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Administrando as adversidades - Recessão e incentivos fiscais derrubam arrecadação

2009 . Ano 6 . Edição 52 - 05/07/2009

 

O mapa das Exportações

Por Liliana Lavoratti, de São Paulo

Retração do mercado mundial derruba vendas de produtos industrializados, mas os bens primários garantem o saldo da balança comercial brasileira. Para onde ir?

É senso comum que as vendas externas brasileiras viveram um processo de "desindustrialização", com forte concentração das exportações em bens primários e recursos naturais, com nível tecnológico aquém do desejável para gerar valor agregado à produção nacional. Com a crise internacional, a fragilidade ficou mais exposta: de janeiro a abril deste ano, as exportações brasileiras caíram 17,53%, em média. A maior queda, de 28,9%, foi nas vendas de produtos industrializados. No período, as exportações de produtos básicos aumentaram 7,37%. A questão é que esses produtos geram menos empregos e têm baixo valor de mercado. Uma tonelada de minério de ferro, por exemplo, é vendida a menos de US$ 60 no mercado internacional, valor insuficiente para importar um par de tênis de marca.

Esse olhar sobre a inserção externa do País ganha relevância no momento em que alguns "gargalos" do passado foram superados e começam a ganhar espaço questões de longo prazo, como a estratégia de desenvolvimento mais acertada e, dentro disso, o papel das exportações. "Como queremos crescer, em quais setores investir e o perfil ideal das vendas externas eram questões inimagináveis de tratar antes, pois a preocupação era o imediatismo, como o combate à inflação e a fragilidade externa", afirma Roberto Pires Messenberg, coordenador do Grupo de Análise e Previsões da Diretoria de Estudos Macroeconômicos (Dimac) do Ipea. Segundo ele, agora que a "casa está arrumada", as reservas internacionais alcançaram patamar elevado e o desempenho fiscal permite reduzir o superávit primário sem colocar em risco o financiamento da dívida pública, o contexto é favorável a uma reflexão mais demorada sobre a dinâmica das exportações e a inserção externa.

Se na década de 90 o objetivo era gerar saldo na balança comercial e, portanto, tanto fazia se as exportações eram de banana ou de aviões, hoje galgar degraus de desenvolvimento tecnológico é essencial para a estratégia de desenvolvimento de qualquer país. A experiência demonstra que nenhuma nação da dimensão do Brasil avançou sem aperfeiçoar a indústria.

"Somos e vamos continuar sendo um grande produtor e exportador de commodities, mas também cresceremos na cadeia de agregação de valor. Já aliamos a produção agrícola à industrial, portanto temos um agribusiness desenvolvido e não apenas uma agricultura vigorosa", afirma Alessandro Teixeira, presidente da Agência de Promoção de Exportações (Apex Brasil) e da World Association of Investment Promotion Agencies (WAIPA), organização que reúne as agências de promoção de investimentos de 156 países. "O que vai garantir a sobrevivência da humanidade daqui a algumas décadas não serão os computadores, mas os alimentos", acrescenta.

Para Alessandro Teixeira, é um mito dizer que o Brasil é exportador de produtos básicos, uma vez que algumas commodities estão nas categorias de industrializados e semi-industrializados, como é o caso de ferro refinado e celulose, respectivamente. O expressivo aumento das vendas externas nos últimos anos (antes da crise), segundo ele, é explicado em boa medida pela expansão das exportações, tanto em quantidade quanto em valor, de semimanufaturados - complexo soja, carnes, minérios, suco de laranja, petróleo e celulose. "Vários autores demonstraram, mesmo com uma taxa de câmbio apreciado, que as exportações brasileiras de produtos intensivos em tecnologia apresentaram crescimento nos últimos anos", argumenta.

O secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Welber Barral, faz coro com Alessandro Teixeira. "No ano passado, mais de 60% de tudo que o Brasil exportou correspondeu a produtos industrializados, sendo 46,8% de bens manufaturados e 13,7% de bens semimanufaturados. Esse desempenho confirma uma tendência verificada ao longo dos últimos dez anos. De janeiro a maio de 2009, mesmo diante da crise econômica mundial, a participação de bens industrializados na pauta exportadora brasileira chegou a 57,2%", afirma.

