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A hegemonia planetária dos Estados Unidos está em declínio?

2012 . Ano 9 . Edição 72 - 15/06/2012

Foto: Gilberto Maringoni

Rogério Lessa Benemon – Rio de Janeiro


A crise econômica, as dificuldades nas invasões do Afeganistão e Iraque, os atritos diplomáticos em várias partes do mudo e os obstáculos enfrentados por Barack Obama no Congresso abalaram o prestígio de Washington na arena internacional. Mas a centralidade do dólar, o poderio militar inconteste e a força de sua indústria cultural mostram ser prematuro falar em perda de um poder tido como imperial. Ouvimos três especialistas em Relações Internacionais sobre o tema. Todos são unânimes em um ponto: não há resposta fácil para a questão

A pesar de a maior crise estrutural do capitalismo em 80 anos ter se iniciado nos Estados Unidos e de a Casa Branca enfrentar problemas diplomáticos em diversas regiões do planeta, a pergunta do título desta matéria não tem resposta fácil. Os EUA mantêm incomparável poderio militar, que ganhou peso relativo desde a extinção da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), em 1991, e o dólar segue como moeda padrão internacional e porto seguro para investidores com elevada aversão ao risco.

Apesar das ressalvas, a crescente influência de grupos privados sobre os Estados impõe um risco à soberania de todas as nações, incluindo a mais poderosa delas. Tal cenário, ligado a uma concentração de capital jamais vista, traz apreensão quanto ao que virá no período posterior à crise: o fortalecimento de setores ultraliberais conservadores – que podem aumentar a tendência a ações unilaterais no plano externo – ou um espaço maior para uma diplomacia que respeite os organismos multilaterais?

QUEDA RELATIVA Para Cristina Pecequilo, doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o império americano começou a viver um declínio ainda na década de 1970. Mas a pesquisadora ressalva: ele não é generalizado e sempre apresenta fases de recuperação. “Um declínio efetivo não acontecerá no curto prazo. Há tendências preocupantes, como no caso do comércio, já que as exportações dependem de uma indústria que trabalha sobre base antiga e enfrenta problemas de produtividade, que eles tentam compensar através de um engajamento maior com países asiáticos e sul-americanos, como o Brasil”, analisa, acrescentando que o presidente Obama procura corrigir rumos e investir em tecnologia. “Ele fez novos acordos, identificou os pontos de estrangulamento. Mas haverá eleições e não sabemos se haverá solução de continuidade nessas diretrizes”, ressalva.

Foto: David M. Grossman

Dia Internacional de Ação: ativistas reunidos em Times Square, Nova York, marcham para a Embaixada da ONU para protestar contra ameaças e sanções ao Irã, em fevereiro último

No plano militar, é praticamente consenso a inexistência de perda de influência. Tullo Vigevani, doutor em História Social pela USP e professor titular de Ciência Política na Universidade Estadual Paulista (Unesp), faz algumas ponderações. De acordo com ele, o conceito de império nesse caso envolve o Estado americano e suas ramificações, como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). “Pensar sobre um possível declínio da hegemonia estadunidense é uma discussão que consome o pensamento universal há pelo menos cinquenta anos. Não se pode dizer com certeza que há uma decadência, mas indícios de problemas, alguns evidentes, como o fato de que, em 1945, a economia dos Estados Unidos representava aproximadamente 40% da mundial e hoje caiu para menos de 20%”. Ele reconhece que “65 anos é muito tempo, mas é evidente que o peso relativo sofreu uma contração”.

Foto: Staff Sgt. Mike Alberts

Forças terrestres dos EUA desembarcam de helicóptero durante invasão do Iraque


Vigevani aponta outros dados a serem considerados, como a capacidade política e o fato de o país ser um centro de referência para muitos outros, inclusive para a China. “Há uma interdependência, não apenas pelas questões comerciais, mas também financeiras”, sublinha. Quanto ao peso militar, o professor da Unesp pondera que todos os países que concorriam com os Estados Unidos também sofreram perda relativa de concorrência militar, ainda que seu potencial esteja em crescimento”.

