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História contada por jornalistas

2012 . Ano 9 . Edição 75 - 28/12/2012

Foto: Gil Leonardi

Ana Luiza Campreghere Pedro Henrique Lutti Lippe – de São Paulo

O sucesso de livros e revistas sobre história do Brasil abriu um expressivo nicho no mercado editorial nos últimos anos. Obras como 1808, de Laurentino Gomes, e A viagem do descobrimento, de Eduardo Bueno, venderam centenas de milhares de cópias. Mas persiste um debate entre historiadores e profissionais de imprensa sobre rigor metodológico e linguagem acessível nessas obras

Desde o lançamento do livro 1808, do jornalista Laurentino Gomes, em 2007, mais de 1,2 milhão de cópias deste e de sua sequência, 1822, foram comercializados. Ambos ficaram por meses nas listas dos mais vendidos em todo o Brasil. O mesmo se deu com A Viagem do Descobrimento (1998), Náufragos, Traficantes e Degredados (1998) e Capitães do Brasil (1999), do também jornalista Eduardo Bueno. Até 2006, cerca de 500 mil exemplares haviam sido vendidos.

São apenas dois casos. Mas eles mostram a existência de um nicho crescente no mercado editorial: livros com viés jornalístico sobre a história do Brasil conhecem sucesso surpreendente. Além deles, revistas de divulgação histórica abrem uma janela de oportunidades em meio a vendas declinantes de materiais impressos em bancas de jornal.

A tendência suscita algumas questões: que motivos levam um público leigo a buscar mais informações sobre o passado e o que isso significa na produção acadêmica e não acadêmica?

Foto: Tiana Chinelli

“Os brasileiros estão olhando
 para o passado em busca de
explicações para o país de hoje.

Uma sociedade que não estuda
história não consegue entender
a si própria
porque desconhece
as razões
que a trouxeram até
o presente”


Laurentino Gomes,

jornalista e escritor

MELHORIA DA AUTOESTIMA O professor e historiador Mauricio Cardoso, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), acredita que vendas em alta resultam de um processo de melhoria da autoestima do brasileiro. “Isto tem a ver com a visibilidade maior do país no exterior e com a diplomacia mais afirmativa dos últimos anos,” afirma. “O fenômeno está ligado também a um aumento no poder aquisitivo real – há uma classe média em expansão – e à melhoria, ainda que pequena, dos níveis de escolaridade. Isso eleva a demanda por diversos produtos, entre eles livros e revistas”. Mas por que se lê esses livros e não os outros? Para Cardoso, há uma nova expectativa otimista do brasileiro em relação à sua própria história.

Marcos Antonio da Silva, também professor da FFLCH-USP, acredita por sua vez que o interesse pelo passado não seja apenas um fenômeno brasileiro. “Essa crescente onda de publicações com temas nacionais também acontece na França, por exemplo, desde os anos 1970-80. Por aqui, esse interesse aumentou na academia desde o final da ditadura, ou seja, a partir da segunda metade dos anos 1980.

Para ele, o livro Olga, de Fernando Morais (1985), é um bom exemplo da produção historicista da época. Havia a necessidade de se descobrir uma história que permaneceu oculta por décadas, como a da deportação da esposa de Luís Carlos Prestes para a Alemanha nazista, por iniciativa do primeiro governo de Getulio Vargas. Pouca gente se lembrava disso, e Morais teve o mérito de tornar o caso acessível a milhares de pessoas. A versão cinematográfica da obra, de acordo com a página do autor na internet, foi “vista por mais de cinco milhões de espectadores e indicada para representar o Brasil no Oscar de 2005”.

Se os especialistas se debatem, o jornalista Laurentino Gomes, diagnosticou o interesse do brasileiro por suas produções e de seus colegas através do que chama “curiosidade e ânsia de progredir”. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, em agosto de 2011, ele disse: “Os brasileiros estão olhando para o passado em busca de explicações para o país de hoje. Uma sociedade que não estuda história não consegue entender a si própria porque desconhece as razões que a trouxeram até o presente”.