Segundo Barral, as exportações de produtos industrializados vêm apresentando forte crescimento: de US$ 41 bilhões em 2000 para US$ 119,7 bilhões em 2008. Neste ano, as vendas internacionais de produtos brasileiros industrializados já somam US$ 31,7 bilhões até maio, apesar das "barreiras nos países importadores, sobretudo nos países desenvolvidos".

O êxito da política brasileira de comércio exterior, diz ele, foi a aposta na diversificação da pauta de produtos exportados e a ampliação de mercados. "Hoje, as empresas brasileiras vendem uma gama muito maior de produtos para mais de 200 países. Em 2002, mais de 25% das exportações brasileiras foram destinadas aos Estados Unidos. Naquele ano, as exportações gerais somaram US$ 60,4 bilhões, dos quais US$ 15,3 bilhões foram para os Estados Unidos", sublinha. Em 2008, apesar de a participação dos EUA ter se reduzido para pouco mais de 13%, os embarques para aquele mercado somaram US$ 27,4 bilhões.

Houve uma diversificação de mercados. "Em um período de crise mundial, esse fato pode fazer toda a diferença para o País. Se continuássemos a destinar mais de um quarto das nossas exportações para os Estados Unidos, os reflexos da crise sobre nossos embarques seriam muito maiores do que o que estamos sentindo hoje", acrescenta o secretário.

Fábio Silveira, da RC Consultores, discorda: "A denominação genérica de semimanufaturados e manufaturados serve de disfarce para vários produtos básicos e commodities, que passam por cadeias curtas e com padrão tecnológico baixo". A soma das vendas externas do agronegócio (US$ 60,63 bilhões), bens intermediários (US$ 56,24 bilhões) e petróleo e derivados (US$ 23,05 bilhões), no ano passado, correspondeu a 71% (US$ 139,92 bilhões) do total exportado (US$ 191,64 bilhões). Mas o saldo comercial dos bens intermediários foi de apenas US$ 4,34 bilhões por causa do volume elevado das importações (US$ 51,90 bilhões). Já a balança de bens de capital foi deficitária em US$ 28,44 bilhões.

"Queimamos o saldo do agronegócio, de US$ 52,74 bilhões, com as importações de US$ 51,90 bilhões de bens intermediários", exemplifica Silveira. O grosso dessas compras no exterior foi do complexo químico (US$ 36 bilhões). Somente de componentes da indústria eletroeletrônica, o País importou no ano passado US$ 17,8 bilhões e exportou apenas US$ 3,3 bilhões.

Até mesmo no petróleo e derivados a balança comercial é deficitária -US$ 10,09 bilhões em 2008. O desequilíbrio maior, de US$ 7,3 bilhões, está nos derivados petroquímicos mais elaborados, como plásticos utilizados para fabricação de equipamentos da indústria automobilística e eletroeletrônicos. Por isso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alertou que o Brasil não quer exportar o petróleo bruto do pré-sal, mas produtos industrializados do petróleo. Afinal, o barril do petróleo estava valendo, no mês passado, menos de US$ 70 e houve época em que era vendido a menos de US$ 40.

As exportações de bens primários e de recursos naturais não é necessariamente ruim para o Brasil, afirma o economista da LCA Consultores Francisco Pessoa Faria. O crescimento do consumo mundial de alimentos, por exemplo, pode tornar o negócio lucrativo. "Existem fatores que indicam desde já a possibilidade de mudança na tendência secular de redução dos preços de commodities", lembra Faria. A volatilidade dos preços das commodities, entretanto, é um fator de preocupação, porque deixa o País refém do humor das bolsas de valores mundo afora.

A produção agrícola e mineral é uma vantagem do Brasil neste momento de recessão mundial, quando caiu a demanda por manufaturados, mas aumentou o consumo de produtos básicos. "China e Índia, que incorporaram parcela expressiva da população ao mercado, estão importando alimentos e outros produtos que as empresas brasileiras têm para ofertar", argumenta o presidente da Apex. Essa mudança fez a China se tornar o primeiro parceiro comercial do Brasil. "É uma transformação geopolítica e, portanto, estrutural também", assinala.

