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Hina Jilani - A pobreza, em si, já é uma violação aos direitos humanos

2006. Ano 3 . Edição 18 - 1/01/2006

O Brasil é um país que tem um arcabouço legal de reconhecimento dos direitos humanos em um nível que não vejo em outros países

Por Andréa Wolffenbüttel, de Brasília

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A advogada paquistanesa Hina Jilani esteve no Brasil em dezembro do ano passado. Ela veio como representante do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) para acompanhar o julgamento dos assassinos da missionária norte-americana Dorothy Stang. Com o olhar aguçado de quem viajou o mundo buscando proteger os mais fracos, e com a experiência de quem já foi vítima de perseguições e injustiças, ela fala sobre os desafios de seu trabalho.

Desafios - Na sua avaliação, quais são os maiores problemas que o Brasil apresenta em relação aos direitos humanos?
Jilani
- Bem, esta é a primeira vez que venho ao Brasil, portanto só posso falar das informações que recebi ao longo dos anos. Pelo que sei, os maiores problemas são aqueles ligados aos direitos econômicos e sociais, que provocam a discriminação dos mais pobres. Isso acaba ocorrendo em diversas áreas, como no descumprimento das leis trabalhistas, nos litígios pela posse da terra e na violência contra os presidiários, entre outras. Muitos defensores dos direitos humanos me contaram que se sentem ameaçados por causa de suas idéias e de seu trabalho.

Desafios - A senhora poderia mencionar que grupos são esses?
Jilani
- Não. Eu prefiro não citar nomes até ter elaborado o relatório da viagem, que será encaminhado ao Secretariado-Geral da ONU.

Desafios - Apesar dos problemas, a senhora considera satisfatório o resultado do julgamento dos assassinos de Dorothy Stang? As sentenças de prisão foram justas? (Um dos assassinos foi condenado a 27 anos de prisão e o outro a 17.)
Jilani
- Eu não me sinto à vontade para comentar o veredicto em si porque isso é uma parte jurídica. Mas eu acho muito encorajador que uma violação aos direitos humanos, como foi a morte da missionária, tenha sido punida. Outro aspecto muito positivo é que eu tive toda a liberdade para realizar o meu trabalho. Recebi todas as informações que solicitei. Contei com o apoio das autoridades. Falei com todas as pessoas que quis e algumas delas, inclusive, me pediram desculpas pelo ocorrido. Uma demonstração de que a sociedade se sente culpada por não ter conseguido proteger os direitos humanos.

Desafios - Além de acompanhar o julgamento, que outros compromissos a senhora cumpriu no Brasil?
Jilani
- Eu visitei uma série de lugares, estive em Marabá e em Belém, no Pará, fui a Recife e a Salvador. Também estive em São Paulo e em Florianópolis. Em todas essas cidades, eu tive contato com os movimentos pró-direitos humanos. Conversei com os ativistas e eles chamaram minha atenção para as dificuldades que enfrentam. Também tentei descobrir se as ações sociais recebem a proteção que merecem

Desafios - E qual é sua conclusão sobre esses encontros?
Jilani
- Novamente, eu prefiro não mencionar nenhum caso isolado, mas constatei que o Brasil é um país peculiar. Como eu disse, ainda estou aprendendo, mas é um processo muito interessante. Este é um país com um movimento social muito rico, que tem um arcabouço legal de reconhecimento dos direitos sociais e econômicos em um nível que não tenho visto em outros países. Ao mesmo tempo, os defensores dos direitos humanos enfrentam dificuldades. Portanto, há uma questão que precisa de mais reflexão para conseguir descobrir o que há de errado, e essa é a razão fundamental pela qual estou no Brasil.

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Desafios - A senhora é paquistanesa, um dos maiores países muçulmanos do mundo. Como a senhora vê a questão dos direitos das mulheres nas sociedades islâmicas?
Jilani - Não é possível falar sobre as sociedades islâmicas como um todo porque elas são muito diversas. Os muçulmanos do meu país são muito diferentes dos da Malásia, que por sua vez são diferentes daqueles do Oriente Médio. Mas, se falarmos de sociedades nas quais o governo adotou a lei religiosa, é uma questão à parte. Nesses lugares, as mulheres enfrentam uma situação difícil. O que eu sinto nesses países é que a religião é usada para a manutenção do poder, para controlar e submeter a população. Nas minhas viagens, percebo que, quase sempre, o povo não é fundamentalista e não apóia essas regras, que são usadas para impor limites a um grupo ou outro. Todos os que trabalham para defender os direitos humanos precisam superar enormes dificuldades por causa da intolerância religiosa. As mulheres, em especial, têm mesmo muitos problemas. Mas eu gostaria de dizer que os direitos das mulheres são desrespeitados em todas as sociedades que apresentam tendências ao totalitarismo. Não apenas no caso do radicalismo religioso, mas também do nacionalismo exacerbado, por exemplo.

Desafios - Quando a senhora menciona o nacionalismo, a que países se refere?
Jilani
- Eu prefiro não citar países específicos. Na minha posição, não é bom fazê-lo. Eu poderia falar de um e deixar outro de lado. Já tive problemas por causa de exemplos. Não seria bom

Desafios - A China tem sido o foco das atenções mundiais devido ao sucesso de sua política econômica, mas pesam sobre ela diversas denúncias de violação aos direitos humanos. Como a senhora vê a situação chinesa?
Jilani
- Novamente, prefiro não falar de países específicos. Se eu falar da China, poderia e deveria falar a respeito de muitos outros lugares.

