resep nasi kuning resep ayam bakar resep puding coklat resep nasi goreng resep kue nastar resep bolu kukus resep puding brownies resep brownies kukus resep kue lapis resep opor ayam bumbu sate kue bolu cara membuat bakso cara membuat es krim resep rendang resep pancake resep ayam goreng resep ikan bakar cara membuat risoles
Perfil - Uma mente privilegiada

2014 . Ano 11 . Edição 82 - 31/12/2014


Uma mente privilegiada

A morte de Divonzir Gusso, um dos maiores especialistas brasileiros em educação, comove o Ipea. Inquieto, questionador e ao mesmo tempo conciliador, ele era considerado, pelos colegas, um patrimônio do serviço público
Marina Nery

rd82perfil01img006Em mais de 40 anos dedicados ao Ipea, Divonzir Arthur Gusso não só exerceu diversos diversos cargos executivos no órgão, mas também se destacou quando, cedido a outras instituições, ficou à frente de programas de políticas públicas fundamentais na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da Educação. “Ele foi o responsável pela concepção e implementação do processo de avaliação dos cursos de pós-graduação que então funcionavam no Brasil”, lembra o diretor de Desenvolvimento Institucional do Ipea, Luiz Cezar de Azeredo, ex-coordenador de Planejamento e Administração da Capes.

Falecido em dezembro de 2014, aos 73 anos, Gusso também é considerado por muitos o “pai” do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), cuja primeira versão foi criada na ocasião em que estava no Inep, na primeira metade dos anos 1990. A partir de uma amostra de escolas que ofertavam as 1ª, 3ª, 5ª e 7ª séries do ensino fundamental das escolas públicas da rede urbana, os estudantes foram avaliados em Língua Portuguesa, Matemática e Ciências. As 5ª e 7ª séries também foram avaliadas em redação. Era uma época em que o Inep ainda nem fazia o Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio.

Posteriormente, o Sistema de Avaliação da Educação Básica foi ampliado e hoje é composto por um conjunto de avaliações externas em larga escala para diagnosticar o sistema educacional e fatores que possam interferir no desempenho do estudante, fornecendo um indicativo sobre a qualidade do ensino que é ofertado. No trabalho Estudos em Avaliação Educacional, publicado em 1992, Gusso resumia o que era necessário: “Saber exatamente o que a escola está fazendo, qual o seu papel ideal e discutir o que é que efetivamente poderia estar fazendo”.

Em depoimento para o livro Ipea 40 anos, Gusso narra como foi convidado pelo então ministro da Educação José Goldenberg para assumir a direção geral do Inep: “O Inep tinha sido inicialmente extinto pelo governo Collor. Foi recriado junto com a Capes, mas tinha sido destruído; tinha 250 funcionários, mas não tinha mais capacidade de fazer coisa nenhuma. Goldenberg me chamou: ‘Vamos ter que ressuscitar o Inep’. Tentei recusar, mas acabei indo para lá. Botei o Inep de pé novamente, institucionalizando o Saeb, para avaliar se e quanto as escolas básicas conseguiam ensinar, e posicionando o Inep no assessoramento técnico do ministro. A partir daí, na administração de Paulo Renato, a professora Maria Helena Guimarães Castro deu um show, transformando o Inep no órgão mais importante do MEC. Mas até chegar até ali, foi uma batalha”.

Não foram poucas as contribuições de Gusso para a área de educação. “Ele foi o pioneiro do sistema de avaliação de proficiência de ensino brasileiro à frente do Inep – poucos conhecem a participação dele nesta história, pois a modéstia não deixava”, conta o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), Marcelo Neri, que foi presidente do Ipea. Ele chama a atenção para duas qualidades de Gusso, constatadas em encontros para as propostas educacionais do livro Brasil em Desenvolvimento, lançado em 2014, e na atuação do pesquisador durante reuniões no Conselho Nacional de Desenvolvimento Social: determinação e solidariedade. Neri acrescenta que Gusso era “respeitado e querido pelos velhos e os novos conhecidos”, fazendo referência não só ao pessoal do Instituto, como também aos integrantes do programa Todos Pela Educação, “que coloquei em contato com ele durante minha gestão no Ipea”, informa.

rd82perfil01img001

“Ele foi o pioneiro do
sistema de avaliação de
proficiência de ensino
brasileiro à frente do
Inep – poucos conhecem
a participação dele
nesta história, pois a
modéstia não deixava”