Nesse momento de recessão mundial, o perfil agroexportador joga a favor do Brasil, mas é preciso tomar cuidado para o País não perder o que já conquistou em termos de exportações de industrializados, alerta o economista Julio César Gomes de Almeida, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "O Brasil é um grande exportador de commodities, mas também tem capacidade de exportar manufaturados", ressalta.

A crise está prejudicando mais as exportações dos manufaturados. As exportações de automóveis caíram 47% entre janeiro e maio deste ano, frente ao mesmo período de 2008, segundo dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores). Já as exportações de aço caíram 50%, e motores elétricos, 60%, na mesma comparação. "Não se trata de quaisquer manufaturados, mas de setores onde temos reconhecida tradição e presença no mercado externo", acrescenta Julio Almeida. Ele considera "um desafio e tanto" proteger essas exportações e ao mesmo tempo expandir o número de itens com agregação de valor aos produtos básicos: "É preciso otimizar esse conjunto de itens, com mais tecnologia e maior agregação de valor".

Isso poderia ser feito com políticas de exportações de manufaturados, envolvendo também pequenas e médias empresas. "Esta é a hora certa para um programa mais agressivo de financiamento e uma reforma tributária, nem que seja voltada numa primeira fase para esses setores da economia, uma vez que a indústria é extremamente penalizada pela elevada carga de tributos", enfatiza o economista do Iedi. O óleo de soja é mais taxado do que a soja em grãos. "É preciso incentivar em vez de punir o sistema de manufatura", adverte.

Barral, secretário de Comércio Exterior, concorda: "Há a necessidade de modificações na legislação tributária brasileira, cuja complexidade acaba punindo produtos com cadeia de produção mais longa. Um esforço nesse sentido foi a atualização do sistema de drawback, que agora permite inclusive a desoneração tributária nos insumos nacionais".

Essas medidas surtirão pouco efeito se o câmbio permanecer no atual patamar, critica o empresário Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). "Tudo o que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e a Apex fazem durante anos, para convencer as empresas a ganhar mercado externo, é desfeito em um dia pelo Banco Central, que está pouco preocupado com o setor produtivo quando sanciona uma política monetária de valorização do real frente ao dólar", alfineta o industrial. O câmbio valorizado, que reduz os ganhos dos exportadores, fez Barbato reduzir a presença de sua empresa no exterior. A Cerâmica Santa Terezinha, que exportava 40% de sua produção de isoladores elétricos para 40 países, agora vende apenas 20%. "Somos teimosos. Ficamos no empate apenas para preservar o espaço lá fora", explica.

A moeda brasileira valorizou 30% entre janeiro de 2005 e junho de 2008. No período de janeiro de 2005 a junho de 2009, a valorização foi de 28,4%, enquanto o yuan, moeda chinesa, se apreciou 17,6% frente ao dólar; o iene, moeda japonesa, valorizou- se 7%; o euro teve apreciação de 5,3%, e o peso chileno 2%. Já o peso argentino e o peso mexicano desvalorizaram frente à moeda norte-americana - o primeiro perdeu 26%, e o segundo, 18,2% de seus respectivos valores.

"O Brasil dificilmente sairá dessa condição de país agroexportador, porque efetivamente pouco importa o que se está vendendo para fora, mas sim o saldo da balança comercial. E enquanto houver superávit, o governo não fará uma política articulada e organizada para valorizar as exportações", afirma Barbato. Para ele, "a indústria continuará largada às traças" enquanto os juros não deixarem de render alta remuneração ao investimento estrangeiro aplicado no mercado financeiro, e o governo não controlar a entrada desses capitais especulativos. "Sem essas duas mudanças, não haverá taxa de câmbio adequada às exportações", conclui.