CAUTELAR NA ANÁLISE O professor do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais (Unesp, Unicamp e PUC) Reginaldo Mattar Nasser também recomenda cautela antes de se afirmar que os Estados Unidos são um império em decadência. Ao mesmo tempo, ele assinala que o país não detém uma hegemonia global total. Segundo Nasser, que é doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP, o poderio relativo dos ingleses no século XIX era maior. “No plano interno, existe relutância de alguns segmentos em exercer o poder imperial. Ou seja, parte da opinião pública dos EUA tem vergonha de ser império e fica com receio quando o Estado começa a agir como tal”.

“Uma coisa é avaliar a atuação dos Estados Unidos na América Latina. Outra é no Oriente Médio. Neste, é complicado falar em hegemonia, principalmente após as revoluções árabes. Somente no Golfo Pérsico ela existe e, mesmo assim, a Turquia se afastou nos últimos anos. Caiu o grande aliado, o Egito. Na África, há uma disputa palmo a palmo com a China”, lista ele. Segundo Nasser, atualmente está ocorrendo mais uma “troca de competidor” do que de potência hegemônica. Se na década de 1970 o contraponto dos Estados Unidos na área econômica era a Europa, no geral, e a Alemanha, em particular, na década seguinte esse papel passou a ser representado pelo Japão. “Hoje, a China dá sequência a essa troca de competidores. Por isso nunca existiu uma predominância absoluta”.

Foto: Acervo pessoal

“Ao analisar as guerras do Iraque
e Afeganistão, verificamos que
havia grupos com interesses
particulares. Por exemplo,
dirigentes militares pressionaram
bastante para o aumento do
contingente no Afeganistão e
dificultaram uma melhor análise
política para a região

Tullo Vigevani,
professor de Ciência Política, da Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp)

GLOBALIZAÇÃO E DESCONTROLE No plano econômico, a globalização ampliou a dificuldade de controle sobre os fluxos financeiros por parte dos Estados nacionais. Cristina Pecequilo aponta para o conceito de “Privatização da República” segundo o qual o Estado norte-americano estaria sendo “fatiado” por grupos privados – entre eles o complexo industrial militar, que incita guerras para lucrar, os lobbies dos agricultores da soja, do milho e produtores de outras commodities, além da indústria farmacêutica.

“Tudo isso corresponde à terceirização de algumas funções do Estado. Eisenhower [Dwight David Eisenhower, presidente dos Estados Unidos, 1953-1961] já alertara, nos anos 1960, sobre o complexo industrial militar. Na Europa e nos Estados Unidos estão também os grandes bancos e conglomerados empresariais. Os políticos precisam dar atenção a eles, caso contrário não obtêm financiamento para suas campanhas”, ressalta.

A professora da Unifesp aponta também reações na sociedade. “A Europa está mostrando que tudo isso precisa de um limite. O cenário certamente contribui para a perda do sentido do que é público. Obama tem um programa de saúde que não consegue tirar do papel. É uma disputa por hegemonia interna, num enfrentamento constante, em detrimento de um projeto nacional”, opina.

TEORIA CONSPIRATÓRIA Vigevani, no entanto, vê nessa abordagem uma dose de “teoria conspiratória”, na qual estaria contemplada a existência de uma capacidade de direcionamento político “não muito realista” por parte dos lobbies. Ele concorda que algumas agências, como o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), por exemplo, têm fortes vínculos com os grupos financeiros. “Vários livros discutem relação entre o Fed e Wall Street, mas, ainda assim, o Fed não pode desconsiderar a política do Estado e as necessidades do conjunto da economia do país”, comenta.

Foto: Patrick Peccatte & Michel Le Querrec

Dwight Eisenhower, presidente dos Estados Unidos entre 1953 e 1961. Em seu governo, os Estados Unidos conheceram o auge de seu poder internacional, derrubando governos, invadindo países e despontando como única superpotência mundial

O cientista político também reconhece o peso dos grupos de interesse no segmento militar ou do petróleo, mas “não seria tão pessimista” em afirmar que eles conduzem a política norte-americana. “Ao analisar as guerras do Iraque e Afeganistão, verificamos que havia grupos com interesses particulares. Por exemplo, dirigentes militares pressionaram bastante para o aumento do contingente no Afeganistão e dificultaram uma melhor análise política para a região”.

