi motivo de queixa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que atribuiu à Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) o papel de elaborar propostas de políticas de longo prazo para o país. Antes, o governo Lula tomara algumas iniciativas nesse sentido, uma delas resultou num trabalho, produzido pelo Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE), com cenário de longo prazo para o Brasil. Mas não se transformou num plano de desenvolvimento para o país, apenas em direcionamento para algumas áreas.

Para Lessa, o Estado deve pensar o longo prazo e indicar ao setor privado a direção, principalmente neste momento que o país se prepara para explorar o petróleo do pré-sal. "O petróleo é hoje, de todos os bens da natureza, o mais disputado", afirma. Segundo ele, se a economia mundial voltar a crescer, logo surgirá novamente o problema da escassez do combustível. O pré-sal está a 300 quilômetros da costa, portanto fora da área marítima de domínio do Brasil. "Qual a capacidade que tenho de segurança nesse espaço vital?" questiona Pérsio. O planejamento de longo prazo, segundo ele, deve ter essa visão global, que implica a articulação de ações e planos.

A proteção do pré-sal e da ra do presidente da França, Nicolas Sarkozy, que assistiu o desfile de Sete de Setembro em Brasília, Lula ressaltou outro ponto importante do acordo, a transferência de tecnologia ao Brasil. Além da defesa, o pré-sal exige a definição de várias outras questões estratégicas: "Teremos capacidade de desenvolver o país e utilizar os recursos para o fortalecimento nacional? "indaga Lessa. Para ele, é melhor o país exportar soja do que petróleo. "Não precisamos ser vorazes exportadores", afirma. Produzir para exportar é importante, reconhece Pérsio: "Mas em que condições?" O Brasil, ressalta ele, está eliminando a diversidade para produzir soja que alimenta os animais nos países ricos. O planejamento tem que considerar que a sustentabilidade global está "chegando ao limite".

Médio prazo - Embora o país não tenha um plano de longo prazo, as decisões do presidente Lula sobre o pré-sal compreendem uma ação mais abrangente. Além de tomar a iniciativa de reequipar as Forças Armadas, Lula tem se posicionado contra a que o Brasil se transforme num país exportador de petróleo. O objetivo é vender aos outros países produtos acabados, com maior valor agregado. Mário Theodoro lembra que a exploração de petróleo e recursos minerais sem uma visão estratégica causou a ruína de muitos países. "Se se confirmarem as expectativas quanto ao volume de petróleo, é um bilhete de loteria que o país ganha", afirma. Tem que saber usar os recursos ou eles se transformarão em problema, como aconteceu com vários exportadores de petróleo: concentraram a economia na venda de petróleo. A entrada de dólares para compra de petróleo valoriza o câmbio até chegar a um ponto em que é mais vantajoso importar do que produzir outras mercadorias. "Com a moeda muito valorizada, ocorre um processo de desindustrialização", explica Mario Theodoro. A teoria, conhecida pelos economistas como "doença holandesa", diz que o aumento da exportação de produtos primários reduz a competividade dos produtos industrializados, e a produção nacional é sufocada. Quando escasseiam os recursos naturais ou quando eles perdem valor no mercado internacional, o país está no pior dos mundos, sem indústria, sem produção própria e sem o dinheiro da exportação.

"Não temos o direito de incorrer nesse erro. O Brasil tem um parque industrial e não pode jogar isso fora de jeito nenhum. Vamos ter que ter política industrial, política cambial, um conjunto de políticas, todas atreladas à visão de longo prazo", diz Mário Theodoro. O presidente Lula tem demonstrado preocupações com o longo prazo, mas estas precisam ser assumidas pela sociedade e pelo Estado como estratégicas para o país, independentemente de posições políticas. O planejamento ganha ainda maior relevância neste momento em que o Brasil começa a se afirmar como líder regional. "O Brasil é parte de um grupo emergente e o Ipea é chamado a ver os problemas nacionais, subnacionais e também tem que ter uma visão internacional, de articulação com outras instituições, com as diferentes formas de pensar e atuar exporcom sugestões e análises de políticas públicas", afirma Marcio Wohlers.