Hora de definir o futuro


Pertinente não apenas por causa das questões de curto e médio prazo, mas especialmente porque está diretamente vinculado ao modelo de crescimento que o País quer ter no longo prazo, esse debate está apenas no início. Com a inflação em segundo plano, o foco passa para outras áreas. "Começamos a pensar até que ponto é interessante depender de exportações de básicos, muito influenciadas por uma demanda instável, sujeitando o nosso balanço de pagamentos a outra fragilidade, e se não seria importante robustecer nossos fundamentos externos, agregando mais valor aos manufaturados", comenta Roberto Pires Messenberg.

Essa discussão está sendo alimentada pelo choque recente de demanda externa e pela crise de liquidez no mercado internacional, que dificultam as vendas externas e por sua vez reduzem a corrente de comércio - a soma das exportações e importações. "Provavelmente neste ano vamos alcançar o mesmo saldo comercial de 2008, ao redor de US$ 25 bilhões, mas com queda de cerca de 23% nas exportações e de 25% nas importações", explica o técnico do Ipea. O Instituto estima, para 2009, em cerca de US$ 155 bilhões o volume total das exportações e em US$ 130 bilhões as importações, contra US$ 191 bilhões e US$ 165 bilhões, respectivamente, no ano passado.

Mesmo que mantenha o saldo comercial, a desvalorização cambial é necessária para evitar fragilidades no balanço de pagamentos. "Depois de tudo o que passamos, agora que está tudo arrumado, é mais do que plausível a preocupação em não deixar desandar tudo. Ou seja, qual o nível de câmbio que não comprometeria tudo o que fizemos", comenta.

Por enquanto, o balanço de pagamentos não preocupa. O Ipea considera que o déficit em transações correntes - que abrange exportações e importações de bens e serviços, mais rendas, remessas de lucros e dividendos, bem como os juros pagos ao exterior -, deverá ficar ao redor de 2% do produto interno bruto (PIB). "Isso é bom perto da trajetória que tivemos na época da virada da taxa de câmbio, quando o déficit chegou a 5%, 6% do PIB", lembra o técnico.

A questão é saber se o balanço de pagamentos garante ao longo do tempo recursos não voláteis para financiar permanentemente esse nível de déficit. "Se a taxa de investimentos permanecer entre 21% e 22% do PIB, um déficit em transações correntes da magnitude do atual não é problema. Complicado seria como no Plano Cruzado, quando o déficit era de cerca de 5% do PIB e os investimentos estavam lá embaixo, não gerando recursos para o pagamento das contas do País em dólar", comenta. A taxa de investimentos, que no ano passado ficou em 21% do PIB, deverá cair para 18% neste ano, um patamar suficiente para contrapor o déficit em conta corrente.

"Finalmente a inflação e o resultado das contas fiscais deixaram de ocupar o primeiro plano no contexto do desenvolvimento econômico. A discussão começa a ser feita com olho na taxa de investimento e também no balanço de pagamentos", enfatiza Messenberg. Outros fatores serão levados em consideração, como a possibilidade de o País usar dinheiro externo não para consumir, mas para financiar o crescimento sustentado.

 


Saúde: um desequilíbrio de US$ 7 bilhões


Uma virada na balança comercial de medicamentos, equipamentos e complexo industrial da saúde ocorreu com a abertura comercial da década de 1990. O déficit comercial saltou de US$ 500 milhões para US$ 7 bilhões, no ano passado. Nesse período, a indústria farmoquímica - que produz os princípios ativos para a fabricação dos medicamentos - quase desapareceu no Brasil. Ano passado, duas das maiores indústrias nacionais de equipamentos de saúde foram adquiridas por multinacionais. Além de serem empresas de grande porte, também eram inovadoras.

A necessidade de inverter o sinal da balança comercial do setor e reestruturar a cadeia produtiva farmoquímica no Brasil constitui um dos pontos centrais da orientação do Ministério da Saúde, no âmbito da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada em maio de 2008 pelo Palácio do Planalto, que contempla seis áreas estratégicas.

Os principais objetivos são aumentar a capacidade produtiva da indústria nacional, seu grau de inovação tecnológica e sua competitividade no plano global, ressalta o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães. O grupo de trabalho interministerial, criado para tocar o programa, propôs um projeto de lei, em discussão na Casa Civil, para estabelecer regras que promovam o mínimo de equilíbrio na competição entre produtos importados e fabricados no Brasil, na área de saúde.

