Nanak Kakwani - Economista indiano desenvolveu uma nova metodologia para medir a pobreza |
2006. Ano 3 . Edição 29 - 11/12/2006 Os governos precisam saber como a pobreza muda no decorrer do tempo para que possam orientar suas políticas O economista indiano Nanak Kakwani desenvolveu uma nova metodologia para medir a pobreza, usando como parâmetro não apenas a renda, mas também outras necessidades de consumo. Após três anos no Brasil, durante os quais criou o Centro Internacional de Pobreza, ele está voltando para a Austrália e conta, nesta entrevista, como foi sua experiência e como vê o crescimento do país Desafios - Como foi a experiência do senhor à frente do Centro Internacional de Pobreza? Desafios - E esse é um Centro Internacional que estuda pobreza no mundo inteiro, certo? Desafios - O Pnud tem outros centros como esse espalhados pelo mundo? Desafios - Que tipo de trabalho é desenvolvido no Centro? O que fazem? Quanto sofrem? Essas informações são muito úteis para entender a extensão e a natureza da pobreza. Eu coloquei muita ênfase nessa área porque não há muitos dados e indicadores nesse segmento. E tínhamos de ser internacionais.Então,a primeira coisa que fiz foi contratar um gerente de dados para coordenar a informação vinda de todas as partes do mundo.Hoje,nós temos aqui uma base de dados muito boa e podemos fazer muitas análises internamente sem precisar ir até os países estudados para realizar pesquisas in loco. Isso aumentou muito nosso potencial de produção, já que basta ter a metodologia e aplicar de forma direta sobre os dados disponíveis.Nós começamos aqui muitas pesquisas importantes, sobretudo aquelas ligadas ao que é conhecido como crescimento pró-pobre. O escritório é bonito, não é? O indiano Nanak Kakwani não consegue esconder o orgulho de ter participado da construção do Centro Internacional de Pobreza do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Pergunta, de maneira humilde e com um enorme sorriso estampado no rosto:"O escritório é bonito, não é?"O economista de renome mundial, que chegou ao Brasil em janeiro de 2004, tem no currículo mais de oitenta artigos publicados em revistas internacionais, sendo nove na Econometrica, uma das publicações mais importantes da área, além de ter dois livros editados pelas universidades de Cambridge e Oxford, na Inglaterra. Com sentimento de missão cumprida, Kakwani também não consegue disfarçar a satisfação por voltar para sua casa na Austrália, onde o esperam sua mulher e filha. Doutor pela Universidade de Délhi, na Índia, Kakwani foi professor de estatística na Universidade New South Wales, em Sydney, na Austrália. Deu aulas também nas universidades de Birmingham (Inglaterra), Punjabi e Kurukshetra (Índia). Seus trabalhos são voltados para teorias econômicas, desigualdade e pobreza, bem-estar social e desenvolvimento econômico. Mas talvez uma de suas maiores contribuições tenha sido o novo método de medição da pobreza que procura identificar se as pessoas conseguem se alimentar adequadamente baseado numa cesta de bens e serviços definida para cada nação. Para Kakwani,o acesso à nutrição adequada é um bom indicador de qualidade de vida, já que reflete aspectos como saúde, moradia e educação.No estudo Novas Medidas da Pobreza Global, Kakwani e o economista Hyun Son, também do Centro, selecionaram dezenove países de baixa renda e calcularam quanto a fatia mais pobre da população gasta,em média,para comprar o equivalente a 1.000 calorias. Multiplicado pela quantidade mínima de calorias necessárias, esse valor corresponde à renda mínima necessária para que as pessoas tenham condições de se alimentar. Se para o Banco Mundial existiam no mundo, em 2001, 1,1 bilhão de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, Kakwani e Son estimaram, para o mesmo período, uma taxa 24% superior: 1,4 bilhão. Desafios - Qual é o signif icado de crescimento pró-pobre? Que países alcançaram esse tipo de crescimento? Desafios - O senhor poderia analisar em detalhes a experiência brasileira? Esse crescimento