Outras ações do governo, embora repercutam também no longo prazo, estão focadas no médio prazo. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por exemplo, está focado na solução de questões urgentes e alavancadoras do processo de desenvolvimento da economia. "O PAC não é suficiente nem para resolver o problema da energia elétrica", comenta Carlos Lessa. Para ele, o principal problema ao desenvolvimento do Brasil é o mesmo há 50 anos, a falta de infraestrutura decorrentes de erros estratégicos que se perpetuam. "Ou a gente enfrenta isso ou não conseguimos fazer nada", diz Lessa. Um plano de desenvolvimento, para ele, tem que ser bem amplo para resolver gargalos como os de logística e infraestrutura. O país poderia ter um ganho de competitividade, com benefícios para todos, com o incremento da navegação de cabotagem e implantação de ferrovias, meios mais econômicos do que o transporte rodoviário.

O único instrumento de planejamento em prática no Brasil é o plano plurianual, no qual os sucessivos governos definem prioridades de investimentos para quatro anos. Ocorre que esse plano é feito para um período de governo. Ou seja, não estabelece a continuidade de ações de Estado. A Constituição fala na necessidade de plano nacional de desenvolvimento, planos regionais e setoriais. "Temos caminhado no PPA, na LDO (lei de diretrizes orçamentárias), mas não chegamos ainda na circunstância da construção de um plano nacional", comenta Pérsio Davison.

A experiência do PPA é relativamente recente: previsto na Constituição de 1988, o primeiro PPA elaborado em 1996. Foi um avanço, mas não resultou na definição de um plano de longo prazo, "baseado em um projeto nacional de desenvolvimento, fruto de um amplo consenso social". Tal plano deveria conter as diretrizes a serem seguidas por diversos governos na elaboração dos PPA.

A implantação do PPA exigiu um esforço muito grande para adequar a execução orçamentária para que se pudesse obter um adequado padrão de integração plano-orçamento. No Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o governo adotou o método do gerenciamento intensivo para melhorar o nível de execução de seus principais programas e projetos.


Hora de planejar o futuro

Lula vai ao Ipea e pede engajamento dos técnicos no debate de projetos de longo prazo. O instituto, que ganhou o reforço de novos servidores, vai produzir até 2010 um conjunto de estudos para subsidiar o debate sobre o planejamento do país

Por Gilson Luiz Euzébio e Mário Vinicius Costa

No dia 16 de setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deslocou-se de seu gabinete para um compromisso no Setor Bancário Sul, em Brasília: a comemoração dos 45 anos de fundação do Ipea. Foi a primeira vez que um presidente da República visitou a sede do instituto. Descontraído, Lula falou por quase uma hora aos convidados, técnicos, servidores e ex-presidentes do instituto. E lançou um desafio à sociedade, o de pensar estrategicamente o futuro do país, questão que vai ganhar cada vez mais relevância e deve, inclusive, centralizar as discussões da campanha eleitoral do próximo ano, segundo o presidente. Proposição que vem ao encontro do objetivo central das comemorações do Instituto, a série de eventos que percorrerá o país debatendo, por área temática, o que será do Brasil nos próximos anos, "Brasil Ipea 45 anos: um novo ciclo do pensamento nacional".

"A passagem para a nova sociedade do conhecimento se tornou adequada somente mais recentemente, quando a coordenação das políticas públicas abandonou a lógica do curto-prazismo que aprisionava a economia nacional por quase duas décadas", afirmou o presidente do Ipea, Marcio Pochmann. "A base de onde partir para a viagem do futuro já existe, e o Ipea e todos os seus servidores estão prontos para colaborar decisivamen- te, assim como procurou fazer nos últimos 45 anos". Cabe, portanto, ao Ipea promover esse debate.

Ao lado do ministro interino Daniel Vargas, da Secretaria de Assuntos Estratégicos à qual o Ipea é vinculado, e de Marcio Pochmann, Lula defendeu mais investimentos em educação, ciência e tecnologia - essenciais ao desenvolvimento econômico e social brasileiro nos próximos anos.