Marcelo Neri,
ministro da
Secretaria de Assuntos Estratégicos
da Presidência da República (SAE)

Quando a Desafios fez contato com o Todos pela Educação, recebeu uma declaração em conjunto dos funcionários dizendo que, “nos encontros que tivemos com Divonzir, além de termos o privilégio da sua simpatia sempre contagiante, pudemos contar com o importante conhecimento histórico das políticas públicas de Educação que ele demonstrava ter. Divonzir defendia o aumento do investimento público na área, reconhecia no Fundef e, posteriormente, no Fundeb a política pública que mais contribuiu, até hoje, para a redução das desigualdades na área da Educação. E procurava novos caminhos de financiamento para que a elevação do investimento preconizada no PNE ocorresse de fato. É uma perda importante entre aqueles que pensam a Educação pelo viés social”.

rd82perfil01img007

A preocupação com o social pode ser vista em um trabalho importante de Gusso, em 1993, no artigo Plano decenal de educação para todos – para uma nova matriz de políticas públicas de educação. Os objetivos do Plano são lembrados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1996. O Plano Decenal foi de grande importância histórica e política para a educação nacional, municipal e estadual, ou, nas palavras de Gusso, em 1993: “A sociedade começa a perceber, por exemplo, que não é aceitável apenas expandir a oferta escolar – abalando um dos móveis das pressões clientelísticas; distribuir mais diplomas – abalando os efeitos credencialistas; atribuir à pobreza da família a incapacidade do aluno para aprender – solapando a ‘cultura da repetência’ – pondo em cheque o monopólio docente da gestão escolar”.

Quem trabalhou no Plano Decenal de Educação para Todos junto com Gusso foi o professor da pós-graduação em Educação da Universidade Católica do Brasil (UCB), ex-diretor e secretário- adjunto de Política Educacional do MEC, Célio da Cunha. “O Ministério da Educação sempre usava os relatórios do Divonzir quando pensava em políticas públicas porque seus trabalhos eram muito sólidos, bem fundamentados, seguros, com conteúdo, e deram grande contribuição à educação brasileira”. Cunha chama a atenção para os aspectos pessoais de Gusso: “O Divonzir era uma pessoa de dimensão humana e solidária extraordinária, colaborava com quem quer que seja, além de ter muita ética. Muito correto, muito profissional”.

O presidente do Ipea, Sergei Soares, concorda: “Ele nunca foi difícil, era um ótimo amigo e muito agradável. Quando se tinha um problema de gestão, e levava ao Divonzir, porque ele resolvia. Representava em uma só pessoa tudo o que o Ipea deve ser”. Soares acredita que Gusso vai fazer muita falta por várias razões: “Ele era a história viva, porque acompanhou a política educacional nos últimos 40 anos: o que aconteceu, quem era quem, ele sabia tudo o que tinha dado certo ou errado e o porquê”. Soares lembra ainda a disposição de Gusso para o trabalho: “A contribuição dele foi imensa porque não ficava em um cantinho sem fazer nada. Estava lá trabalhando, inclusive até pouco tempo era coordenador de Educação”.

rd82perfil01img003

“O Divonzir era uma pessoa de
dimensão humana e solidária
extraordinária, colaborava com quem
quer que seja, além de ter muita ética.
Muito correto, muito profissional”
Célio da Cunha, professor da
pós-graduação em Educação da
Universidade Católica do Brasil (UCB)