Foto: Reprodução

A conquista dos campos de Garapuava, Joaquim José de Miranda, guache e aquarela, século 18. Uma polêmica envolve os livros de história escritos por jornalistas: apesar da larga difusão, alguns especialistas apontam falta de profundidade na análise de processos históricos complexos

CRESCIMENTO E RENDA A elevação da autoestima nacional pode ter relações com a volta do crescimento econômico e uma tímida, porém real, distribuição de renda, ocorrida entre 2006 e 2010. Há também a sensação de que o Brasil teria deixado de ser “o país do futuro”, ou seja, uma promessa cuja realização sempre fica para mais adiante.

Foto: Acervo pessoal

“Acredito que a universidade criou essa
ideia de que a estética é bobagem, de
que quando você não tem conteúdo
você põe
forma. Se o livro não é bom
então você põe bastante figura.
Eu acho isso um absurdo”

Maurício Cardoso,

historiador e professor da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo (FFLCH-USP)

Com um discurso menos otimista, o professor e historiador Elias Thomé Saliba, também da USP, classifica o interesse na história como resultado da crise das identidades sociais disseminada pelo planeta pós-globalização. “A aceleração das mudanças tecnológicas vem provocando uma mudança na forma de se experimentar o tempo e um medo de perder as referências do passado”. Saliba acredita que, “na ânsia de encontrar algo seguro que dê sentido à vida presente, vamos com muita sede ao pote em direção ao passado. Hoje há uma obsessão angustiada de nossas sociedades em retirar dali lições para se entender e viver o presente”.

DESENVOLTURA COM A ESCRITA Outra opinião sobre o interesse do público brasileiro em obras históricas é dada pelo jornalista e editor do selo Três Estrelas, do Grupo Folha, Alcino Leite Neto. Para ele, o fenômeno se justifica com a decisão de editoras, jornalistas e mesmo de alguns historiadores, como Mary Del Priore, autora do livro Uma Breve História do Brasil, lançado em 2010, de dar tratamento jornalístico a temas antes restritos aos meios acadêmicos. “Sempre houve interesse dos brasileiros pelo Brasil. O que não havia antes, ou havia pouco, eram muitos livros ou autores dispostos a recontar a história do país com uma linguagem acessível e interessante para a maioria. A universidade brasileira, onde estão as pessoas mais gabaritadas para fazer esse trabalho de difusão, infelizmente, não prepara os alunos para realizarem obras deste tipo, que exigem uma grande desenvoltura com a linguagem escrita”, opina ele.

Nesse ponto, o professor de História Maurício Cardoso tende a concordar com o discurso de Leite Neto. Há uma noção, segundo ele, nascida no próprio âmbito acadêmico, de que a preocupação com a estética do texto não precisa andar lado a lado com bom conteúdo. “Acredito que a universidade criou essa ideia de que a estética é bobagem, de que quando você não tem conteúdo você põe forma. Se o livro não é bom então você põe bastante figura. Eu acho isso um absurdo”, explica. Em sua percepção, estudantes de história e até mesmo profissionais já formados na área precisam se voltar para expoentes como o inglês Eric Hobsbawm e o brasileiro Nicolau Sevcenko, que uniram fluidez de texto e rigor científico em suas obras.

Foto: Divulgação

“Um historiador tem uma
preocupação muito bem
estabelecida com o tempo
e o espaço. Ele não comete
anacronismos. Um trabalho que
se preocupe com tudo isso será
mais difícil de ser lido do que
a produção de um jornalista.
Não que este não tenha
qualidade. Mas o compromisso
do jornalista com a história é
diferente”


Maria Ligia Coelho Prado,
professora titular de História
da América Independente da USP

SEPARAÇÃO DE GÊNEROS Mesmo assim, enquanto alguns historiadores enxergam nos trabalhos realizados por jornalistas exemplos de como difundir o tema a públicos amplos, outros advogam com veemência a separação entre as duas produções. A grande discussão nascida a partir da entrada dos jornalistas no campo da historiografia parece girar mais em torno da validade de seus trabalhos como pesquisas e de seu impacto na população do que em seus métodos de alcançar o sucesso.

A professora titular de História da América Independente da USP, Maria Ligia Coelho Prado, é uma das estudiosas que propõe tal delimitação, afirmando: “Um historiador tem uma preocupação muito bem estabelecida com o tempo e o espaço. Ele não comete anacronismos”. Ela entende que a explicitação de fontes, o detalhamento de notas de rodapé e os diálogos com a bibliografia – todos pré-requisitos em um trabalho acadêmico – são essenciais na produção histórica.

