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Belita Koiller - O Brasil perdeu vários bondes com essa mania de comprar tecnologia pronta

2006. Ano 3 . Edição 27 - 5/10/2006

O Brasil perdeu vários bondes com essa mania de comprar a tecnologia pronta. Mas na área de computação quântica temos competência

Por Andrea Wolffenbuttel de Brasília

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Pesquisadora do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Belita Koiller foi uma das três cientistas brasileiras a ganhar o prêmio L'Oréal-Unesco para Mulheres na Ciência. Seus estudos estão voltados para duas áreas inovadoras: a computação quântica e as nanociências.Nesta entrevista,a professora conta como é a vida de uma mulher que decidiu permanecer no Brasil, trabalhar com ciência e competir com os estudiosos de todo o mundo em pé de igualdade

Desafios - A senhora trabalha com pesquisa de propriedades eletrônicas, estruturais e modelagem computacional de materiais. Por que escolheu essa atividade?
Koiller - Eu queria trabalhar em alguma área da física que tivesse atividade experimental, que fosse próxima das aplicações e das experimentações acessíveis no Brasil.

Desafios - A senhora conseguiria explicar a um leigo como é seu trabalho?
Koiller -
Na verdade, trabalho com física da matéria condensada, que é a área da física mais próxima das aplicações em engenharia. Eu estudo as propriedades eletrônicas dos materiais.Por que alguns materiais são isolantes, as pedras, os cristais,por exemplo, enquanto outros são condutores e transportam corrente elétrica, sobretudo os metais.

Essa diferença é fundamental. Embora isso já fosse familiar desde a antiguidade - desde a Idade da Pedra o homem sabe que os materiais têm características diferentes - foi só com o advento da mecânica quântica, em 1930, que essa questão foi respondida.Foi a partir desse ponto que se conseguiu explicar o comportamento dos elétrons.Esse foi o início da física moderna da matéria condensada. É essa grande revolução que a gente vive, ou sofre, até hoje de "domesticar"os elétrons.

Desafios - Colocá-los nos trilhos.
Koiller -
Na primeira metade do século XX, verificou-se que era necessário um meio mais robusto para controlar a corrente e surgiram as válvulas. Elas também são dispositivos que controlam os elétrons,só que os elétrons na sua forma despida, como nos raios, não em seu hábitat natural. O hábitat natural do elétron são os materiais e pensou- se primeiro nos materiais metálicos, nos quais os elétrons caminham livremente, só que os metais são muito lineares, a causa e o efeito são muito lineares.Para chegar aonde queríamos era necessário conseguir outros comportamentos, mais inesperados, mais diversificados. Foi quando em 1949, 1950, surgiu esse dispositivo baseado em materiais semicondutores que era o patinho feio dos materiais, não era nem uma coisa nem outra,nem isolante nem condutor, mas era justamente essa coisa da intuição. Um grupo de três pesquisadores no laboratório da Bell, nos Estados Unidos, desenvolveram um dispositivo chamado transistor, o substituto das válvulas, que é uma mistura de resistor com transmissor. O transistor fazia a mesma coisa que a válvula, só que com elétrons controlados dentro dos materiais semicondutores.

Uma mulher quase normal

Com o olhar sempre agitado, apesar da voz mansa, a professora Belita Koiller parece estar o tempo todo à procura de respostas para perguntas que só ela conhece. Mas não é assim. Como ela mesma admite nesta entrevista, sua especialidade é formular perguntas.

As respostas vêm naturalmente. Foi usando esse método estranho que a jovem, descendente de russos e romenos, construiu uma carreira de sucesso numa área pouco freqüentada por mulheres: a física quântica. Carioca da gema (nasceu e cresceu em Botafogo), formou-se em Física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUCRJ), fez doutorado na Universidade da Califórnia, Berkeley, nos Estados Unidos, e voltou para o Brasil. Lecionou e pesquisou na PUCRJ por dezoito anos, de onde saiu em 1994 para trabalhar no Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

 

Coordenou a área de Física da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) entre 1999 e 2004 e foi a primeira física titular da Academia Brasileira de Ciências. Casada, Belita Koiller tem um filho que estuda Matemática na Universidade de Nova York (NYU) e pretende seguir a carreira da mãe. Atualmente, ela divide seu tempo entre a UFRJ e a Universidade Maryland (EUA), onde desenvolve alguns trabalhos em parceria. Quando tem algum tempo livre, gosta de nadar, ir ao cinema e viajar para encontrar o marido, que trabalha em Washington (EUA). O que fez com os 100 mil dólares do prêmio L'Oréal-Unesco? Nada. O dinheiro está guardado para comprar um imóvel para o filho.