Recentemente, já aposentado, mas na ativa no Ipea como bolsista e ainda participando de debates importantes sobre educação, Gusso não perdia o entusiasmo. “Ele era bastante otimista e sempre buscava uma visão macro do nosso país”, lembra o técnico de Planejamento e Pesquisa Danilo Coelho, que organizou o livro Tecnologia, exportação e emprego, em que Gusso abordava o tema da educação. “Divonzir era inquieto, gostava de questionar o que era apresentado, mas sempre estimulava e conciliava seus funcionários, obtendo um trabalho mais qualificado. Com essa atitude, ele ajudou outras gerações de técnicos e funcionários que surgiram na instituição”, reconhece o técnico de Planejamento e Pesquisa Mauro Oddo, colega de diretoria de Gusso. O técnico de Planejamento e Pesquisa Aguinaldo Maciente dá um depoimento emocionado sobre ele: “Divonzir Gusso, esse eterno garoto paranaense, entrou no Ipea em outubro de 1972, dois meses antes de meu nascimento, e era um patrimônio insubstituível de minha instituição e do serviço público brasileiro. Lembro-me dele desde o meu primeiro dia no trabalho, no treinamento dos recém-aprovados no concurso, e de como ele impressionou aquele moço de 25 anos, com mestrado incompleto, que mal sabia fazer uma pesquisa e que ainda estava um tanto assustado com um trabalho tão novo em uma terra tão distante. Em minhas inseguranças iniciais, encontrei nele um exemplo de desenvoltura, de articulação e de dedicação a uma instituição que também eu iria aprender a respeitar”. Maciente acrescenta que tinham muita coisa em comum: “Ambos descendentes dessa italianada batalhadora, que educou seus filhos com muito suor, direcionamos esse exemplo familiar de dedicação para uma vida de estudo, de leitura e de vontade de aprender. Ambos éramos fascinados por outras línguas e povos, por viagens, pelo gosto por chegar em casa com bons ingredientes e fazer um prato delicioso para a família. Ambos, apesar dos pontos de vista às vezes diferentes, compartilhávamos também essa vontade de ver nosso país cada vez melhor e mais desenvolvido”.

O técnico de Planejamento e Pesquisa Paulo Meyer – que assinou com Maciente, Divonzir e outros técnicos um estudo sobre a escassez de engenheiros, muito procurado pela mídia e por autoridades – comenta, igualmente consternado: “Perdi um grande amigo e um mestre. Divonzir foi minha primeira referência dentro do Ipea. Nas longas conversas em sua sala (que era ao lado da minha, em seus tempos de Diset), surgiam inúmeros assuntos e parênteses, os quais ele sempre fechava se lhe davam tempo. Ganhou de um colega o apelido de hiperlink ambulante”. Os colegas formaram um pequeno grupo de estudos e as conversas frequentemente se estendiam por animados almoços, com Gusso trazendo pratos de receitas sofisticadas que aprendeu mundo afora. “Ficaram dessa fase muitos ensaios para o boletim Radar, alguns Textos para Discussão e, principalmente, boas lembranças, farto aprendizado tácito sobre os mais diversos temas e grande admiração.”

rd82perfil01img004

“Ele era a história viva,
porque acompanhou a política
educacional dos últimos
40 anos: o que aconteceu,
quem era quem, ele sabia
tudo o que tinha dado certo
ou errado e o porquê”

Sergei Soares, presidente do Ipea

A intelectualidade de Gusso – interessava-se por música, cinema e literatura – também é recordação de todos. “Era uma pessoa de fino trato, muito culta e viajada”, afirma Luiz Kubota, que levou em conta o trabalho junto com Gusso para se transferir para a Coordenadoria de Educação. “Divonzir defendia que a melhor metodologia para um problema era ter a visão de que a pesquisa deve focar sempre em uma pergunta relevante a ser respondida”, lembra.

Testemunha da generosidade de Gusso com os recém-chegados, o técnico Luis Felipe de Oliveira, do último concurso do Ipea (2008), acumula a coautoria de alguns trabalhos com Gusso, inclusive o mais recente (2014), Trajetória e desafios da educação básica no Brasil, além de  Evolução da desigualdade de proficiência na aprendizagem da matemática, em recortes regionais. Oliveira comenta a vantagem de trabalhar com Gusso: “Nosso colega Divonzir guardava uma enorme capacidade de transitar entre a teoria e a prática das políticas públicas. Isso porque ele acumulava o conhecimento formal, da concepção e avaliação de políticas públicas, mas possuía a experiência de gestão na ponta, já que exerceu cargos relevantes, tanto na esfera federal como estadual. Esse vasto conhecimento lhe proporcionou amarrar temáticas complexas, sobretudo as relacionadas aos problemas do dia a dia, que os gestores educacionais enfrentam. Por exemplo, o grande imbróglio que é a questão do federalismo brasileiro e como ele afeta as diferentes etapas educacionais”. Segundo Oliveira, essa vivência lhe permitia enxergar soluções com uma facilidade peculiar, “com uma energia contagiante e, principalmente, com uma visão atualizada sobre os temas em que se debruçava. Isso, certamente, é o que mais nos serve como exemplo: a busca por sempre entender os problemas de uma maneira ampla, ao observar as práticas domésticas e internacionais sobre o que estudamos, conciliando o rigor acadêmico com o que as dificuldades mais realistas e concretas nos impõem”, conclui. 

