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Legislação antiterror divide especialistas

2015 . Ano 12 . Edição 83 - 19/06/2015

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O Brasil é signatário de diversos tratados e convenções que abordam o tema terrorismo.

Em 23 de setembro de 2014, o Conselho de Segurança da ONU aprovou, por unanimidade, a obrigação de estados-membros adotarem leis que tornem crimes a associação de seus cidadãos a grupos terroristas em outros países. Tema controverso, que não consegue consenso nem quanto à sua conceituação, a criminalização do terror encontra dificuldades para passar no Legislativo, onde se discute a questão há pelo menos duas décadas.

Lena Azevedo

A Lei de Crimes Hediondos (8.072), de 1990, aborda o problema, mas esbarra no fato de estar misturada com outros delitos, como favorecimento da exploração sexual de crianças e adolescentes, estupro, extorsão, homicídios, entre outros. Antes dessa legislação, foram publicadas a Lei 7.170/83 (a terceira Lei de Segurança Nacional editada no período da ditadura), com previsão de pena de até 10 anos de reclusão para os autores de atentados, mas, sobre esta, a opinião era de que foi feita para perseguir dissidentes políticos do regime militar.

Os que defendem a aprovação de dispositivos legais para tipificar o terrorismo argumentam que, mesmo distante de ameaças, o Brasil tem obrigação de criar legislação específica para cumprir os acordos internacionais por ele ratificados, além de ter instrumentos para coibir movimentações de pessoas ou integrantes de organizações que praticam atividades identificadas com o terror.

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AP

Em 2013, com as manifestações populares, o Congresso tentou colocar o tema novamente na pauta, com a apresentação do projeto 499, do Senado. A reação foi forte não só dos partidos de esquerda, mas de movimentos sociais e entidades como a OAB, que atribuíram a proposta a uma tentativa de criminalizar manifestantes. Em março deste ano, após a publicação de uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo que mostrava a cooptação de jovens brasileiros pelo grupo Estado Islâmico nas redes sociais, o projeto foi novamente colocado em discussão. O senador Romero Jucá pediu urgência em sua aprovação, mas foi vencido por colegas de Parlamento, os quais argumentaram que o tema requer um debate profundo, ouvindo todos os lados envolvidos na questão.

O subprocurador da República, Carlos Eduardo Vasconcelos, acha que o país tem leis suficientes para responsabilizar autores de crimes. O pesquisador do Ipea André de Mello e Souza, um dos organizadores do livro Do 11 de Setembro de 2001 à Guerra ao Terror (Ipea, 2014), disse que, ainda que o terrorismo não constitua ameaça direta ao Brasil, existem implicações que devem ser consideradas. Ele lembra que, após os ataques às torres gêmeas, em 11 de setembro de 2001, o país foi pressionado pelos EUA a se posicionar e que a embaixada americana no Brasil reconhece que o país empreendeu um grande esforço de investigação para detectar fontes de financiamento ao terrorismo, entre outras ações.

André de Mello afirma que depois do atentado percebeu-se a necessidade de adoção ou fortalecimento de medidas multilaterais de combate ao terrorismo, sobretudo apreciadas no âmbito da ONU. No Conselho de Segurança da ONU, após os ataques nos Estados Unidos até o final de 2012, foram aprovadas 33 resoluções sobre terrorismo. Desse total, 12 foram apresentadas quando o Brasil ainda era membro temporário do Conselho. O país votou favoravelmente em todas.

33
resoluções

sobre terrorismo foram aprovadas no Conselho de Segurança da ONU, após
os ataques nos Estados Unidos

No livro Do 11 de Setembro de 2001 à Guerra ao Terror, o pesquisador relaciona que, além da ONU, “o Brasil participa do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi/ FATF), criado em 1989 pelo G-7 e que possuía como membros, em fevereiro de 2013, 34 Estados e duas organizações internacionais”, e integra o Grupo de Egmont, de 1995, e composto, em fevereiro de 2013, por unidades financeiras de inteligência (FIU) de 131 países, que tem por objetivo facilitar a cooperação no combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.

Diferente da ONU, a Organização dos Estados Americanos (OEA) tem apenas um instrumento que abriga diversas medidas de combate ao terrorismo: a Convenção Interamericana contra o Terrorismo (OEA, 2002). É considerada por pesquisadores o principal instrumento normativo para o combate ao terrorismo nas Américas, priorizando o monitoramento de atividades financeiras. O protocolo foi internalizado no Brasil por meio do Decreto nº 5.639, de dezembro de 2005.

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A publicação cita pelo menos três projetos surgidos no Senado após o 11 de Setembro para tipificar o terrorismo, além do PL 499/2013. Os anteriores não resistiram à pressão social e sequer foram à votação. Por falta de consenso e de confiança nos objetivos da legislação específica, o assunto ainda está envolto em uma zona de sombras. Resta saber até quando.

O Projeto de Lei do Senado 499/2013, resultado da Comissão Especial Mista, tem como principal crítica o fato de ser extremamente vago quanto à definição de terrorismo, deixando espaço para a criminalização de movimentos sociais e sindicais, de participantes das manifestações, como as que ocorreram em 2013. O artigo 2º do PL define ato terrorista como “provocar, ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa, ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação de liberdade de pessoa”. E é justamente esse ponto que emperrou a discussão do projeto, já que os demais artigos estão submetidos ao entendimento inicial. As penas previstas variam de 15 a 30 anos de prisão para atos e financiamento ao terrorismo e de três a oito anos por incitação ou favorecimento pessoal ao terrorismo, entre outros itens. O projeto diz ainda que são “inafiançáveis, insuscetíveis de graça, anistia ou indulto” os crimes previstos na lei.