“Um trabalho que se preocupe com tudo isso será mais difícil de ser lido do que a produção de um jornalista. Não que este não tenha qualidade. Mas o compromisso do jornalista com a história é diferente”, explica ela. Em sua opinião, por estarem mais preocupados em escrever uma prosa fluente e de fácil leitura, os jornalistas acabam esquecendo-se daquilo que eles enxergam como “preciosismos e exageros dos historiadores”. E é exatamente este o motivo ao qual ele credita o sucesso de obras como as de Laurentino Gomes: “Para mim é óbvio que esse trabalho do jornalista vai ter mais apelo e maior facilidade para chegar ao grande público do que a pesquisa de um acadêmico preocupado com tantas questões que envolvem seu próprio ofício”.

BANDIDOS E MOCINHOS Em sua visão, apresentar ao leitor versões fundamentadas e com um sólido tratamento crítico é uma tarefa árdua “Por exemplo, um tema clássico da historiografia latino-americana, a Revolução Mexicana. Você tem tantos atores e sujeitos, tantas visões, e naturalmente um historiador que estuda a Revolução Mexicana também assume uma perspectiva”, explica. A abordagem acaba seguindo a visão do pesquisador. “Se ele tem simpatia por Emiliano Zapata e por seus camponeses, se pelo Pancho Villa e os trabalhadores rurais do norte”, as interpretações podem ser distintas.

“A complexidade de certos acontecimentos históricos é tal que, para um historiador apresentar aquele tema, ele tem que conhecê-lo muito bem e afirmar muito claramente a sua perspectiva sem colocar adjetivos e mais adjetivos que dizem, ‘Ah, este é o bandido e aquele é o mocinho’. Isso é fácil, em suas palavras. “Agora, quando você apresenta tudo de uma forma mais complexa, como deve ser, fica mais difícil de se ler”.

Maria Ligia completa com uma alusão ao que ela afirma ser uma diferença essencial entre os trabalhos de jornalistas e especialistas: “Para nós, historiadores da academia, o mercado não importa. Não é assim que construímos uma carreira e, além do mais, nós somos professores. Portanto, nosso objetivo principal é ensinar. Nossos livros não têm sua importância medida pelo número de exemplares vendidos”.

Foto: Acervo Gilberto Maringoni

D. Pedro II, por Angelo Agostini, litografia, Revista Illustrada, 1887. Biografias de personagens de destaque se constituem em segmento importante de obras sobre o passado nacional

ACABAR COM PRECONCEITOS O professor Marcos Silva ecoa os sentimentos de Maria Coelho Ligia Prado, chegando a classificar livros como os de Eduardo Bueno na mesma categoria que trabalhos de ficção. “Há a história dos especialistas, desenvolvida na universidade e em instituições federais, mas existe também outra história mais geral, criada tanto por jornalistas como por ficcionistas, através de seus romances, contos, crônicas, peças de teatro, seriados de televisão, novelas e filmes, por exemplo”. De acordo com sua definição, os dois campos são, respectivamente, o da cultura histórica formal e o da cultura histórica informal.

Foto: Reprodução

A conquista dos campos de Garapuava, Joaquim José de Miranda, guache e aquarela, século 18. Uma polêmica envolve os livros de história escritos por jornalistas: apesar da larga difusão, alguns especialistas apontam falta de profundidade na análise de processos históricos complexos

“O primeiro campo, em geral, vem da academia e chega ao grande público através dos livros didáticos usados no colégio”, prossegue Silva. “Já o segundo campo, informal, que não é menos importante, é feito pelos diferentes meios de comunicação. Ele tem um peso social grande, por atingir uma parcela mais numerosa da população, mas não tem uma preocupação tão rígida com questões de método, podendo ser mais flexível ao pretender primeiramente prender a atenção do espectador”.

Foto: Acervo pessoal

“Há a história dos
especialistas, desenvolvida na
universidade e em instituições
federais, mas existe também
outra história mais geral, criada
tanto por jornalistas como por
ficcionistas, através de seus
romances, contos, crônicas,
peças de teatro, seriados
de televisão, novelas e
filmes, por exemplo”

Marcos Silva,

professor

Para Elias Thomé Saliba, “O que falta em relação à história do Brasil é o mesmo que falta em outros setores da produção e das pesquisas de ponta: divulgação. Nos últimos anos, há um esforço muito grande nesse sentido, mas ainda é algo muito restrito”. Saliba faz questão de considerar alguns empreendimentos editoriais que julga terem obtido sucesso. Ele menciona a História da Vida Privada no Brasil, obra coletiva lançada em 1998 e que até hoje tem bons níveis de penetração. Chegou à 12ª edição, com cem mil exemplares vendidos.