“Os interesses da área de
finanças unem democratas e
republicanos. O que separa são
as questões internas, como saúde
e impostos. Porém, cada vez
aumenta mais o consenso em
relação às questões internacionais,
como Irã, Iraque, Israel
e Afeganistão”



Reginaldo Mattar Nasser,
professor do Programa de Pós-Graduação em
Relações Internacionais (Unesp, Unicamp e PUC)

No caso da política ambiental, Vigevani aponta a existência de pressões, particularmente, dos grupos ligados à indústria do petróleo. “Elas são muito fortes e limitam a adesão dos Estados Unidos a acordos sobre meio ambiente. Os fundamentalistas neoliberais, o Tea Party, enfim, as forças mais conservadoras de direita jogam papel muito importante, mas há outras análises que veem nisso uma grande oportunidade de fortalecimento também dos liberais, que nos Estados Unidos equivalem à centro-esquerda, aos segmentos mais progressistas”.

MOVIMENTO PENDULAR O poder dos grupos privados, mesmo que não determinante, influencia, segundo Cristina, um “movimento pendular” na diplomacia de Washington. “Obama está procurando atrair os Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. É uma tendência positiva, que acaba anulada pela reação dos movimentos contrários, tanto da parte dos republicanos, quanto dos democratas mais conservadores, que prejudica a diplomacia”, exemplifica. Ela lembra da negociação sobre a questão nuclear, envolvendo Turquia, Brasil e Irã e do golpe militar em Honduras como exemplos do “movimento pendular”. “Nos dois casos, os Estados Unidos inicialmente apoiaram o Brasil. Obama falou contra o golpe, mas o Departamento de Estado, que não é eleito, emitiu posição contrária dez dias depois. O então secretário de Defesa, Robert Gates, era o mesmo do governo de George W. Bush. São problemas conjunturais que revelam polarização”.

Por sua vez, Nasser destaca que o movimento pendular mostra o quanto é difícil falar em predominância absoluta dos Estados Unidos no plano mundial, mas admite que as decisões militares são conduzidas cada vez mais pelo Pentágono. “Apesar da atuação de lobbies, a decisão de última instância é do Congresso. Os interesses da área de finanças unem democratas e republicanos. O que separa são as questões internas, como saúde e impostos. Porém, cada vez aumenta mais o consenso em relação às questões internacionais, como Irã, Iraque, Israel e Afeganistão”, analisa. O professor de Relações Internacionais observa que empresas de petróleo não comprometidas com políticas de Estado ou com a diplomacia voltaram, por exemplo, a se instalar na Líbia após 2004. Na área militar, segundo ele, existe hoje um controle parcial das empresas de segurança.

Foto: Gregwest98

Edifício do Pentágono, em Washington, onde se abriga o comando das forças armadas dos EUA

PRIVATIZAÇÃO DE AUTORIDADE “São os chamados ‘novos mercenários’. É a segurança privada, não os fuzileiros navais. No Iraque, entre 80 mil e 100 mil homens trabalham para essas empresas”, observa, recordando que a guerra é uma atividade quase tão lucrativa quanto o petróleo. “E os dois setores começam a caminhar juntos na África, por exemplo. É uma privatização grande que passa ao largo das grandes organizações políticas e econômicas”. Nasser é enfático na crítica a empresas privadas de combate. “O serviço sujo é feito por eles, como a tortura. Atuações predatórias que passam ao largo de regulamentações da Organização Mundial do Comércio (OMC), também. Trata-se de um tema novo: a privatização da autoridade internacional”.

