2012 . Ano 9 . Edição 71 - 08/05/2012
Carlos Tautz, João Roberto Pinto e Maíra Fainguelernt
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Em relação à Copa de 2014, cabe ressaltar o papel desempenhado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que é, de acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria Geral da União (CGU) e o Ministério Público Federal (MPF), o terceiro maior investidor direto nas obras relativas ao evento, estando atrás da Caixa Econômica Federal e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero).
Segundo o TCU1, o BNDES seria responsável por fornecer créditos no valor de aproximadamente R$ 5 bilhões dos R$ 23,4 bilhões previstos. O Tribunal divulgou que a cargo do banco estariam os financiamentos às obras dos estádios em 12 cidades-sede2 e uma única obra de mobilidade urbana, a BRT Transcarioca, via planejada para facilitar o deslocamento do Aeroporto Internacional Tom Jobim para a Penha e a Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
A linha do banco para reforma e construção de hotéis, que pode chegar a R$ 2 bilhões, e o compromisso com o financiamento de até 80% dos investimentos com a privatização dos aeroportos, dão indícios de que a participação do BNDES seja muito maior do que a levantada até agora por órgãos oficiais e que a instituição se configure na maior financiadora da Copa.
Daí a importância da prestação do contas pelo BNDES à sociedade. De um lado, as informações disponibilizadas são insuficientes, contrariando o princípio constitucional da publicidade e a recém-aprovada Lei 12.527/2011, que regulamenta o acesso à informação no Brasil. De outro, a política socioambiental do Banco é negligente em salvaguardar riscos de violações de direitos associados aos projetos que financia e que têm se concretizado em casos de remoção por conta de obras da Copa. A lei ambiental no Brasil é clara ao prever a responsabilidade solidária do agente financiador com riscos associados à atividade econômica por ele financiada.
Outro ponto refere-se aos riscos de superfaturamento, também já concretizados nas obras dos estádios do Maracanã/RJ, Mané Garrincha/DF e Manaus/AM. Por conta destes casos, o TCU instou o banco a estabelecer cláusulas contratuais no sentido da suspensão ou glosa do financiamento quando o sobrepreço fosse constatado.
Esta inoperância do banco é ainda mais preocupante, considerando a sanção, em agosto do ano passado, da Lei nº 12.462/2011, que institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas para as obras relativas aos megaventos. O Procurador Geral do MPF afirmou a inconstitucionalidade da referida Lei. Segundo nota técnica do Grupo de Trabalho da Copa do MPF, a nova Lei vai de encontro à Constituição Federal, não garante a igualdade de concorrência nas licitações, apresenta “cláusulas intoleravelmente abertas” e ainda não assegura as exigências que fazem parte de todo processo de licenciamento ambiental no país.
A sobreposição do direito privado sobre o público que vem se verificando nos preparativos dos jogos encontra sua consumação no projeto da Lei Geral da Copa, aprovado pela Comissão Especial da Câmara. Tal projeto reconhece e se submete aos interesses dominantes da FIFA, desrespeita a legislação brasileira e abandona o projeto de um legado social significativo para o país. Os Comitês Populares da Copa e o Instituto Brasileiro de Defesa ao Consumidor (IDEC) lançaram a campanha “Fifa baixa a bola” e afirmaram que, se aprovada, a lei “transforma o País do futebol num lugar de monopólio da Fifa, violação de direitos e repressão contra cidadãos brasileiros”.
No caso do BNDES, importa chamar a atenção dos gestores públicos e da população para a necessidade imperiosa do banco assumir sua responsabilidade pública, não apenas evitando, por meio de seus contratos, que violações de direitos sejam acarretadas pelos empreendimentos apoiados, mas também promovendo, via novas linhas de financiamento, um efetivo, equilibrado e justo desenvolvimento dos territórios.
___________________________________________________________________________________ Carlos Tautz, João Roberto Lopes Pinto e Maíra B. Fainguelernt são coordenadores de pesquisa do Instituto Mais Democracia – Transparência e controle cidadão de governos e empresas.
1. Os relatórios do TCU podem ser encontrados em: portal2.tcu.gov.br/ Em 19 de setembro, o Senado federal divulgou o relatório “O aumento oficial dos custos das obras da Copa do Mundo FIFA de 2014”, de autoria do assessor parlamentar Alexandre Sidnei Guimarães, apontando um aumento de 28,7% nos custos, para R$ 30,66 bilhões. O aumento se deveu ao recálculo do custo das obras e à inclusão de mais três projetos, a se localizarem em Belo Horizonte (MG), no âmbito do PAC Mobilidade Grandes Cidades, orçados em R$ 3,247 bilhões.
2. Programa ProCopa Arenas do BNDES, em http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/ bndes/bndes_pt/Institucional/Apoio_Financeiro/Programas_e_Fundos/ procopaarenas.html.
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