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Desafios - O Prêmio L'Oréal-Unesco foi concedido por um trabalho específico ou pelo conjunto da sua obra?
Koiller -
Acho que as duas coisas. Recentemente, venho desenvolvendo pesquisas nessa área de semicondutores, mas já com aplicações visando ao futuro. Estamos chegando ao extremo da escala nano, nanociência, nanotecnologia e, nessa escala, cada átomo pode fazer uma diferença.Até agora sempre estudamos o comportamento coletivo dos átomos. Embora atualmente cada elétron seja controlado pela mecânica quântica, as funções que são manipuladas nos dispositivos em uso são funções medidas em termos de correntes, voltagens, que são quantidades clássicas. No futuro, provavelmente remoto, falaremos de propriedades quânticas em escala real, ou seja,mediremos átomo por átomo, elétron por elétron.

Desafios - Como foi que a senhora se transformou em cientista?
Koiller -
Fui seguindo os estudos normais, o ginásio, o científico e, sempre que começava uma matéria nova de ciências, matemática, química e depois principalmente física, eu achava fascinante. Fiquei com curiosidade de aprender mais e estudar mais. Sempre fui interessada por essas coisas da natureza, além de contar com a intuição, que também ajuda.

Desafios - Como a intuição ajuda?
Koiller -
Intuição é uma coisa que ajuda a resolver problemas.Você depara com um problema concreto de movimento: como saber que carro vai chegar em primeiro lugar numa corrida e por que um vai checar antes do outro? Claro que você vai fazer os cálculos, mas, antes disso, você já tem uma intuição, um chute. Eu era boa de chute, e isso contribui para solucionar questões ligadas à física, ao contrário do que ocorre com a matemática, que é uma ciência abstrata.

Desafios - Como assim?
Koiller -
A física é baseada em leis fundamentais da natureza.A matemática, por sua vez, é construída com base em postulados,axiomas,teoremas,que são criações abstratas da mente. A física existe para explicar e explorar o universo real, ela é concreta e tudo o que existe obedece às leis da natureza.Tudo o que foi construído, o gravador que você usa, por exemplo, obedece às mesmas leis fenomenológicas. Claro que existem várias camadas de tecnologia numa máquina como essa, e a gente quase esquece das leis da natureza, mas elas estão aí. É como a maçã de Newton, ela nunca vai cair para cima, sempre cairá para baixo, com a mesma aceleração, na mesma velocidade. Para os problemas de física, por mais complexos que sejam, a intuição funciona. Quando alguém me apresenta um problema, eu não saio fazendo contas. Meu estilo é imaginar primeiro como vai ser a solução.

Desafios - A senhora se lembra de algum exemplo específico?
Koiller -
Por exemplo, no estudo de interação entre dois átomos dentro de um cristal. Há muito tempo esse problema estava colocado e ninguém se interessava em estudá-lo. Não sei por que intuí que o resultado seria interessante. Fiz o cálculo e não foi um cálculo complicado, foi simples. Mas o resultado foi surpreendente porque as partículas são muito mais sensíveis à mudanças de posição do que eu havia suposto no início. As duas partículas dentro do cristal têm comportamento muito diferente do que teriam dentro dos mesmos átomos num espaço livre. É importante dizer que metade do trabalho de pesquisa em ciência é saber se colocar as perguntas certas,porque elas levarão a respostas interessantes. Achar a pergunta é mais difícil do que achar a resposta. Costumo dizer a meus alunos que elaborar uma prova é mais difícil do que resolvê-la.

 

Desafios - A senhora disse que quis trabalhar nessa área porque havia campo aqui no Brasil. Isso significa que estamos bem posicionados em relação a esse tipo de pesquisa?
Koiller -
Exatamente. É aí que eu queria chegar. O Brasil perdeu vários bondes, perdeu o bonde da tecnologia, do silício, e sempre houve essa mania de comprar tecnologia pronta. Mas na área de informação e computação quântica, que é uma área nova, o Brasil tem competência. E mais importante: tem bons núcleos trabalhando em colaboração,porque a pesquisa científica, hoje em dia, não se concebe isolada. É preciso trabalhar em conjunto, porém em pé de igualdade com os melhores grupos internacionais. Essa é uma área na qual o Brasil pode se desenvolver e inclusive liderar globalmente.