“Correndo o risco de não mencionar alguém e cometer injustiças, muitos historiadores escreveram livros que foram bem recebidos pelo público, como Lilia Schwarcz, Mary Del Priore, Nicolau Sevcenko e vários outros,” afirma.

DIÁLOGO NECESSÁRIO Mas mesmo propondo tal delimitação, Marcos Silva acredita que, pelo bem do campo da história no Brasil, os dois grupos devem entrar em um acordo para compartilhar suas especificidades no campo da produção literária. “Os jornalistas devem levar os historiadores a desenvolver oratória e escrita mais acessível ao grande público, enquanto os acadêmicos de formação metódica podem auxiliar os formados em Comunicação em relação aos processos e procedimentos da pesquisa histórica”, conclui.

O jornalista e escritor Lira Neto, autor da biografia Getulio (2012), já chegou a lecionar história em colégios de Fortaleza. Para ele, tanto os acadêmicos quanto os profissionais de imprensa precisam acabar com certos preconceitos, para que seus trabalhos surtam efeito positivo na luta pela difusão do conhecimento histórico. “Os jornalistas têm de aprender com os historiadores o rigor, e no sentido contrário, os historiadores podem se abrir à possibilidade de se comunicar”, propõe o autor. “A briga e a birra não cabem. O melhor para todos – jornalistas, historiadores e público – seria uma aliança, para que cheguemos a um produto final melhor”, finaliza”.

Já nas bancas!

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Revistas que tratam de história se multiplicam e criam mercado específico

Nas bancas de jornais, as revistas temáticas sobre história – principalmente do Brasil – se multiplicam e ganham público leitor. A História Viva, por exemplo, possui uma tiragem de mais de 30 mil exemplares mensais, segundo dados da editora Duetto. A Aventuras na História alcança outros 72 mil exemplares, de acordo com o site da editora Abril.

Em todas, há a preocupação de se elaborar uma linguagem e uma abordagem acessível para leitores pouco habituados aos temas tratados. Entre todas, a Revista de História da Biblioteca Nacional guarda uma especificidade: a maioria das matérias é escrita por historiadores da academia.

O Manual do Colaborador de sua antecessora, a Nossa História, era bastante claro. A revista “tem como missão levar ao maior número possível de pessoas o conhecimento de história do Brasil de maneira precisa e acessível. Para tanto, identificamos como forma ideal o texto jornalístico, em vez da linguagem acadêmica na qual é escrita a maioria dos trabalhos produzidos em universidades e centros de pesquisa”.

A revista publicada pela Editora Vera Cruz circulou entre os anos 2003 e 2006, totalizando 38 edições. Fruto de uma dissidência do conselho editorial da revista surgiu a Revista de História da Biblioteca Nacional em 2005, editada pela Sociedade Amigos da Biblioteca Nacional (Sabin). As duas revistas, somadas a exemplares como História Viva, Aventuras na História, Leituras da História foram criadas com a mesma intenção de divulgar temas históricos para o público ampliado.

Luciano Raposo Figueiredo, ex-editor da Revista de História da Biblioteca Nacional é professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). Segundo ele, havia uma certa tensão na redação, pelo fato de o editor não ser um jornalista. “A condição de editor fica no topo de uma estrutura hierarquizada quanto ao poder de decisão. Isso significa dizer que os historiadores definiam o trabalho dos jornalistas. Deve-se notar que aos jornalistas cabiam, além da produção de reportagens, a adaptação dos textos para publicação e sua apresentação final. Nas reportagens os historiadores costumavam orientar os jornalistas desde a apuração e a seguir, tendiam a ser cobrados para fazerem um maior aprofundamento”, explica.

O texto das revistas de divulgação histórica tem de ter tamanho que proporcione uma boa leitura. Para seduzir o público leitor, os jornalistas inserem figuras fundamentais para tornar as matérias atraentes, “pois conteúdo sem forma não serve a uma publicação voltada para o grande público”, completa Luciano.

 
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