pró-pobre é um processo sustentável no Brasil? Desafios - O senhor acha isso possível? Desafios - O que ajudou a dar essa virada no modelo de crescimento? Kakwani - Os programas de transferência de renda do governo tiveram um impacto significativo nos resultados pró-pobres. No governo Lula, os programas de bem-estar social, como o Bolsa Família, foram expandidos e, ao mesmo tempo, acertaram seu foco atingindo quem realmente precisava. É claro que não é possível depender inteiramente da expansão dos programas governamentais para atingir o crescimento pró-pobre. Precisamos prestar atenção cada vez mais nas reformas do mercado de trabalho. Programas de saúde e educação também têm papel fundamental no longo prazo. É importante ainda criar portas de saída de programas como o Bolsa Família. Isso significa desafiar os beneficiários desses programas com condicionalidades cada vez mais avançadas. Um exemplo seria avaliar a melhoria da qualidade da educação em cada escola pública usando o Prova Brasil.Claro que isso implica custos administrativos. Portanto, é importante ter um equilíbrio.É preciso pesquisar constantemente no sentido de melhorar os programas de transferência de renda para atingirmos a máxima redução da pobreza considerando as limitações de recursos. Desafios - Como tem sido a experiência do Sudeste Asiático de maneira geral? Desafios - Qual é a relação que se pode estabelecer entre políticas pró-pobre, programas sociais e mercado de trabalho? Quando a demanda cresce, as taxas relativas de retorno da educação aumentam para os não-pobres.Assim, é difícil prever se o mercado de trabalho vai continuar a ser pró-pobre como tem sido recentemente. Desafios - Nesse processo de redução da desigualdade, os Objetivos do Milênio são importantes? Desafios - O senhor desenvolveu uma metodologia para medir a pobreza considerando diferentes parâmetros. Como funciona essa metodologia? Kakwani - Há muitas questões envolvidas na pobreza.Uma delas é a mensuração e o monitoramento. Precisamos ter uma linha de pobreza para identificar quem são os pobres. Essa mensuração é uma tarefa complexa porque tem de levar em conta muitos fatores que influenciam no bem-estar das pessoas. Em primeiro lugar, todas as pessoas têm necessidades diferentes, necessidades que devem entrar nesses cálculos. Pessoas de idades e gêneros distintos precisam consumir diferentes quantidades de energia para se manter adequadamente nutridas. Pessoas mais velhas precisam gastar mais com a saúde, enquanto as crianças precisam de mais dinheiro para a educação. Desenvolvemos uma metodologia para delimitar as linhas de pobreza levando em conta essas necessidades especiais. Também desenvolvemos uma metodologia para calcular a pobreza global.Estimamos que existam no mundo 1,4 bilhão de pessoas vivendo na mais absoluta pobreza. Estimativas do Banco Mundial dão conta de que esse número seja de 1,1 bilhão de pessoas. O Banco Mundial chegou a essa estimativa baseado numa linha de pobreza ad hoc (para esse fim) definida pela sobrevivência com 1 dólar por dia. Nossa metodologia é superior e está baseada nas necessidades nutricionais que uma pessoa tem. "Os governos querem saber como a pobreza muda no decorrer do tempo. Portanto, é importante acompanhar essa transformação e também descobrir como a pobreza está distribuída na população.Quem são os pobres? Onde eles estão? O que fazem? Quanto sofrem?" Desafios - Quais são as implicações dessa nova metodologia? Desafios - Falando em consumidor, qual é o impacto dos preços no bem-estar das pessoas? Desafios - E por que o senhor está indo embora justamente agora? Kakwani - Completei quase três anos aqui.A princípio, deveria ter ficado só dois anos. Eu fui, durante trinta anos, professor da Universidade New South Wales, em Sydney, na Austrália.Decidi enfrentar o desafio de vir para cá para montar esse Centro,agora posso voltar. Desafios - O senhor está voltando para a Austrália? Quais são seus planos? Desafios - Como o senhor vê o mundo daqui a cinqüenta anos? O senhor é otimista? |