"Estamos propondo uma pré-qualificação de todos os insumos importados para evitarmos baixa qualidade e nem sermos obrigados a comprar pelo menor preço produtos abaixo de qualidade mínima. Outro dispositivo do projeto de lei protege a equalização de preços nas licitações. Também queremos equilíbrio tributário em toda a cadeia de produção na área da saúde", explica Guimarães.

O projeto de lei trata também do fomento ao setor industrial público, composto de 20 laboratórios de medicamentos e biotecnologia, como o Instituto Butantã, em São Paulo, e o Biomanguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio. "Vamos estimular a produção e a inovação nessa rede de laboratórios públicos", afirma o secretário. Entre 2003 e 2008, o Ministério da Saúde investiu cerca de R$ 320 milhões na melhoria da infraestrutura dessas indústrias, e comprou delas mais de R$ 1 bilhão. Embora respondam por 90% de todo o mercado de vacinas no Brasil, os laboratórios públicos nacionais produzem apenas 30% dos medicamentos consumidos e menos de 10% dos equipamentos utilizados.

O Profarma Inovação, uma linha de crédito do BNDES destinada ao complexo industrial da saúde, liberou R$ 6,7 bilhões no ano passado, R$ 4 bilhões em 2007 e R$ 4,5 bilhões em 2006, primeiro ano de atividade. O programa oferece condições vantajosas para as empresas desenvolverem e inovarem produtos prioritários para o Ministério da Saúde. Na mesma linha vai a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), que foca a seleção de projetos que coincidam com a lista de produtos industriais - medicamentos, equipamentos, diagnósticos, vacinas - essenciais para o Sistema Único de Saúde (SUS).

"É a primeira vez na história do Ministério da Saúde que incentivos diretos estão sendo dados para fortalecer a cadeia produtiva na área da saúde no Brasil", ressalta o secretário. O trabalho é feito em várias frentes - farmoquímicos, medicamentos, vacinas, kit de diagnósticos, equipamentos. Segundo Guimarães, o poder de compra do Ministério e do SUS poderá ser utilizado para a política industrial. São R$ 10 bilhões gastos anualmente na compra de medicamentos, vacinas e equipamentos hospitalares.

A expectativa é que o programa da área de saúde também resulte em economia para os cofres públicos. O Ministério da Saúde está negociando parcerias que, se concretizadas, fornecerão por ano R$ 850 milhões em medicamento ao SUS, com redução de R$ 150 milhões nos custos. "O público se junta com o privado, que transfere tecnologia para o público e o Ministério garante o mercado para os itens produzidos", conta o secretário. Embora o Brasil dificilmente consiga ser líder mundial na indústria de medicamentos por síntese química, poderá seguir a rota do futuro nessa área, que é a biotecnologia, prevê Guimarães. "Temos condições de pegar esse bonde mais recente e, enquanto isso, melhorar nossa posição na indústria tradicional", conclui.

Liliana Lavoratti

Mudança lenta

Por que o Brasil não se insere internacionalmente em mercados de maior intensidade tecnológica e mais rentáveis, com uma pauta de exportações menos centrada em produtos básicos? O que impede o País de renovar a estrutura de sua indústria e, com isso, proporcionar uma dinâmica de excelência internacional e obter resultados com alto valor agregado? Essas são algumas das interrogações do setor produtivo e do governo quando tratam do desenvolvimento da produção nacional e da balança comercial - e, de maneira mais ampla, do futuro que está sendo construído agora para os brasileiros.

"Estamos avançando na direção correta, mas a mudança é lenta. Não se consegue modificar a pauta de inserção internacional da noite para o dia. É preciso, porém, considerar que o Brasil exporta soja, mas também exporta avião e essa diversidade é importante. Temos de continuar vendendo grãos para o resto do mundo e ao mesmo tempo ampliar os itens com maior intensidade tecnológica", afirma João Alberto de Negri, técnico do Ipea. Entretanto, o fato é que o País investe menos do que deveria em ciência, inovação, pesquisa e desenvolvimento.

