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Reforma agrária perde fôlego na agenda nacional

2012 . Ano 9 . Edição 75 - 28/12/2012

Foto: Acervo pessoal

Manifestação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, em 22 de agosto de 2012

Igor Ojeda – de São Paulo

Modelo agropecuário voltado para a exportação de commodities e queda no número de assentamentos indicam mudanças na política fundiária brasileira. Há várias visões sobre a questão. De um lado, a reforma agrária seria uma iniciativa ultrapassada, devido à modernização da agricultura. Porém, os movimentos sociais alegam que uma orientação distributiva de terras estaria acoplada à alteração do modelo econômico adotado pelo país

Promessa de sucessivos governos e demanda de vários setores da sociedade, aparentemente a reforma agrária deixou de ser prioridade para o país. O ano de 2012 apresenta um índice bastante baixo de famílias que obtiveram um pedaço de terra em programas de assentamento pelo Brasil. Segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), até 16 de novembro apenas 10.815 famílias haviam sido incluídas em assentamentos rurais, um terço da meta estabelecida para o ano. Para efeito de comparação, em 2006, 136.319 famílias foram beneficiadas.

Além disso, somente metade dos R$ 3 bilhões reservados ao órgão no Orçamento da União de 2012 havia sido executada até meados de novembro. Em relação à verba específica para a compra de terras para fins de reforma agrária, apenas 41% do total de R$ 426,6 milhões tinham sido gastos.

Os números de assentamentos deste ano são ainda mais modestos que os de 2011, quando 21,9 mil famílias haviam sido assentadas.

Foto: Rafael Martins/Agecom

Integrantes do MST fazem manifestação em frente ao Centro Administrativo da Bahia, em Salvador, em abril de 2011

“Embora conste da programação oficial – nos Planos Plurianuais 2008/2011 e 2012/2015 –, o Programa de Reforma Agrária praticamente desapareceu da agenda governamental, pelo menos desde os anos finais do mandato do presidente Lula. A partir de 2011 o programa ficou ainda menor, e, mais grave, os assentamentos se tornaram alvo da acusação de serem em grande medida responsáveis pela tragédia da pobreza rural mais extrema”, aponta Brancolina Ferreira, coordenadora de Desenvolvimento Rural da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Foto: Luís Gustavo/Ascom/Incra

Família recebe casa através de projeto de assentamento governamental em Itapuama, Pará

CRESCIMENTO DO AGRONEGÓCIO O progressivo desaparecimento da reforma agrária da pauta nacional é acompanhado, não coincidentemente, pela hegemonia cada vez maior do chamado agronegócio. A escolha foi fundamental para o rumo tomado pelo Brasil nos últimos anos, de retomada do seu papel de país exportador de commodities. “A política privilegia o agronegócio e financia a expansão de grandes empreendimentos no campo, enquanto o Programa de Reforma Agrária vem sendo peremptoriamente desconstruído. O reconhecimento de que a questão agrária brasileira permanece como uma âncora poderosa ao desenvolvimento brasileiro é obliterado pelo avanço – a qualquer custo – do agronegócio e suas contribuições para a balança comercial”, analisa Brancolina.

Para o professor da Universidade de Brasília (UnB) José Eustáquio Ribeiro Filho, também técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea, o debate sobre a reforma agrária remete a um “passado bem longínquo”, quando a questão da terra era fundamental para a distribuição de renda. Segundo ele, nos últimos quarenta anos o país passou por um processo de modernização da agricultura que tornou a tecnologia o grande fator de redução da desigualdade. “A terra é um fator produtivo, mas por si só não redistribui renda e valor bruto da produção. Hoje o setor é de ponta, gera muita tecnologia, emprego e renda, tanto que é um setor estratégico”, afirma.