"Estamos vivendo quase que um momento mágico na história deste país. Há uma confluência de fatores, de coisas boas que estão acontecendo. O desafio, para todos nós, é não jogar fora este momento, como fi zemos no século 20", afirmou Lula. No século passado, lembrou o presidente, o Brasil perdeu a oportunidade de fazer a reforma agrária e de adotar uma política educacional de massa como fizeram outros países. Com isso, foram se acumulando problemas sociais. "Ou nós investimos na educação, sem utilizar a palavra 'gasto' (...), ou a gente vai perder o século 21, formando apenas uma pequena parcela da elite brasileira", alertou o presidente, que já inaugurou 11 novas universidades no país. Outras três estão em processo de aprovação, sendo duas delas voltadas para atender também estudantes de outros países: a universidade Brasil-África, no município de Re denção, no Ceará, para estudantes dos países africanos de língua portuguesa; e a universidade da América Latina destinadas ao público da região.

Esse "momento mágico" traz muitas novas oportunidades e o país precisa estar preparado para aproveitá-las. E isso depende de planejamento: "Neste próximo período, o Ipea vai ter muito mais trabalho (...) a gente vai ter que recuperar urgentemente a capacidade de planejamento deste país", previu o presidente. Desde 1964, quando foi criado, o Ipea, mantém-se "em sintonia com a marcha do desenvolvimento brasileiro", trabalhando pelo aperfeiçoamento das políticas públicas e contribuindo planejamento e desenvolvimento do país, informou Pochmann.

"Neste momento histórico, em que o Brasil trocou pobreza por inclusão", destaca-se a importância do resgate de uma cultura de planejamento de longo prazo, comentou o ministro interino da SAE, Daniel Vargas. Para o ministro, "a SAE e o Ipea possuem um casamento indissolúvel na realização dessa tarefa. Ao Ipea cabe fornecer o suporte técnico e institucional para formulação de alternativas para o desenvolvimento de longo prazo. À SAE cabe construir, sob a orientação do presidente, um plano de longo prazo para o país".

Já estava no plano de ação do instituto iniciativas no sentido sugerido por Lula. "O Ipea programou-se para realizar até 2010 grandes estudos sobre perspectivas do desenvolvimento brasileiro", informou Marcio Pochmann. O discurso de Lula no evento - que contou com a presença da filha do ex-ministro do Planejamento, Roberto Campos, Sandra Campos - e de autoridades ministeriais e ampla cobertura da imprensa, confirma que a instituição tomou o rumo certo, ao dar prioridade a estudos sobre desenvolvimento. As pesquisas vão contribuir para "ampliar o debate sobre definição da agenda do Brasil para as próximas décadas", explicou Pochmann. Na opinião do primeiro presidente do instituto, João Paulo dos Reis Velloso, que ocupou o cargo no período de setembro de 1967 a 1969, o Ipea tem no momento atual uma grande contribuição a dar ao país: "O Ipea pode auxiliar o país na saída da crise global e no desenvolvimento de oportunidades que levem o Brasil a realizar o seu potencial econômico e social dentro de uma economia transformada e com um novo modelo de desenvolvimento, com inclusão", afirmou ele em mensagem encaminhada ao presidente Marcio Pochmann. "O Ipea é, hoje, tão ou mais importante para o Brasil quanto nos seus primeiros anos", afirmou Reis Velloso, que preside hoje o Fórum Nacional.

A retomada do planejamento levou o Ipea a um recomeço, avaliam ex-presidentes da instituição. "É uma oportunidade muito grande que o instituto tem depois de 45 anos (...) Ao invés de ter envelhecido, tem uma oportunidade de recomeço", disse ", Nilson Holanda, que presidiu o Ipea em 1993. Ricardo Santiago, que foi presidente entre 1988 e 1990, destacou que, superados os grandes problemas de inflação e dívida externa, surge a oportunidade "para se pensar os grandes temas do Brasil". Roberto Macedo, presidente entre 1991 e 1992, acredita na contribuição do instituto para o planejamento e elaboração de políticas públicas no país como "um processo" que "vai seguir para o futuro". Também estiveram presentes os ex-presidentes Líscio Camargo (1992-1993) e Glauco Arbix (2003-2006). Aspásia Camargo, que ocupou a presidência do Ipea entre 1993 e1995, encaminhou mensagem ao instituto. "Lembro-me, com sentimento de dever cumprido, da grande frente de resistência que montamos de maneira a resgatar a estrutura' regimental desse tão importante órgão, que tantos serviços inestimáveis tem prestado ao Brasil", afirmou. Roberto Cavalcanti de Albuquerque, do Conselho de Orientação do Ipea, ressaltou que o instituto é respeitado no Brasil e no exterior. "Tenho um grande apreço pelo Ipea e fico muito feliz ao ver que ele se consolida a cada dia como a referência maior do planejamento do desenvolvimento brasileiro - desenvolvimento como processo global, econômico-social, político-institucional, concepção que compartilhamos", escreveu ele.

