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Petróleo - Crise e dilemas

2011 . Ano 8 . Edição 66 - 27/07/2011

Foto: Gilberto Maringoni

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Gilberto Maringoni – de São Paulo

País caribenho enfrenta fortes oscilações econômicas por sua dependência em relação à produção petroleira. Qualquer projeto de desenvolvimento depende de forte intervenção estatal

A Venezuela é o sétimo produtor mundial de petróleo, com reservas da ordem de 78 bilhões de barris, segundo a Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep). O produto alcança cerca de 70% dos valores totais das exportações do país. Ele não é apenas o motor da economia, como o centro da maioria das disputas políticas locais ao longo do século XX.

A Venezuela vive do petróleo desde os anos 1920, quando teve início a exploração comercial das imensas reservas situadas ao redor do lago Maracaíbo, na região noroeste. Isso pareceu dar ao país a condição, classificada pelo historiador Eric Hobsbawm, em A era dos extremos, de viver como se tirasse um bilhete de loteria premiado todos os dias.

Embora os números sejam aproximados, a cadeia produtiva do petróleo emprega direta ou indiretamente cerca de 100 mil pessoas, diante de uma população de 29 milhões de habitantes em 2010, segundo estimativa do Instituto Nacional de Estatística.

Diferentemente, por exemplo, da cultura cafeeira no Brasil, entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século seguinte, o petróleo tem um efeito multiplicador relativamente pequeno na sociedade.

O café teve a característica de organizar todo um subsistema econômico de negócios ligados à exportação, como obras de infraestrutura, casas de financiamento, incentivos à comercialização, armazenamento, embalagem, expedição e navegação. A crescente complexidade dos negócios criou uma teia de vínculos entre o setor produtivo rural, os agentes de comércio nas cidades e o sistema portuário. Foi através do excedente gerado pela produção do grão que se criaram condições para o advento dos dois primeiros ciclos industrializantes no país, entre 1890 e 1930.

No caso do petróleo, a difusão de riquezas pela economia acontece em escala muito menor. Desde os primeiros tempos de exploração na Venezuela, o ingresso de recursos é feito sob a forma de royalties lançados diretamente nos cofres do Estado. A ação deste passaria a ser cada vez mais decisiva como indutor e investidor da atividade econômica. Mesmo quando as atividades de refino começaram a ser realizadas internamente, a economia petroleira, como na maior parte dos países produtores, ficava ilhada em uma economia com escassas opções de investimento e com mercado interno diminuto e inelástico. A renda da exportação não se desdobrava assim em um desenvolvimento significativo.

SUBDESENVOLVIMENTO E CAPITAL O que seria o passaporte seguro para uma rota de desenvolvimento faz também a Venezuela apresentar “todas as características estruturais de uma economia subdesenvolvida”, como classificou Celso Furtado em Ensaios sobre a Venezuela, subdesenvolvimento com abundância de divisas (Editora Contraponto), escrito em 1957.

Furtado detecta que o modelo, ao mesmo tempo em que embutia uma vertente otimista, de possibilitar um grande salto adiante rumo ao desenvolvimento, exibia grande fragilidade. Caso não fossem alterados seus pressupostos básicos, ele não pararia em pé.

Tal avaliação é clara em suas palavras:

“É interessante observar que o desenvolvimento venezuelano, ainda que se apresente em termos muito diferentes do usual das economias latino americanas, criou problemas que exigem soluções correntes nessas economias. Com efeito, na quase totalidade das economias latinoamericanas, os problemas mais fundamentais são escassez relativa de capital e reduzida capacidade para importar. (...) Na Venezuela a situação é praticamente oposta: o sistema tende a afogar-se em excesso de capacidade para importar e de recursos financeiros. Mas esse mesmo processo de afogamento criou o desequilíbrio fundamental entre o nível médio da produtividade e o dos salários monetários – em relação aos países que concorrem no mercado venezuelano. Este desequilíbrio está na raiz do que chamamos as ‘peculiaridades’ do desenvolvimento da economia deste país”.