Na análise de Ribeiro Filho, a agricultura atual não se resume apenas ao uso de recursos naturais, mas principalmente à elevação da produtividade para competir no mercado externo e interno. “Por isso o debate em relação à reforma agrária ficou esvaziado, porque a questão central é o acesso à tecnologia.” Nesse sentido, em sua opinião a agenda dos governos deveria ficar mais centrada na educação e extensão rural.


MUDANÇA DE CONCEITO Já para o presidente do Incra, Carlos Guedes de Guedes, a reforma agrária não saiu da agenda do governo federal, mas o conceito sobre essa política é que passou por alterações: “Há uma mudança de qualidade no tema. Sempre a concebemos a partir de duas leituras: uma presente na primeira metade do século 20, muito associada aos processos revolucionários, de mudança da realidade social por meio da distribuição igualitária da terra; e outra mais próxima à nossa realidade, com o grande processo de colonização promovido pela ditadura na década de 1970. Atualmente estamos trabalhando com outro conceito: a reforma agrária é uma iniciativa que fundamentalmente tem de ser trabalhada com a execução de políticas públicas, com o objetivo muito claro de transformar os assentamentos em comunidades rurais autônomas e integradas ao território em que vivem”.

No entanto, de acordo com João Pedro Stedile, da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o último período vem sendo caracterizado por uma “nova aliança de classes no campo”, formada por grandes proprietários de terras, capital financeiro, transnacionais de insumos agrícolas e grande mídia. “Isso criou uma hegemonia da classe dominante que retirou da pauta da sociedade brasileira a reforma agrária e todas as reformas sociais que interessam ao povo”, opina.

Para ele, o “caráter de composição de classes” dos governos Lula e Dilma impede a realização de mudanças estruturais. “Dentro do governo o setor do agronegócio é hegemônico, enquanto os setores que defendem a reforma agrária, a agricultura familiar, o meio ambiente e os sem-terra são minoritários. As políticas são contraditórias: às vezes atendem o agronegócio, às vezes a agricultura familiar. Mas, majoritariamente o agronegócio tem preponderância”.

Stedile ressalta que a reforma agrária clássica – levada a cabo, por exemplo, nos países europeus – sempre esteve combinada com um projeto de industrialização da economia. Em seu raciocínio, a democratização da propriedade da terra serve para se reorganizar a produção agrícola voltada para o mercado interno e para a geração de empregos.

Para o dirigente sem-terra, no entanto, isso “depende necessariamente de um projeto de desenvolvimento nacional, que foi abandonado pelas atuais forças dirigentes”.

Foto: Ivone Perez

“Dentro do governo o setor
do agronegócio é hegemônico,
enquanto os setores que
defendem a reforma agrária,
a agricultura familiar, o meio
ambiente e os sem-terra são
minoritários. As políticas
são contraditórias: às vezes
atendem o agronegócio, às vezes
a agricultura familiar. Mas,
majoritariamente o agronegócio
tem preponderância”

João Pedro Stedile,
Coordenação Nacional do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Em agosto de 2011, em entrevista à revista Carta Capital, ele afirmou existirem quatro milhões de pessoas no campo que poderiam ser beneficiadas pela reforma agrária, mas que hoje estão “adormecidas” pelo Bolsa Família e pela expansão do emprego na construção civil.

TERRAS PÚBLICAS Segundo a publicação do IpeaPolíticas Sociais - acompanhamento e análise nº 20, de agosto de 2012 (disponível em www.ipea.gov.br), nos últimos anos os assentamentos promovidos pelo governo federal têm sido viabilizados especialmente em terras públicas, por meio de processos de regularização fundiária, “enquanto as desapropriações, estas sim, com impacto positivo sobre a estrutura fundiária, vêm diminuindo”. De acordo com o Instituto, em 2010 foram obtidos apenas 289,6 mil hectares como decorrência de desapropriações, enquanto cerca de 1,4 milhão de hectares foram viabilizados via reconhecimento e arrecadação.