Pensar global - Em seu discurso, o presidente Lula deu alguns exemplos da importância de pensar de forma global. As ações adotadas pelo governo foram fundamentais para manter o consumo e retomar o crescimento econômico no segundo trimestre deste ano, numa saída rápida da recessão. Além do aumento de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), Lula comemorou a criação de 242 mil novos empregos em agosto. Para chegar a esses resultados, o governo optou por arrecadar menos e aumentar os investimentos públicos em obras de infraestrutura e em programas sociais, mesmo sob a oposição de correntes que pregavam mais austeridade fiscal. "Em vez de nós recuarmos como determinados setores da indústria privada recuaram, nós anunciamos mais R$ 100 bilhões para o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)", afirmou. Se fizesse o contrário, "a crise iria se aprofundar muito mais."

Outro exemplo citado foi o da compra de plataformas pela Petrobras. Lula lembrou que, na época, a estatal queria importar de Cingapura, porque era mais barato: "E quantos milhões a gente vai ganhar se a gente gerar emprego aqui, se a gente pagar salário aqui, se a gente arrecadar mais imposto aqui e se a gente adquirir tecnologia?

Quanto é que nós vamos ganhar? Isso não pode ser contado?". A decisão de comprar da indústria nacional - em setembro, a Petrobras anunciou a encomenda à indústria nacional de 28 sondas de prospecção para o pré-sal - reativou o setor naval, que, na década de 1970, era o segundo maior do mundo. Só ficava atrás do Japão. Nas décadas seguintes, o setor fechou 47 mil postos de trabalho, e chegou a ter menos de mil empregados. "Hoje, graças a Deus, já estamos próximos dos 50 mil trabalhadores na indústria naval", comentou o presidente, lembrando a responsabilidade de todos, inclusive do setor privado, de pensar no país.

Há também uma discussão com a Vale para que a empresa agregue mais valor aos seus produtos e use fornecedores nacionais. São decisões que colocam em expansão a indústria naval, que vai demandar mais ao setor de siderurgia. "Quanto de aço nós vamos ter que produzir para construir os navios que nós precisamos construir? Só para a Petrobras são 200 navios, entre grandes e barcos de apoio". Para o presidente Lula, o setor siderúrgico brasileiro "ainda está acanhado". Produz 35 milhões de toneladas, enquanto a China produz 545 milhões, parte desta produção com minério brasileiro.

Pré-sal - Investimentos de US$ 950 milhões por ano em pesquisa. Esse foi, segundo o presidente, o segredo da Petrobras para encontrar o pré-sal. Antes, o volume de investimento da estatal em pesquisa estava em torno de US$ 167 milhões. As reservas do pré-sal, que podem transformar o Brasil num grande produtor de petróleo, exigem planejamento do uso dos recursos naturais e da riqueza.

"Precisamos colocar a inteligência brasileira para pensar o que queremos nos próximos 10, 15 ou 20 anos. Pensar o que vamos construir neste país, porque o grosso do petróleo será explorado lá para 2016, 2017. Precisamos trabalhar agora para poder colher", afirmou Lula, repetindo o que dissera antes aos integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). "Este país tem a chance de deixar de ser apenas uma promessa de futuro. (...) Tem a chance de ser o próprio futuro", previu.