Foto: Acervo pessoal

“Um declínio efetivo não
acontecerá no curto prazo.
Há tendências preocupantes,
como no caso do comércio, já
que as exportações dependem de
uma indústria que trabalha sobre
base antiga e enfrenta problemas
de produtividade, que eles
tentam compensar através de um
engajamento maior com países
asiáticos e sul-americanos,
como o Brasil”


Cristina Pecequilo,
doutora em Ciência Política pela USP e professora
de Relações Internacionais da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp)


Já Vigevani, embora concorde quanto à falta de capacidade das elites norte-americanas e do governo para estabelecer diretrizes consequentes, como no caso do Iraque e Afeganistão, não vê o surgimento de uma coalizão internacional antiamericana. “Mesmo os países que fazem críticas importantes, nos mais diversos campos, inclusive de direitos humanos, ambiental, financeiro ou comercial, não estão orientando suas ações para uma aliança desse tipo. Desse ponto de vista, nas décadas de 1950-60 o antiamericanismo era mais forte”.

DEPOIS DA CRISE Em meio a uma crise estrutural de proporções mundiais, não chega a surpreender que o dólar, em vez de perder força, venha se firmando como reserva de valor. Inclusive por causa do enfraquecimento da Zona Euro. Vigevani participou recentemente de um seminário na Universidade da Califórnia, que contou com a presença de asiáticos e discutiu o papel do dólar, do yuan chinês e do yen japonês. “O dólar continua altamente significativo. Outras moedas que poderiam exercer papel de caráter universal não reúnem todas as condições para desempenhá-lo. Ainda que o dólar se debilite e tenha perda de centralidade como moeda de reserva, não há possibilidade de substituição no curto ou médio prazo. Isso dá muita força aos Estados Unidos, único país que ainda tem o poder de emitir uma moeda internacional”.

No entanto, a moeda e a liderança em segmentos como o de tecnologia não são suficientes para garantir aos estadunidenses um cenário harmonioso no póscrise. Nasser vê a democracia muito fragilizada. “Ela se tornou um conceito cada vez mais teórico. Obama condena a forma pela qual tem sido conduzida a guerra contra o terror. Por outro lado, aumentaram as chamadas ações encobertas. Falta controle do próprio governo sobre a atividade do Pentágono. O presidente utilizou mais aviões não tripulados e o número de mortos civis aumentou em relação ao período de George W. Bush. Isso nada tem a ver com as declarações oficiais na ONU", deiz, acrescentando que essa leitura vale não apenas para EUA. 

MUDANÇAS À VISTA? No plano da governaça mundial, Reginaldo Nasser se diz cético quanto ao G20 e outras articulações internacionais. “Há alternâncias, mas não vejo substituição da ordenação mundial, ou seja, apostar em países substituindo outros. Existem problemas internos cada vez maiores, como movimentos de rua na Espanha, na França, ou o velho fantasma europeu da extrema direita, que reaparece principalmente nos períodos entreguerras. Há mobilização de militares em Portugal e Grécia. Nos Estados Unidos, republicanos radicais são ameaça na mesma proporção. Entram na esfera da educação e dos costumes. Na Europa a reação é mais voltada contra os imigrantes”, resume Nasser.

Já Cristina Pecequilo vê a continuação de um “processo de gradual acomodação entre quem cresce e quem está em decadência”. Ela sublinha que tal dinâmica ainda está no começo, enquanto Vigevani não acha provável o surgimento de alterações extremamente radicais no curto e médio prazo. “Claro que o processo histórico está sujeito a surpresas. Não excluo mudanças importantes no cenário internacional e de muitos países, mas no caso de Estados Unidos e Europa o que vemos é dificuldade de dar sequência às políticas. Na Europa, os Estados têm sofrido mudanças nas quais a oposição parece crescer. Onde há governos conservadores, os social-democratas ficam mais fortes e vice-versa. É resultado do descontentamento popular, mas na prática não há uma direção única”.

Foto: Dana Beveridge

Barack Obama tem de se defrontar com a crise econômica, a oposição interna e novos pólos de poder no cenário externo

No caso dos Estados Unidos, o professor da Unesp observa um quadro semelhante, no qual a “extrema radicalização” de grupos importantes do Partido do Republicano acabam por fortalecer as posições do presidente Obama. “Portanto, pensar que o mundo vai numa direção seria precipitado, ainda que mudanças possam acontecer. Se a crise perdurar por vinte anos, por exemplo, algumas tendências serão fortalecidas, tanto à direita, quanto à esquerda. O campo está aberto”, finaliza.

 
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