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Salvem os manguezais

2013 . Ano 10 . Edição 77 - 07/10/2013

Foto: Moscatelli/Olho verde

O bairro de Guaratiba, no Rio de janeiro, ainda de baixa densidade demográfica e com grandes áreas desocupadas que estão virando loteamentos urbanos, abriga canais de acesso para o oceano, apicuns e imensos manguezais

Myrian Luiz Alves

O Brasil abriga 10 mil km2 de mangues e de matas em pontos onde a vida na terra se encontra com a do mar. A ocupação desordenada ao longo da costa tem provocado perda e fragmentação desses ecossistemas. Especialistas alertam para a degradação ambiental, as perdas sociais e trazem à tona a relevância desses habitat para a vida no planeta

No passado, os manguezais eram associados a doenças como a febre amarela e a malária. Daí, de certa forma, decorre o desprezo e a antipatia com o ecossistema, apesar da importância para a economia e para a sobrevivência de espécies animais e vegetais. Ocorre que, como reza o ditado popular, por vezes Deus escreve certo por linhas tortas. A área escolhida para sediar o principal encontro da Jornada Mundial da Juventude com o papa Francisco, no bairro de Guaratiba, na cidade do Rio de Janeiro, batizada de Campo da Fé (Campus Fidei), foi completamente inundada momentos antes da chegada do pontífice, em fins de julho. O transtorno, no entanto, estava previsto desde abril deste ano, como mostra a ata de reunião do Conselho Municipal de Meio Ambiente, da prefeitura do Rio. Documento do Instituto Estadual de Meio Ambiente, por sua vez, alertara que duas áreas do loteamento onde seria instalado o Campo eram “frágeis e com a presença de mangue”.

O biólogo Mario Moscatelli também alertara a imprensa, no início de junho, que a área onde estava sendo construído o Campo da Fé era “reconhecidamente área de mangue e apicum, instável e sujeita a inundações”. Segundo ele, para tornar a área edificante, muito mais recursos teriam de ser aportados, “mas prejudicaria ainda mais a reserva biológica de Guaratiba”. Ainda de baixa densidade demográfica, o bairro de Guaratiba, localizado depois da Barra da Tijuca e do Recreio dos Bandeirantes, abrange canais de acesso e a barra para o oceano, com grandes áreas desocupadas, a maioria com vegetação rasteira, apicuns e imensos manguezais. O fato é que esse desastre ecológico acabou por chamar a atenção do grande público para aquilo que há muito os ambientalistas vêm alertando: a relevância dos manguezais para a vida no planeta.

MAIORES DO MUNDO Dos 162 mil Km2 de florestas de mangues do planeta, segundo a Organização Internacional de Madeiras Tropicais das Nações Unidas, o Brasil abriga 10 mil Km², 80% deles nas regiões Norte e Nordeste. Com 1,2 mil km de costa, a Bahia possui 800 km² de manguezais. As maiores extensões do ecossistema na costa brasileira, segundo o Ministério do Meio Ambiente, localizam-se entre a desembocadura do rio Oiapoque, no Amapá, e o Golfão Maranhense, formando uma barreira entre o mar, os campos alagados e a terra firme. Do sudeste do Maranhão ao Espírito Santo, os manguezais, mais reduzidos, são associados a lagunas, baías e estuários. Entre o Pará e o Maranhão localiza-se a maior área de manguezais contínua do mundo.

O estudo Panorama da Conservação dos Ecossistemas Costeiros e Marinhos, de 2012, do Ministério do Meio Ambiente, mostra como a ocupação desordenada ao longo da costa brasileira vem causando perda e fragmentação desses habitat. As principais causas apontadas são a conversão das áreas para a criação de camarões em cativeiro, a carcinicultura, ocupações humanas e as destinadas ao turismo, alvos de sucessivas denúncias encaminhadas ao poder público, incluindo o Ibama. O estudo alerta não somente para a degradação ambiental, mas também para as perdas sociais e econômicas.