Para o governo, parte dos recursos do pré-sal deve ser investido prioritariamente em educação, ciência e tecnologia e na solução dos problemas sociais. A proposta do governo prevê a exploração em forma de partilha e não de concessão. Nesta última forma, o vencedor da licitação pagaria pela compra de blocos e ficaria dono do petróleo. "Nós resolvemos assumir o desafio de dizer ao povo brasileiro que, mais do que em 53 ou 54, agora o petróleo é nosso", afirmou.

A exploração do pré-sal deve repercutir também no mercado de trabalho, com valorização de profissões técnicas. Os cursos de engenharia, por exemplo, perderam espaço nas últimas décadas. E os engenheiros desviaram-se de sua função: "Nós estamos cansados de ver pessoas formadas em engenharia virando analista de banco, analista de mercado(...) Houve uma transferência de uma profissão que é símbolo do desenvolvimento e de crescimento do país para uma função de mera especulação financeira ou da venda de ilusões". Para Lula, tem alguma coisa errada: "Um país onde o curso de engenharia não é mais prioritário nas universidades tem algum problema".

Novo PAC - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ao Ipea para participar da elaboração de um novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). "Outra coisa que devemos lançar, e mais uma vez o Ipea precisa participar, é a questão de um novo PAC. Nós pretendemos apresentar um novo PAC, porque nós temos que colocar dinheiro no orçamento de 2011 (primeiro ano do próximo governo), e nós precisamos definir quais as coisas prioritárias que o Brasil precisa", explicou.

O presidente informou que vai fazer também uma espécie de consolidação das políticas públicas para transformá-las em políticas de estado, e não de um determinado governo. E prometeu anunciar neste ano um grande programa de inclusão digital, que vai levar conexão à internet em banda larga a "todos os rincões" do país. "Espero que o Ipea participe e contribua de forma extraordinária com isso", afirmou.

São algumas das ações que precisam de continuidade e deveriam integrar o planejamento de longo prazo, a ser feito com base no conhecimento da realidade das diferentes regiões e estados. "Tentar pensar o Brasil aqui de Brasília é impossível. Tentar pensar o Brasill sem imaginar as diferenças culturais que existem de estado para estado é impossível (...). O Ipea precisa fincar um pouco o pé neste país (...), afirmou Lula. "Acho que era preciso espraiar um pouco o Ipea para outras regiões do país, afirmou Lula, para "retratar em seus estudos a cara deste país".

Segundo o presidente, "não há como conhecer um país continental como o nosso sem conhecer várias localidades. Ninguém conhece o país somente lendo livros e até mesmo as pesquisas de instituições como o Ipea", acrescentando que o Brasil "não é a cara" de São Paulo, Rio ou Brasília."As regiões Norte e Nordeste, praticamente não faziam parte do mapa do Brasil, do ponto de vista da iniciativa governamental". Segundo Pochmann, o instituto vem trabalhando para aumentar sua presença em outras regiões e tem feito parcerias com instituições nacionais e internacionais. "Essa ênfase na reorientação da forma do Ipea se complementa com o reforço da função em novas bases. Atualmente, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada prepara-se para a sua descentralização em âmbito regional e presença in loco internacionalmente. Dessa forma, sua expertise passa a estar a serviço público em todas as distintas e grandes regiões geográficas brasileiras, em cooperação técnica em diferentes países da América Latina, bem como na África, especialmente aquela composta por países de língua portuguesa", disse Pochmann em sua fala e concluiu: "Quanto mais pudermos tomar decisões sensatas e humanas, embasadas em estudos técnicos amplos e profundos que permitam compreender como o Brasil e o mundo estão mudando, como os produzidos pelo Ipea, maior a chance de garantia de que o futuro do bem-estar do povo seja bem superior ao atual".