Desafios - Essa colaboração internacional à qual a senhora se refere vem de outras universidades ou da iniciativa privada?
Koiller -
Minha experiência pessoal é com universidades.Na verdade, como grande parte dessa pesquisa ainda é prospectiva, ela está sendo desenvolvida exclusivamente em universidades e laboratórios de pesquisa.

Desafios - Seus colegas de outros países também trabalham apenas com universidades?
Koiller -
Sim. É claro que a indústria acompanha atentamente.A IBM e outras indústrias que possuem laboratórios de pesquisa estão de olho nos trabalhos, mas ainda a fundo perdido.

"A indústria deveria absorver uma parte importante dos cientistas formados,mas ela não acredita, não investe. Prefere comprar tecnologia pronta e perde com isso. Perde em competitividade e criatividade"

Desafios - Quando a pesquisa que a senhora está desenvolvendo agora puder ser aplicada na indústria, o Brasil vai conseguir se manter na dianteira? Nós não temos uma IBM.
Koiller -
Eu espero que consiga, vejo já iniciativas nesse sentido, não especificamente com computação quântica, mas em São Paulo a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) tem conseguido progressos significativos na área de mapeamento de DNA, projeto Genoma. É importante ter empresas incubadas, protegidas pelas agências de fomento, para colocar em prática a tecnologia.

Acredito que vamos nos manter na liderança, senão não estaria trabalhando. Sempre achei que uma parte importante da minha pesquisa é que ela dê um retorno à sociedade. Não só em termos científicos, mas também humanos. Parte importante nesse trabalho da universidade é a formação de recursos humanos, são os alunos que estão se formando e podem trabalhar na indústria. Tenho um aluno, por exemplo, que foi trabalhar no laboratório de pesquisas da L'Oréal em Paris e ele está fazendo pesquisa aplicada.

Desafios - Voltando à L'Oréal, como foi que a senhora ganhou o prêmio?
Koiller -
Eu fui indicada.É um prêmio sênior, prêmio mesmo, não é um incentivo. Mas, entre os desdobramentos desse prêmio,o que me deixou mais satisfeita foi que a L'oréal resolveu fazer um programa de incentivo aqui no Brasil. Nesse caso, as jovens cientistas, com até quatro anos de conclusão de doutorado, precisam se inscrever e concorrem a um programa de bolsas, em parceria com a Academia Brasileira de Ciências.

A primeira premiação foi agora, no dia 21 de setembro, aqui no Rio de Janeiro. Cinco pesquisadoras ganharam 20 mil dólares cada uma para desenvolver seus trabalhos. Eu acho uma maneira interessante de incentivo, porque é uma forma de marketing de divulgação da empresa, é uma forma de apoio às mulheres e um reforço para a ciência.

Desafios - Já que estamos falando das mulheres, a senhora acha que o trabalho da mulher no mundo da ciência e da pesquisa é diferenciado do trabalho do homem?
Koiller -
Eu não gosto muito de falar sobre isso porque acho que é algo a ser tratado pelas ciências sociais, mas sinto que o trabalho da mulher cientista é tão valorizado quanto o do homem.O que eu vejo é que existem tantas outras dificuldades de trabalhar no Brasil, mais importantes do que as que eventualmente tenha havido por eu ser mulher.Aqui tudo é difícil, a infraestrutura é muito ruim, muito frágil. Ir às conferências, ter acesso às bibliotecas on-line, tudo é muito tênue. A gente tem agora, mas não sabe se terá amanhã.Depende do orçamento, depende das políticas, enfim, existe uma insegurança no dia-a-dia.Tenho muita sorte de ter tido as oportunidades que tenho e tive. Em termos de mulher, o que percebo é que a carreira científica não é tão considerada pelas estudantes na hora de fazer uma opção de futuro. Penso que isso é que precisa ser estimulado.