O estudo demonstra que no mesmo ano a maior parte dos assentamentos concentrou-se na região amazônica: enquanto 53% das famílias beneficiadas eram do Pará, Amazonas e Maranhão, os estados de Sergipe, Santa Catarina e Espírito Santo respondiam, cada um, por menos de 1% dos assentados. Para os autores do estudo, tal realidade se deve justamente ao fato de a política de distribuição de terras vir perdendo espaço na agenda governamental.

Setores contrários à reforma agrária e mesmo o governo federal costumam usar como justificativa para o esgotamento dessa política os dados do Incra sobre a situação dos assentamentos. Segundo o órgão, 42,9% das famílias assentadas haviam abandonado os lotes, por desinteresse ou falta de conhecimento para cultivá-los, 35,4% tinham transferido ilegalmente as terras e 10,6% não haviam cumprido cláusulas contratuais.

Contudo, outra publicação do Ipea, a Nota Técnica nº 12, intitulada A importância do crédito para o desenvolvimento social e produtivo dos assentados, responsabiliza a

Foto: Divulgação

“Os tímidos avanços da
reforma agrária, dos processos
de regularização das terras
quilombolas e da demarcação
dos territórios indígenas não
nos permitem falar em apoio
à agricultura camponesa em
sua totalidade, senão sob o
entendimento de que ela se
limita aos sujeitos mencionados,
esquecendo grande parte dos
trabalhadores rurais brasileiros”

Brancolina Ferreira,
técnica de planejamento e
pesquisa do Ipea

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política de créditos governamental por tal realidade. “Parece subsistir um flagrante contrassenso na atuação do Estado, que, de uma parte, elege como prioridade o combate à pobreza extrema e, de outra parte, instaura procedimentos para cobrar às famílias assentadas, oriundas majoritariamente de uma condição de dramática vulnerabilidade social, uma dívida referente a créditos que, por suas finalidades e valores, têm servido quase exclusivamente para prover necessidades básicas”.

De acordo com o texto do estudo, que tem Brancolina Ferreira entre seus autores, além de não realizar uma política de créditos adequada para os assentados, o governo, por meio de seu discurso oficial, tem “reforçado os estigmas negativos com que, sem lastro em dados concretos e análises críticas cuidadosas, os adversários da política de reforma agrária costumam desqualificá-la”.

MUDANÇA DE FOCO A mudança de foco em relação à questão apontada pelo presidente do Incra foi anunciada recentemente pelo órgão e pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Agora, a prioridade não é a desapropriação ou a aquisição de terras para a reforma agrária, mas a regularização fundiária e o fortalecimento dos assentamentos através de políticas públicas voltadas à qualidade de vida dos assentados e assistência técnica para a produção. A reforma agrária deixa definitivamente de ser vista como mecanismo de redução da desigualdade e de promoção do desenvolvimento nacional para ser considerada como uma das ferramentas de erradicação da miséria em casos pontuais.

Segundo Carlos Guedes de Guedes, presidente do Incra, essa mudança de conceito traz o desafio de identificar onde a reforma agrária de fato se faz necessária. “Há regiões do Brasil em que a estrutura fundiária, gostemos ou não dela, as desenvolveu. E há outras onde a estrutura fundiária não cumpre sua função social e é um dos fatores da falta de desenvolvimento local. Por isso, temos uma prioridade de intervenção, diretamente relacionada a um dos grandes desafios do governo: a superação da pobreza extrema”, explica.

Foto: Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo/Agriculturasp

Monitoramento da cultura do girassol, em Arealva (SP). Pesquisas e novas tecnologias têm ajudado na diversificação produtiva no campo

O presidente do Incra ressalta que, para isso, é preciso levar os assentamentos para o mesmo patamar onde hoje se encontra a agricultura familiar, “um sujeito político e social muito relevante e reconhecido pelo conjunto da sociedade brasileira como produtor de alimentos para o mercado interno e como conservador da biodiversidade”.