O problema tem origem na formação do Estado brasileiro. A cidade paulista de Santos, por exemplo, nascida com um porto, expandiu- -se sobre um gigantesco manguezal que foi sendo aterrado ou drenado, por completo, para dar lugar ao progresso. A cidade do Rio de Janeiro, por sua vez, espraiou-se sobre a Baía da Guanabara, os manguezais foram progressivamente aterrados para a expansão da cidade ou sendo usados como lixões. Em 500 anos de ocupação, 60% dos manguezais da baía desapareceram. Assim, dependendo da cidade, por causa dos aterros, lixões, esgoto doméstico, poluição por detritos químicos ou derramamento de petróleo – e, ainda, a especulação imobiliária e a atual febre da carcinicultura – calcula-se que 25% dos manguezais brasileiros foram destruídos.

Olho Verde dos mangues cariocas

Mestre em Ecologia com concentração na área de gerenciamento costeiro e recuperação desses ecossistemas, Mario Moscatelli é presença constante nos periódicos do Brasil e do exterior. Com o projeto de monitoramento ambiental aéreo Olho Verde, ele sobrevoa uma vez por mês a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, denunciando pela mídia os problemas ambientais observados. Ele lembra que, até o final da década de 1980, de nada adiantaram a Lei Federal de 1965 e dispositivos estaduais e municipais criados para proteger o habitat.

Durante seu trabalho na Baía de Ilha Grande, em Angra dos Reis (RJ), de 1989 a 1991, presenciou que o estrago era autorizado por quem deveria proteger os manguezais. Naquele período, como chefe de Controle Ambiental da cidade, além das denúncias por ele encaminhadas ao Ministério Público, anulou todas as licenças ambientais emitidas em favor de loteamentos e marinas de luxo sobre manguezais. Após quatro ameaças de morte e uma fuga de 45 dias do país, foi literalmente expulso da cidade. Estima-se que dois mil hectares de manguezais foram degradados com o aval do poder público. Naturalmente e de forma induzida, recuperou aproximadamente 100 hectares de mangues na região de Angra dos Reis.

“Aos trancos e barrancos, recuperamos algumas áreas de mangue”, observa, referindo-se ao Sistema Lagunar de Jacarepaguá, Lagoa Rodrigo de Freitas, entorno do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho, na foz do rio São João de Meriti, no canal do Fundão, onde criou, para a Secretaria de Estado do Ambiente, 170 mil m2 de novos mangues na Ilha do Fundão.

Foto: Divulgação

 


“Aos trancos e barrancos,
recuperamos áreas de mangue”



Mario Moscatelli,
biólogo e mestre em Ecologia

 

LEI FLORESTAL O Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes mantêm o Projeto de Conservação Efetiva e Uso Sustentável dos Manguezais no Brasil em Áreas Protegidas (GEF-Mangue), que já apresentou diagnóstico dos impactos da produção de camarão nos manguezais. Coordenado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT-ICMBio), o projeto tem espaço institucional com representação governamental e da sociedade: a Comissão Técnica sobre Manguezais (CT sobre Manguezais), criada pela Portaria 185 do MMA, de 31 de maio de 2011, no âmbito do Comitê Nacional de Zonas Úmidas.

Com a desculpa de receber os peregrinos no Campo da Fé durante a visita do papa Francisco, empresários do setor imobiliário queriam que governo do Rio drenasse quatro canais em Guaratiba, o que acabaria por destruir 48 km de mangues e 144 mil m2 da Reserva Biológica local. O desastre ambiental não chegou a ser efetivado

“É preciso entender o ecossistema como ele realmente se apresenta, plástico, resiliente e flexível”, diz a professora Flávia Rebelo Mochel, representante das universidades na Comissão Técnica sobre Manguezais. Na discussão do novo Código Florestal, em 2011, liberou-se parte do manguezal para a criação de crustáceos e para salinas. Na região amazônica, pode ser explorado economicamente em até 10% da área total do manguezal. Nas demais regiões, permitiu- se a exploração de 35%, com exceção das ocupações já consolidadas.

Para Flávia, a decisão seria um equívoco. “Não há apenas um manguezal, como não há apenas um tipo de floresta nesse imenso território”, diz. Ela explica que, se no Sul e Sudeste o apicum é encontrado na interface entre a terra firme e o manguezal, no Norte, em boa parte, ele aparece no meio do mangue. Professora do Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Maranhão, ela também é a representante da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) no Conselho Deliberativo do Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA).