De Negri observa que todos os países desenvolvidos e emergentes, com presença marcante de bens de alta densidade tecnológica no mercado internacional, galgaram essa posição em decorrência de políticas públicas voltadas ao aumento de competitividade. Não é à toa que pesquisa e desenvolvimento (P&D) são altamente subsidiados em países desenvolvidos. Para se ter uma ideia, metade de tudo o que as empresas da Europa e Estados Unidos investem em pesquisa e desenvolvimento é financiada pelos respectivos governos. No Brasil, o governo entra com apenas 5%. O restante depende das empresas.

"Isso mostra que, para nos inserirmos em mercados de maior valor agregado e gerar postos de trabalho mais bem remunerados, temos de investir mais na cultura da inovação", afirma o técnico. Ele lembra que investimentos em máquinas e equipamentos também conduzem a um processo de inovação na malha industrial. "Infelizmente, apesar de várias iniciativas adotadas nos últimos tempos no âmbito governamental, ainda falta uma política mais agressiva nesta direção", constata.

De acordo com dados oficiais de maio de 2008, o País aplica 0,51% do Produto Interno Bruto (PIB) em P&D, o equivalente a R$ 11,9 bilhões. Entre 2000 e 2005, a participação do investimento privado em P&D no PIB cresceu 46%, segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Foi a partir de 2006, por exemplo, que o foco da inovação tecnológica começou a ganhar destaque nos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Naquele ano, as nove linhas de crédito voltadas especificamente para inovação - entre elas o Criatec e o Profarma Inovação - totalizaram R$ 105,6 milhões. Em 2007, passaram para R$ 315,6 milhões, alcançando a cifra de R$ 572,8 milhões ano passado.

Segundo a chefe do Departamento de Políticas de Planejamento do BNDES, Helena Tenório, a instituição financia da pesquisa para desenvolvimento de produtos de última geração até a produção e exportação desses bens. "Nesses financiamentos, as condições de juro, prazo e pagamento são melhores conforme o grau de valor agregado incorporado ao processo produtivo", ressalta Helena. Segundo ela, em breve o banco começará a implementar um novo conceito de inovação nas linhas de crédito. "Em vez de olhar um projeto, como foi até agora, vamos olhar a capacidade da empresa de investir em aumento da capacidade de inovação", explica. Nesse novo conceito, a avaliação das empresas engloba também os ativos intangíveis - como capital humano e outros recursos diretamente relacionados à inteligência na produção.

Educação e tecnologia. Receita de sucesso

Aperfeiçoar aquilo em que o País já é altamente competitivo - produtos intensivos em mão-de-obra e recursos naturais - e ocupar espaço em mercados internacionais, onde a tecnologia é o padrão de competição entre as empresas, não vai acontecer por milagre, nem por obra simplesmente do mercado. E a política educacional teria de ser vinculada a uma política de desenvolvimento, com menos filósofos e historiadores e mais engenheiros e bioquímicos.

Para Alessandro Teixeira, presidente da Apex, as empresas brasileiras já buscam vários caminhos para acompanhar as tendências do futuro. Um deles é a biotecnologia. "Daqui a pouco tempo, o consumidor poderá comprar algodão natural colorido, sem risco de alergias. Várias indústrias estão nessa rota e dentro de alguns anos isso vai se refletir na nossa pauta de exportações", ressalta. Para pavimentar essa estrada, é necessário galgar várias etapas, a começar pela mudança na legislação tributária, cuja complexidade acaba punindo produtos com cadeia de produção mais longa.

A Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada há um ano, é uma novidade em termos de tentativa de coordenação entre ministérios e agências governamentais para subordinar as medidas de apoio à indústria aos planos de longo prazo estabelecidos com os empresários. Segundo o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Reginaldo Arcuri, a maior agregação tecnológica à produção nacional é o objetivo final das metas da PDP para 2010 - ampliação do investimento fixo em relação ao PIB (21%), incremento de gastos privados em P&D (0,65% do PIB), aumento da participação brasileira no comércio exterior (1,25% do comércio mundial, contra 1,18%) e elevar para 10% o número de micro e pequenas empresas no mercado exportador.