Para além das questões estritamente econômicas, vale lembrar que o fluxo constante da riqueza petroleira moldou a face política, social e cultural daquela parte do mundo.

O petróleo serviu para elevar o ingresso per capita, apesar da enorme disparidade de renda na sociedade, para melhorar os serviços públicos nos períodos de alta internacional dos preços – especialmente Entre 1974 e 1979, o barril ficou 12 vezes mais caro.

Apesar da prosperidade daqueles anos, a Venezuela viveu uma crise política e social profunda a partir de 1983, quando os preços do petróleo tiveram uma queda acentuada no mercado internacional.

Internamente, a crise foi agravada por sérios desequilíbrios fiscais e pela disparada da dívida pública, multiplicada por dez entre 1974 e 1978. A carga tributária venezuelana não alcançava 10% do PIB e o Estado era financiado em larga escala pela renda petroleira. O aumento dos juros internacionais e a quebra do México e do Brasil, no bojo da longa crise da dívida externa que atingiu vários países periféricos nos anos 1980, completavam o mosaico de turbulências.

Foi o início de um longo ciclo de baixa, que perdurou por quase duas décadas. Como consequência, a convivência social, organizada em torno da renda petroleira, entrou em parafuso. Um cataclismo se avizinhava.

CRISE E RUPTURA A situação no final dos anos 1980 era preocupante. Como resultado da queda dos preços internacionais do petróleo, as reservas do Banco Central, que em 1985 alcançavam 13,75 bilhões de dólares, despencaram para 6,67 bilhões de dólares em 1988. A inflação alcançava 40,3% ao ano, o desemprego chegava a dois dígitos e o salário real havia despencado. Uma aguda fuga de capitais completava o quadro.

Foto: Ricardo Stuckert

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Presidentes Lula e Chávez em encontro na região do Orinoco. Comércio bilateral se multiplicou por sete em seis anos

Em 4 de dezembro de 1988, Carlos Andrés Pérez foi eleito presidente da República pela segunda vez. Seu mandato, entre 1974 a 1979 coincidira com o período de alta nos preços do petróleo. Mais do que ninguém, o líder do partido Ação Democrática personalizava a prosperidade vivida na década anterior.

Contrariando as expectativas, Pérez foi à televisão com ar grave na noite de 16 de fevereiro de 1989. Ele dirigia-se ao país para anunciar que o governo havia firmado um memorando com o Fundo Monetário Internacional. O objetivo era a liberação de um empréstimo de 4,5 bilhões de dólares. A contrapartida, concretizada no dia 25, um sábado, era salgada: o pacote incluía a desvalorização da moeda nacional, a redução do gasto público e do crédito, liberação de preços, congelamento de salários e aumento dos preços de gêneros de primeira necessidade. A gasolina sofreria um reajuste imediato de 100%. Isso resultaria, segundo anunciado, numa majoração de 30% nos bilhetes de transporte coletivo. Na prática, esses reajustes chegaram também a 100%. Nada disso havia sido ventilado durante a campanha.

Antes das 6 horas da manhã da segundafeira, dia 27, começaram os primeiros protestos. Ao longo daquele dia e dos subsequentes, a rebelião tomou as ruas de Caracas e de outras cidades. Saques, barricadas e enfrentamentos com as forças de segurança compuseram uma semana violenta e sangrenta. Familiares e grupos de direitos humanos conseguiram apurar um total de 396 vítimas fatais. Os feridos contavam-se aos milhares e era quase impossível estimar os prejuízos materiais. Os centros médicos contabilizaram entre 1 mil e 1,5 mil mortos.

O evento ficou conhecido como Caracazo e encerrou um ciclo histórico. Quebrou-se ali um pacto político, alicerçado no preço do petróleo e que havia possibilitado a convivência entre dois partidos de centro-direita e a exclusão dos setores populares da disputa política, sem que a alternância no poder e os aspectos formais da democracia liberal fossem colocados em questão.