Carioca, há 25 anos radicada no Maranhão por querer trabalhar nos maiores manguezais do mundo, Flávia adquire conceitos sobre o habitat principalmente na vivência com os que sobrevivem secularmente do meio: “A academia do mangue nunca foi fechada.

Foto: Thiago Rodrigues Cavalcanti

“A utilização dos manguezais
deve ocorrer de forma
sustentável, evitando-se a
sobrepesca, por exemplo”

Maria Bernadete Sarmiento
Gutierrez, técnica do Ipea

Não é possível o conhecimento somente de laboratório. Os pesquisadores estão em campo, interagindo, dialogando com marisqueiros, quilombolas, mulheres”. Ela conta: “Quando observamos algo diferente, perguntamos a eles: vocês sabem se isso estava aqui há 20, 50 anos?”

Um dos pontos críticos que hoje mais ameaçam os manguezais é o uso de grandes áreas para a aquicultura, geralmente de apenas uma espécie, como acontece com a carcinicultura, que utiliza um bem público para aproveitamento privado. E é esse tipo de “privatização” o maior provocador de conflitos, incluindo o armado, como os deflagrados no Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. O objetivo da comissão técnica é apresentar subsídios ao Programa Nacional para a Conservação dos Manguezais, também chamado Plano de Ação Nacional (PAN) Manguezal. Apesar do prazo de dois anos – prorrogáveis – para o funcionamento do colegiado, até meados de setembro ainda não havia ocorrido uma reunião prevista para abril deste ano.

RELEVÂNCIA ECOLÓGICA Técnica de Planejamento e Pesquisa do Ipea, Maria Bernadete Sarmiento Gutierrez ressalta que, dada a importância do ecossistema na manutenção de um equilíbrio ecológico, com destaque para a vida marinha e seus desdobramentos na cadeia alimentar, é certo que sua preservação deveria ser tratada de forma compatível com sua relevância ecológica.

Ela lembra que aproximadamente 15% do total mundial dos manguezais encontram-se no Brasil e que esse ambiente tem sofrido alterações significativas, principalmente pela ocupação urbana sem o devido cuidado com a sua preservação. “A utilização dos manguezais deve ocorrer de forma sustentável, evitando-se a sobrepesca, por exemplo”, alerta. Portanto, diz, além de controlar a ocupação urbana neste ecossistema, torna-se também de primordial importância a educação ambiental para que sua utilização ocorra de forma sustentável e não predatória, com atividades num nível adequado que permitam a manutenção das suas funções ecológicas.

Maria Bernadete observa que o Mapa dos biomas do Brasil: primeira aproximação (IBGE, 2004) não incluiu os manguezais como um bioma com identidade própria, mas sim como parte de outros biomas. “Trata-se, sem dúvida, de uma limitação que deverá ser superada no futuro, com a produção de melhores estatísticas”, diz. Ela também entende que a evolução do Código Florestal, numa segunda fase, deverá incluir a discussão de forma clara e consistente com a realidade brasileira.

A riqueza dos nutrientes nas gamboas

Os manguezais encontram-se, em sua maioria, nas regiões costeiras tropicais e subtropicais do planeta. Formam-se junto a desembocaduras dos rios e em litorais protegidos da ação direta do mar. Também podem adentrar quilômetros no continente, com as águas dos rios misturando-se com o mar, como ocorre em Belém e no estado de São Paulo. Os canais que permitem a troca de água doce e salgada são chamados gamboas. Considerado berçário de variadas espécies animais e vegetais, o solo dos manguezais é rico em nutrientes e matéria orgânica.

A temperatura determina a altura das árvores dessa floresta. No Norte do país, mais próximo do Equador, podem alcançar 30 metros, enquanto na região Sul, apenas um. Originárias do Oceano Índico, as plantas típicas de mangue se reproduzem por propágulos que germinam ainda ligados à árvore-mãe. Ao tornarem-se maduros, deslocam-se e formam uma nova planta.

Composto por apenas três tipos de árvores – Rhizophora mangle (mangue- -bravo ou vermelho), Avicena schaueriana (mangue-seriba ou seriúba) e Laguncularia racemosa (mangue- -branco) –, o mangue sofre ação predatória também por parte do setor de turismo, na construção de resorts, e urbanização.

 
Flor do mangue (Rhizophora mangle): bioma de matéria orgânica)

 

 
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