Na avaliação da Fiesp, um dos maiores desafios da PDP será a articulação e gestão de cerca de 200 instrumentos espalhados por 13 ministérios, três bancos públicos, sete agências reguladoras e oito instituições (Sistema S, Federações). "Esta foi uma das maiores falhas da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE). Nesta segunda versão da política industrial, embora tenha ocorrido avanço, o resultado do exercício da articulação institucional realizado pelo governo para desenvolver os programas estruturantes, como, por exemplo, o PAC, tem deixado a desejar, revelando-se um tema que deve ter muita atenção do governo e da sociedade", afirma o documento "Avaliação da PDP".

Na área estatal, as iniciativas serão articuladas no Fórum das Estatais Federais sobre Inovação, que será lançado em breve pelo governo. Segundo o técnico do Ipea Danilo Santa Cruz Coelho, um dos objetivos específicos do fórum é promover estudos sobre a dinâmica da inovação tecnológica nas empresas estatais e sua difusão para o restante da economia. "Ano passado fizemos no Ipea um estudo sobre o impacto dos financiamentos do BNDES na produtividade das empresas. Agora, estamos com um grande projeto de pesquisa sobre o impacto da Petrobras no desenvolvimento tecnológico no Brasil. Um dos objetivos específicos desta pesquisa é analisar os transbordamentos tecnológicos da Petrobras sobre os seus fornecedores", explica.

A Embrapa também está fazendo estudos parecidos e no futuro esses resultados deverão ser disseminados, diz o diretor do Departamento de Coordenação e Controle das Empresas Estatais do Ministério do Planejamento, Murilo Barella, que coordena o fórum. "Vamos estimular os fornecedores das estatais a adotar as práticas de sucesso voltadas ao estímulo da inovação tecnológica, bem como transpor para outros segmentos da economia aquilo que deu certo nas empresas públicas, resguardados os direitos dos sócios das estatais com ações em bolsas", ressalta.


Comércio exterior

Mais commodities, menos industrializados

Volume exportado teve pequena queda no ano passado, mas o valor de divisas foi maior

Mais da metade das exportações brasileiras neste ano foi de produtos básicos: de janeiro a abril, as vendas de commodities representaram 51% do total exportado pelo País. "A crise internacional parece ter acentuado uma das principais características da pauta de comércio exterior brasileira: sua elevada concentração em commodities e em produtos de menor intensidade tecnológica", constata o boletim Radar: Tecnologia, Produção e Comércio Exterior, lançado no início do mês pela Diretoria de Estudos Setoriais do Ipea, na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Antes da crise, o peso das commodities no total exportado pelo Brasil vinha aumentando gradativamente, de 39% para 43%, entre 2004 e 2008. Historicamente, em torno de 40% das vendas externas brasileiras são em produtos básicos. Nos primeiros quatro meses de 2009, a taxa saltou para 51%. "A gente nunca chegou a uma mudança dessa magnitude", afirma Fernanda de Negri, diretora adjunta de Estudos Setoriais.

Já as vendas de produtos industrializados perderam peso na pauta de exportações, com destaque para os de média tecnologia (queda de 19% para 16%, entre 2004 e 2008), e produtos intensivos em mão-de-obra (queda de 12% para 7%, no período). Para Fernanda de Negri, a queda se deve à retração da economia mundial, que passou a demandar menos produtos devido à crise internacional, mas a apreciação do real frente ao dólar pode ter contribuído para a redução das exportações de produtos industrializados.

No estudo, Fernanda e Maria Cristina Passos mostram uma outra questão relevante: o aumento da participação das commodities no total exportado decorre, em grande parte, da alta dos preços no mercado internacional, e não do crescimento do volume de vendas - houve ligeira queda na quantidade vendida no ano passado. Devido ao aumento de preço, a participação do Brasil no comércio mundial teve uma leve alta, ressalta Fernanda de Negri. Entretanto, a queda no volume exportado pode ser indício de perda de competitividade da economia brasileira, se outros países tiverem aumentado suas vendas.