O diretor de Desenvolvimento Institucional, Luiz Cezar de Azeredo, confirma a competência e dedicação de Gusso: “Ele participou de vários trabalhos realizados pelo Ipea na área de avaliação e acompanhamento dos programas governamentais no campo educacional, foi também responsável pela autoria de diversos textos sobre o assunto e designado para representar o Ipea em inúmeros Conselhos e Grupos de Trabalho instituídos tanto em âmbito governamental como no meio acadêmico. Extremamente dedicado ao Ipea, Divonzir também detinha inúmeras e importantes informações sobre todo o processo de evolução de nossa instituição, sendo inclusive a principal referência para consultas desse tipo em nosso âmbito. Sempre que algum vídeo comemorativo ou institucional era feito, recorriam à sua memória de elefante”, destaca o técnico Paulo Meyer.

rd82perfil01img005

“Divonzir Gusso, esse eterno
garoto paranaense, entrou
no Ipea em outubro de
1972, dois meses antes de
meu nascimento, e era um
patrimônio insubstituível
de minha instituição e do
serviço público brasileiro”
Aguinaldo Maciente, técnico de
Planejamento e Pesquisa do Ipea

A larga experiência de Gusso não se limitava à área de educação. Ex-diretor de Estudos Setoriais do Ipea e hoje coordenador da Diset, Luis Fernando Tironi recorda quando Gusso retornou da cessão ao Ministério da Educação, no primeiro governo Fernando Henrique, e desejava engajar-se em atividades não estritamente da sua tradicional área de atuação, educação e política educacional. “Quando o Divonzir integrou-se à Diset, o escopo de atuação desta unidade era de alcance maior que o atual. A diretoria atuava nas áreas setoriais como agricultura, indústria e infraestrutura, abordando temas como financiamento, produtividade, comércio externo, integração regional (Mercosul), defesa comercial, regulação econômica, ciência e tecnologia, arranjos produtivos locais, propriedade industrial, etc. Naquela época, eram dois os coordenadores gerais da Diset: José Garcia Gasquez, que cobria a área agrícola, e Gusso, que atuava nas questões de competitividade, temática que era o denominador comum no conjunto das áreas de atuação da diretoria. A Diset analisava, discutia, avaliava e participava da formulação de políticas e medidas visando a promover a competitividade da economia brasileira no cenário global. Em alguns casos, participava-se da própria execução de políticas. Uma das ferramentas da Diset para cumprir sua missão foi elaborar e divulgar o Boletim de Política Industrial”, esclarece, ressaltando que “Divonzir era uma autoridade nacionalmente reconhecida em política de educação e jamais deixou de manter-se muito atualizado nas questões de política educacional brasileira”. Mais recentemente, a partir do último concurso para técnicos do Ipea, Gusso participou da formação do grupo de pesquisas sobre educação e mercado de trabalho, na Diset.

Pedro Demo, professor da UnB e técnico de Planejamento e Pesquisa aposentado, especialista em sociologia da educação, falou sobre as qualidades de Gusso: “Divonzir foi um dos maiores especialistas em educação dos últimos tempos. Sabia informar-se como ninguém, tinha sempre consigo os dados mais atualizados. Acompanhava a discussão atentamente e discutia as questões de mérito soberanamente. No Ipea sempre foi colega primoroso, competente, presente, suave, conciliador. Trabalhou até o fim, porque tinha no trabalho uma parte importante do sentido da vida. Gostava do seu trabalho, do Ipea e do país. Figura emblemática. Perda irreparável”.

Para Luiz Cezar Azeredo, “Divonzir nos deixou um notável legado de competência, responsabilidade e seriedade em suas atividades profissionais”.

Aguinaldo Maciente, técnico de Planejamento e Pesquisa, diz que Divonzir foi “um exemplo de como pode haver pessoas com visão ampla e generosa, de como há servidores públicos que vestem a camisa de suas instituições, que dedicam suas vidas, com otimismo, a um país que pode ser melhor”.

Divonzir Gusso era fundamentalmente um educador, estava sempre ensinando todos, principalmente os mais jovens. E tanto no serviço público como fora dele representava o que há de mais amplo na palavra servidor.

rd82perfil01img008

 
Copyright © 2007 - DESAFIOS DO DESENVOLVIMENTO
É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação sem autorização.
Revista Desafios do Desenvolvimento - SBS, Quadra 01, Edifício BNDES, sala 1515 - Brasília - DF - Fone: (61) 2026-5334