 

Desafios - Se eu fosse aluna, estivesse estudando e dissesse que gostaria de trabalhar com física, a senhora me apoiaria?
Koiller -
Eu diria "vai fundo, acredite em você!" Para os bons não falta emprego, quem tem perseverança - e isso eu acho que as mulheres têm um pouquinho mais que os homens - não pode se deixar abater. Se uma pessoa chega ao ponto de querer, vale a pena e eu acho que tem de insistir.

Desafios - A senhora estudou em Berkeley, nos Estados Unidos, e teve oportunidade de trabalhar lá. Por que optou voltar para o Brasil?
Koiller -
Sempre quis voltar para o Brasil. Eu fui para lá com o firme propósito de voltar. E olha que era uma época bem diferente de hoje, tinha bastante oportunidade de trabalho nas universidades. O doutorado naquela época era suficiente para uma posição na universidade. Hoje em dia é muito mais lento, os mercados absorvem os profissionais quatro anos depois do doutorado. Mas eu tinha certa dose de idealismo, queria estar perto da família,dos amigos e também tive ótimas oportunidades aqui. Já trabalhei fora por pequenos períodos, como professor visitante, mas sempre quis voltar e não me arrependo.

Desafios - E como a senhora vê as perspectivas científicas no Brasil?
Koiller -
Estão melhorando como um todo. Quer dizer, no conjunto da comunidade científica estamos crescendo, estamos formando mais doutores e de melhor qualidade.A ciência que está sendo feita no Brasil tem cada vez mais qualidade. O que percebo de contraste com a minha época é que individualmente, para cada jovem que se forma, está mais difícil encontrar uma oportunidade de trabalho com pesquisas. Infelizmente no Brasil as opções em ciência continuam sendo, em grande parte, um sonho do acadêmico. A indústria, que deveria absorver parte importante dos cientistas formados, não acredita, não investe,prefere comprar tecnologia pronta e perde com isso.Perde em competitividade e criatividade.A capacidade dos pesquisadores brasileiros já está comprovada. Toda vez que a indústria precisa de soluções brasileiras,como no caso da exploração de petróleo em águas profundas ou dos motores bicombustíveis, elas são produzidas de forma brilhante. Mas, lamentavelmente, para a tecnologia mais corriqueira não existe essa confiança, os empresários preferem não correr risco,e eu acho que essa massa que está sendo formada está pronta para contribuir em outras áreas, não só na área acadêmica, mas falta no mercado de trabalho.

Desafios - A senhora acha que a Lei de Inovação, que permite que as empresas abatam uma alíquota maior do Imposto de Renda com base nos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, pode mudar esse quadro?
Koiller -
Ainda não sei quais serão os efeitos da Lei de Inovação, o que sei é que não existe, em ciência, uma lei equivalente à Lei Rouanet. A Lei de Inovação é para quem desenvolve pesquisa ou faz uma parceria para desenvolver uma pesquisa específica.

Ela não ampara quem simplesmente quiser investir num projeto científico realizado por terceiros. Essas bolsas concedidas às jovens cientistas, por exemplo, não têm nenhum impacto fiscal para a L'Oréal.Mas, se eles investissem numa peça teatral ou num show, poderiam deduzir isso do imposto.

"Não existe, em ciência, uma lei equivalente à Lei Rouanet. A Lei de Inovação é para quem desenvolve pesquisa,mas ela não ampara quem simplesmente decide investir em um projeto científico realizado por terceiros"

Desafios - Se senhora pudesse fazer um pedido ao gênio da lâmpada para o seu trabalho, o que pediria?
Koiller -
Pediria infra-estrutura, instalações dignas,que não faltassem tanta água, luz.

Desafios - Quando a senhora falou em instalações dignas, pensei que fossem coisas mais sofisticadas, não água e luz...
Koiller -
Seria importante um prédio novo, com paredes de alvenaria, como o que está sendo construído para o Instituto de Física.

Desafios - Tem algum sonho específico que a senhora persegue no seu trabalho, alguma meta?
Koiller -
Não, não, gostaria apenas de ter um ambiente para poder discutir com várias pessoas e com os estudantes, sem a interferência dos problemas do dia-a-dia e da carga administrativa. Um pouco mais de leveza.

Desafios - Nada de sonhar com o Prêmio Nobel?
Koiller -
Não, não... aliás, sim. Gostaria que um de meus alunos ganhasse.

 
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