O ganho com a exportação de commodities, ressalta Fernanda, no curto prazo é bom para o Brasil, porque ajuda na sustentabilidade do balanço de pagamentos. As vendas têm sido sustentadas pela China, que continua importando commodities do Brasil, enquanto outros países reduziram a demanda. Nos cinco primeiros meses deste ano, as exportações brasileiras para a China cresceram 34%. Como outros países compraram menos, o total exportado pelo País no período caiu 23%.

Embora no momento seja necessário, o aumento das exportações de produtos básicos é indesejado. "Esse movimento é o oposto ao que o País precisa no longo prazo, que é diversificar sua pauta de exportações a partir da ampliação da participação de produtos mais intensivos em tecnologia", afirmam as técnicas do Ipea.

Exportação

Indicador de dinamismo da economia


As exportações chinesas cresceram, em média, 17,9%, entre 1995 e 2004. As da Índia, 12,1%. Já as brasileiras ficaram em apenas 8,8%. A alta de crescimento das vendas externas da China e Índia mostram o dinamismo dessas economias, de acordo com o livro Trajetórias Recentes de Desenvolvimento, publicado pelo Ipea, e que motivou a realização de um seminário no mês passado sobre a reação da China, Índia, Estados Unidos, Finlândia, Argentina, África do Sul, Alemanha, México, Espanha e Rússia à crise internacional.

"O tipo de inserção dos diferentes países no comércio internacional reflete, em certa medida, as estratégias de desenvolvimento produtivo adotadas", afirma a publicação. China, Índia e México, por exemplo, estabeleceram como meta o aumento das exportações de manufaturados: em 2005, 91,9% do total exportado pela China já eram produtos industrializados , 70,3% na índia e 77,1% no México. Embora tenha elevado as vendas de manufaturados nos últimos anos, o Brasil ainda está bem atrás dos concorrentes: 53,9% das exportações brasileiras, em 2005, eram de produtos industrializados. Com a crise internacional, a taxa está em queda.

O livro mostra também que os Estados Unidos, Finlândia e Alemanha são os maiores exportadores de produtos de alta tecnologia (25,8%, 21% e 14,2% das vendas externas, respectivamente). Entre os países em desenvolvimento, destacamse a China, com 28,1%, e o México, com 15,1%, enquanto no Brasil a taxa é de 6,8%. Embora sejam exportadores de produtos industrializados, os produtos vendidos pela Índia e pela Espanha têm baixo conteúdo tecnológico (3,8% e 5,6% das exportações, respectivamente).

Estados Unidos, Finlândia e Alemanha chegaram a esse resultado a partir de vultosos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Em 2004, a Alemanha destinou 2,5% do seu Produto Interno Bruto (PIB) à ciência e tecnologia, e a Finlândia, 3,5%, enquanto o Brasil investe em torno de 1%. "Poucos países no mundo sofreram transformações tão radicais em tão pouco tempo quanto a Finlândia", escreve Glauco Arbix, professor da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente do Ipea, que assina um dos estudos publicados no livro em conjunto com Joana Varon, aluna de mestrado da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

E menos de 30 anos, a Finlândia eliminou a pobreza em seu território, investiu em educação, desenvolveu-se e inseriu-se na economia internacional como uma "das sociedades mais avançadas do planeta". A produtividade, de US$ 22.173, e a renda per capita no país, de US$ 35.280, estão entre as mais altas. Em 2005, a produtividade brasileira era de US$ 5.812, quase quatro vezes menor. A produtividade do Brasil está mais próxima da registrada pela China e abaixo dos valores da Argentina e México. "A variação da produtividade no Brasil (4,7%) é muito baixa ao longo dos 25 anos (1980 a 2005). Enquanto nos países desenvolvidos, e muito em especial na Finlândia, a produtividade por hora aumenta de modo considerável: cerca de 45% na Alemanha, mais de 50% nos Estados Unidos e Espanha, e quase 100% na Finlândia", afirma o livro.

 

 
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