AGRICULTURA FAMILIAR Uma das marcas da política agrária dos governos Lula e Dilma foi o aumento do investimento e do apoio estatal ao setor da agricultura familiar, embora em escala muito menor aos dispensados ao agronegócio. O valor do crédito oferecido pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) mais do que quadruplicou durante as gestões petistas, passando de R$ 3,9 bilhões para a safra 2002/2003 para R$ 18 bilhões previstos para o período 2012/2013.

Brancolina Ferreira, do Ipea, alerta que dados do Banco Central mostram que os recursos do Pronaf em 2011 se concentraram no sul do país, onde a agricultura familiar está mais estruturada e possui maior renda. “Os tímidos avanços da reforma agrária, dos processos de regularização das terras quilombolas e da demarcação dos territórios indígenas não nos permitem falar em apoio à agricultura camponesa em sua totalidade, senão sob o entendimento de que ela se limita aos sujeitos mencionados, esquecendo grande parte dos trabalhadores rurais brasileiros”, analisa. A consequência disso, para Brancolina, é uma dissonância de pautas entre agricultores familiares e demais trabalhadores rurais.

AGROECOLOGIA Uma vez retirada da pauta a reforma agrária clássica, os movimentos sociais do campo agora jogam sua força sobre a proposta de uma reforma “popular”. “Quando havia brechas para se construir um projeto de industrialização de país, era possível ir acumulando forças por meio de desapropriações e assentamentos. Por isso, os trabalhadores rurais poderiam ir enfrentando as questões pontuais do campo. Hoje, a luta tem de ser por mudar o modelo econômico e pensar um novo projeto para o país”, defende João Pedro Stedile.

E um novo projeto para o país exigirá, segundo o dirigente do MST, um novo modelo de agricultura, distinto ao adotado hoje, que utiliza uma matriz produtiva e tecnológica “agressora do meio ambiente e dependente da utilização de venenos agrícolas”. Ainda de acordo com Stedile, esse novo modelo seria baseado na prioridade de produção de alimentos sadios para o mercado interno, por meio de pequenas agroindústrias e cooperativas e com a adoção de novas diretrizes que aumentem a produtividade do trabalho e das áreas, sem o uso de agrotóxicos. “Essas técnicas são chamadas de agroecologia, cuja matriz depende de mudanças no modelo agrícola, que incluem a democratização do acesso à terra para que milhões de brasileiros hoje sem terras possam se transformar em agricultores autônomos”.

OUTRO LADO A reportagem tentou entrevistar a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), entidade ligada aos ruralistas, mas não obteve espaço em sua agenda. A assessoria de imprensa da CNA encaminhou a Desafios do Desenvolvimento o estudo Quem produz o que no campo: quanto e onde II, elaborado em parceria com a Fundação Getulio Vargas (disponível em www.canaldoprodutor.com.br), como resposta a um questionamento baseado em dados do último Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O levantamento mostra que a agricultura familiar produz a maior parte dos alimentos consumidos internamente e emprega mais mão de obra por hectare do que as grandes propriedades. O documento da CNA, por sua vez, conclui que “os produtores rurais não enquadrados no Pronaf são responsáveis por 76,3% do Valor Bruto da Produção agropecuária nacional e, embora representem 30,7% das propriedades rurais brasileiras, respondem por 80,1% da produção agrícola/silvícola e por 65,8% da produção pecuária”.

Foto: Gleilson Miranda

Projeto de agricultura familiar apoiado pelo governo do Acre

A reportagem entrou em contato também com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), mas sua assessoria de comunicação respondeu que “tecnicamente o ministério apto para falar sobre o assunto [reforma agrária] é o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA)”. Diante da insistência, a assessoria retornou afirmando que as pessoas dentro do Mapa que poderiam falar sobre a questão não tinham disponibilidade de agenda. (colaborou Tatiana Merlino)

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