Desafios - Podemos dizer que as violações aos direitos humanos são mais freqüentes em países pobres do que em países ricos? Pode-se estabelecer uma relação entre a riqueza e o respeito aos direitos humanos?
Jilani
- Eu acho que não é simplesmente uma questão de que os países mais pobres não respeitam tanto os direitos humanos como os países ricos. Até porque também existem sérias violações aos direitos humanos nos países desenvolvidos. O problema, é claro, é que nas sociedades mais pobres a pobreza em si já é uma violação aos direitos humanos. Infelizmente, em muitos países, os governos usam a pobreza como uma desculpa para não adotar políticas de promoção aos direitos humanos. Eu sei que a pobreza é uma realidade, mas é uma realidade que pode e deve ser modificada, e isso é uma responsabilidade dos governantes. O problema está na forma como você considera a pobreza. Por isso, eu prefiro usar a palavra pobre do que a palavra pobreza. A pobreza não deve ser vista simplesmente como um conceito, porque, se ela é considerada um conceito, perde a dimensão dos indivíduos e não serão feitas muitas coisas para aliviar o sofrimento dos pobres. Não temos de pensar em termos de pobreza, mas em termos de seres humanos.

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Desafios - Qual é o maior desafio que a senhora enfrenta no momento como uma defensora dos direitos humanos?
Jilani- Há muitos desafios, mas eu acho que um dos maiores desafios atuais é o combate à ilusão de que o respeito aos direitos humanos coloca em risco a segurança dos países. Muitos alegam que não é possível garantir a segurança sem violar os direitos humanos. Esse é um desafio muito sério para os que defendem e promovem os direitos humanos.

Desafios - Faz cinco anos que a senhora trabalha no Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos. Durante esse tempo, qual foi a experiência que a deixou mais feliz?
Jilani
- É óbvio que muitos acontecimentos me trouxeram alegria, mas o que me deixa mais feliz é ver, ao longo do tempo, o aumento da solidariedade e da capacidade de mobilização da sociedade civil em defesa dos direitos humanos. Mais do que qualquer outro avanço com os governantes, a conscientização da sociedade civil é importante. Eu também fico entusiasmada com a postura da ONU, que jamais perde a perspectiva de que os direitos humanos não podem ser sacrificados sob circunstância alguma. Nem em nome da segurança, nem em nome do desenvolvimento. Nesse sentido, a ONU está fazendo um trabalho muito importante. E ela também está cada vez mais próxima da sociedade civil. Até porque eu acredito que não se pode construir uma comunidade verdadeiramente internacional sem incluir a sociedade civil. As decisões podem ser tomadas no contexto dos organismos multilaterais, mas elas terão de ser colocadas em prática e vivenciadas pela sociedade. Dentro da própria ONU houve mudanças no sentido de valorizar mais a defesa dos direitos humanos, de forma que o departamento responsável pela promoção dos direitos humanos seja tão importante quanto qualquer outro dentro da organização

Desafios - A senhora é otimista ao olhar para a história e para o futuro?
Jilani
- Eu acho que nós, os defensores dos direitos humanos, não conseguiríamos sobreviver sem otimismo. Sim, sou e somos todos otimistas. E a cada pequeno sucesso que tenho me torno mais otimista. Eu confio na nossa capacidade de implementar mais e mais o respeito aos direitos humanos. Acredito que os progressos feitos nas campanhas de democratização e de desenvolvimento social também contribuem para aumentar o respeito aos direitos humanos. Ao contar com a solidariedade e a capacidade de mobilização da sociedade civil, como mencionei, tenho a certeza de que a defesa dos direitos humanos é um avanço inexorável.

Defender os defensores

Há cinco anos, Hina Jilani foi nomeada representante especial do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Defensores dos Direitos Humanos. Ela é a primeira ocupante do cargo criado especialmente para defender aqueles que defendem os direitos humanos. Por isso ela veio até o Brasil, viajou até Belém do Pará e foi verificar, in loco, se a justiça seria aplicada contra os assassinos da missionária Dorothy Stang. Mas nem sempre Jilani esteve na respeitada condição dos que representam organismos internacionais. Ela passou a maior parte de sua vida numa situação muito mais difícil, na arriscada posição dos que, sozinhos, levantam bandeiras contra a violência, a discriminação e o preconceito. Por causa de seus atos e opiniões, foi presa, recebeu ameaças de morte e foi vítima de atentados. Nascida no Paquistão, um dos maiores países muçulmanos do mundo, Jilani e sua irmã, Asma Jahangir, lutaram para poder estudar, se formaram em Direito e, em 1980, abriram o primeiro escritório de advocacia dirigido por mulheres no Paquistão. A firma se especializou em defender vítimas de violência doméstica, de abusos por parte do fundamentalismo islâmico e de violações aos direitos humanos. Os extremistas religiosos acusaram as irmãs de dar mau exemplo às mulheres, e elas foram classificadas de hereges. Todos esses problemas só fortaleceram a convicção de Jilani de que estava no caminho certo e a aproximaram das entidades de defesa dos direitos humanos. Foi fundadora, em seu país, da Comissão dos Direitos Humanos e do Fórum de Ação das Mulheres. Já trabalhou para outros organismos da ONU, como o Comissariado para os Refugiados (UNHCR), o Fundo de Desenvolvimento para a Mulher (Unifem) e o Fundo para a Infância (Unicef). Quase sempre trajando as típicas, e belas, roupas paquistanesas, Jilani tem o ar sereno de quem já viu muita coisa e conseguiu preservar suas convicções.

 
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