A Venezuela encerrou aquele ano com uma queda de 8,1% no PIB e uma taxa de inflação de 81%. A parcela da população que vivia abaixo da linha de pobreza aumentou de 15% no fim de 1988 para 45% dois anos depois. Até o final de seu mandato, Pérez eliminaria as regulamentações bancárias, acabaria com a maior parte dos controles de preços, privatizaria a companhia telefônica nacional (Cantv), o sistema de portos, uma importante linha aérea (Viasa), e abriria a indústria petroleira e outros setores estratégicos ao capital privado.

Quebrou-se, em fevereiro de 1989, a imagem que os venezuelanos faziam de si mesmos. Segundo ela, o país seria um modelo de democracia e tolerância no continente, com eleições regulares, instituições, direitos civis, partidos com sólidas bases sociais etc. Os canais de mediação de demandas entre a população e o Estado (partidos políticos e sindicatos), que durante décadas resolveram conflitos variados, mostraram-se inúteis quando a crise se tornou irreversível. A engrenagem política que sobreviveu ao Caracazo perdeu grande parte de sua legitimidade.

Pérez seria tirado do poder em 1992, após uma batalha judicial, motivada por denúncias de corrupção. O mandato seguinte, de Rafael Caldera, um velho líder social cristão, não consegue estabilizar a economia.

TENTATIVAS DE MUDAR O MODELO Quando vence as eleições, em 6 de dezembro de 1998, Hugo Chávez se vê diante de uma sociedade esgarçada e sem referenciais institucionais com credibilidade. O ex-coronel havia ganhado notoriedade seis anos antes, ao liderar uma fracassada sublevação militar contra o governo Pérez. O país se arrastava em um caos econômico de proporções gigantescas, que gerou em sua esteira uma aguda crise social, política e institucional.

Após enfrentar uma tentativa de golpe em 2002 e a oposição frontal dos meios de comunicação, Chávez valeu-se dos preços internacionais excepcionalmente altos do petróleo, entre 2004 e 2008, para legitimar seu mandato. Decidiu ampliar programas sociais, fortalecer o poder de intervenção do Estado, estatizar empresas antes privatizadas e dar impulso a sua agenda internacional. Sua ação interna se mostra caudatária de uma espécie de desenvolvimentismo petroleiro.

Há pelo menos cinquenta anos a Venezuela busca diversificar sua economia. O governo tentou, em 1956, instalar um complexo siderúrgico no estado Bolívar, no centro do país, como forma de incentivar uma indústria automobilística. Algumas montadoras vieram, animadas pelo ciclo altista do petróleo, entre os anos 1970 e 1980. Mas as tentativas de industrialização não tiveram muito fôlego. Com petrodólares inundando a economia, sempre foi mais vantajoso importar produtos industrializados do que incentivar a fabricação nacional. Mesmo a produção agrícola é incipiente. A Venezuela compra carne, aves, leite e frutas de seus vizinhos.

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Caracas é um retrato acabado das marchas e contramarchas do país. Um intenso processo de urbanização e modernização culminou com uma prosperidade fulgurante a partir da década de 1970. As classes médias e altas passaram a ostentar um padrão de vida inigualável por qualquer outro país latino-americano: viagens internacionais, apartamentos em Miami, consumo desenfreado de bens importados e a sensação de que haviam finalmente transposto os umbrais do decantado “primeiro mundo”.

Ao longo da última década, Chávez conseguiu colocar a indústria petroleira sob o domínio do Estado. No entanto, ainda não logrou mudar totalmente a lógica rentista, diversificando cadeias produtivas e buscando industrializar o país. A tarefa não depende exclusivamente de um presidente ou de um governo. Tem a ver com o lugar reservado ao seu país no contexto internacional.

Um país rico, lastreado em uma única fonte de riquezas, escassamente industrializado, com uma agricultura atrasada e incapaz de abastecer o mercado interno e com alta concentração de renda e propensão para importar em larga escala. Guardadas as nuances, são essas as características da economia venezuelana há pelo menos meio século. E que dependerá de uma decisiva ação do Estado para mudar essa situação.

 
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