A história

Há 45 anos nascia o órgão que pensa o Brasil


Por Maurício Cardoso

O poder de desenvolvimento de um país está diretamente ligado à sua capacidadee de planejar, organizar e executar ações de médio e longo prazo. O desempenho econômico acima da média internacional registrado por países como a China e a Índia, por exemplo, só é possível graças a um eficiente trabalho de planejamento de políticas públicas e na agilidade de diagnosticar e superar pontos de estrangulamento na economia. No Brasil, essa tarefa vem sendo executada há 45 anos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O Ipea foi criado em 10 de setembro de 1964, como Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada (Epea). Em 1967 foi transformado em Fundação Instituto de Pesquisa Econômico-Social Aplicada. E finalmente, a partir de 17 de maio de 1990, por meio do Decreto 99.260, a instituição passou a denominar-se Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Depois de anos subordinado ao Ministério do Planejamento, atualmente o Ipea está vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

O instituto já nasceu com objetivos claros e bem definidos: pensar o Brasil e ajudar o país a trilhar caminhos mediante a elaboração, formulação e aprimoramento das políticas públicas por meio de estudos, pesquisas, indicadores e processos de avaliação da atuação governamental.

Primeiro a assumir a presidência do instituto, em 1967, a convite de Roberto Campos (na época ministro do Planejamento), o economista João Paulo dos Reis Velloso lembra que o novo órgão foi idealizado para pensar o Brasil no médio e longo prazo, sem preocupações com o dia a dia. "O Ipea foi criado para fazer pesquisas e propostas relativas ao desenvolvimento brasileiro no médio e longo prazo, com visão estratégica, independência de pensamento, de opinião e de criação". E tem sido, desde a sua criação em 1964, um importante centro de estudos e reflexão sobre os problemas brasileiros.

Nesses 45 anos de atividade, o instituto vem participando ativamente da elaboração de diversos planos e projetos governamentais. O primeiro plano estratégico elaborado pelo Ipea foi o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), criado em 1964 para combater a estagnação econômica e a aceleração inflacionária. Voltado para as correções da política econômica, o PAEG reduziu a inflação de 91,8% ao ano, em 1964, para 22%, em 1968, e implementou um amplo programa de reformas institucionais nos planos fiscal, monetário, financeiro, trabalhista, habitacional e de comércio exterior.

No final de 1966, o Ipea elaborou o Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e Social, que traçava um roteiro de desempenho econômico e social para o período de 1967 a 1976. O plano nem chegou a ser executado, mas consolidou a importância do planejamento de médio e longo prazo no país, como o Programa Estratégico de Desenvolvimento (1968-1970), Metas e Bases para a Ação de Governo (1970) e os Planos Nacionais de Desenvolvimento (1972-1985).

Em 1973, o Ipea coordenou os estudos que resultaram na descoberta dos cerrados como nova fronteira agrícola brasileira. Naquela época acreditava-se que o cerrado não tinha potencial agrícola. O minucioso estudo elaborado pelo Ipea constatou o imenso potencial da região e deu origem ao programa de aproveitamento dos cerrados, que foi executado no governo Geisel.

Em seguida vieram o I Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República (1986-1989), o Plano de Metas (1986-1989), o Programa de Ação Governamental (1987-1991), a preparação das Diretrizes de Ação Governamental (1993), participação na elaboração dos Planos Plurianuais (1995-2003), elaboração do Estudo sobre Matriz Energética, coordenação e preparação dos Estudos sobre Desenvolvimento Urbano, elaboração dos Planos Regionais Brasileiros (Polonordeste, Polocentro e Poloamazônia) e o projeto O Brasil na Virada do Milênio.

Mesmo com tantas iniciativas, o planejamento de médio e longo prazo foi praticamente esquecido durante o período de inflação estratosférica e das crises econômicas que assolaram o país na década de 80 e nos primeiros anos da década de 90. Nesse período, o Ipea foi obrigado a focar na crise e centralizar suas prioridades em iniciativas pontuais de curto prazo e de forma bastante limitada. A missão de pensar o futuro do Brasil começou a ser resgatada timidamente a partir de 1995, com a elaboração dos planos plurianuais.

O Ipea perdeu seu foco ao se preocupar muito com os problemas conjunturais de curto prazo e abandonar o viés estratégico de pensar o futuro. A nova postura do Ipea é destacada pelo pesquisador João Paulo de Almeida Magalhães, do Centro de Estudos para o Desenvolvimento Econômico do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro e Conselho de Orientação do Ipea. Para ele, o instituto ingressou definitivamente em uma nova e promissora fase.

 
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