Para especialistas, a falta de clareza quanto à definição de terrorismo compromete o restante do projeto. Mesmo os que defendem a proposta, sustentam que ela teria que passar necessariamente por uma ampla discussão, envolvendo os ministérios que tratam do assunto e órgãos de defesa, além da sociedade civil para se chegar a um consenso mínimo. Essa é a opinião do desembargador federal aposentado do TRF, Vladimir Passos de Freitas: “cabe ao Congresso Nacional dar andamento aos projetos de lei antiterrorismo, discuti-los sem a pressão de algum acontecimento trágico, consultando a sociedade, associações de classe, movimentos sociais e a Academia, oferecendo assim, ao Brasil, uma lei moderna, equilibrada e eficiente”, defendeu em artigo publicado no início deste ano.

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Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criticou o PLS 499/2013. Em parecer apresentado em setembro de 2014, não há justificativa para lei específica, considerando a definição do crime de terrorismo já vem sendo discutido no âmbito do projeto do Novo Código Penal (PLS 236/2011), que seguiu em maio deste ano para análise da CCJ. O líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT/CE), considera que o novo Código Penal trata o tema de forma menos subjetiva e com maior precisão. Já o senador Randolfe Rodrigues (PSOL/ AP) não vê qualquer necessidade de lei para classificar o terrorismo. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, declarou ser possível votar uma proposta rapidamente, sem qualquer discussão com a sociedade, ministérios e órgãos de segurança envolvidos com o tema.

Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), não vê motivo para a preocupação com a segurança e afiançou ao Comitê Olímpico Internacional (COI) que o governo brasileiro dará todas as garantias para cidadãos brasileiros e de outros países. “Não temos ações terroristas no país”, assegurou Nuzman a representantes do COI em fevereiro deste ano.

O Brasil é um dos poucos países da América Latina a não contar com lei de tipificação do terrorismo. O marco legal antiterrorista da Argentina foi publicado em 2007 e modificado em 2011. O Paraguai editou a norma jurídica em 2010, e o Peru também conta com dispositivos legais específicos. Apesar de ter sido reformulada várias vezes, a lei antiterror chilena, promulgada em 1984, é vista com desconfiança, por significar um legado da ditadura militar (1973-1990) e feita para criminalizar opositores do regime.

Guerra antiterror

Um ano e meio após os atentados às torres do Word Trade Center, o governo americano e as forças de coalizão multinacionais invadiram o Iraque com a justificativa de conter uma suposta fabricação de armas de destruição em massa pelo regime de Saddam Hussein – que Bush afirmava poder cair nas mãos de terroristas –, e com o argumento de devolver “a democracia” ao país. Saddam foi deposto, capturado e condenado à morte, em 2006. Formalmente, a guerra no Iraque terminou no final de 2011, custou aos EUA US$ 2,2 trilhões e deixou um saldo de quase cinco mil militares das forças aliadas e 134 mil civis iraquianos mortos.

Entrevista

Edison Benedito

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João Viana/Ipea

“Ainda não há consenso no mundo sobre o que é terrorismo”

O grupo terrorista Estado Islâmico estaria tentando cooptar jovens brasileiros. A informação foi publicada pelo jornal O Estado de São Paulo em sua edição de 22 de março de 2015. Segundo a reportagem, os órgãos de inteligência detectaram pelo menos dez brasileiros convertidos atuando nas redes sociais. A publicação reacendeu no Congresso a discussão sobre o terrorismo e a necessidade de se votar um projeto específico. Projetos de combate ao terror estão há 22 anos tramitando no Legislativo sem que ganhe destaque na pauta. O coordenador de Estudos em Instituições e Governança Internacional do Ipea, Edison Benedito da Silva Filho, analisa a posição do país frente aos ataques e ao aumento de grupos radicais no mundo e por que o Legislativo tem dificuldades de chegar a um consenso e aprovar uma lei antiterror. 

Desenvolvimento – Como o senhor define terrorismo? A prática pode ser atribuída apenas a grupos?

Edison Benedito da Silva – Não existe consenso mesmo entres os países sobre o que é terrorismo, apesar dos esforços recentes no sentido de criar uma regulação internacional para monitorar e combater práticas terroristas. Em geral, o terrorismo é entendido como um ato de violência praticado por agentes que não pertencem a nenhum aparato estatal, destinado a pressionar governos, perseguir determinados grupos sociais ou inspirar pânico na população civil em geral. As motivaçõesdo terrorismo geralmente são de cunho político e religioso, de modo que os atos são planejados e executados por grupos de pessoas que compartilham de uma mesma ideologia. Mas às vezes o terrorista age sozinho (“lobo solitário”), ainda que em solidariedade a uma bandeira política, mas sem qualquer vinculação com outros grupos que comungam dessa mesma ideologia.

Desenvolvimento – Quantos grupos terroristas existem no mundo e como conseguem recursos para suas atividades?

Edison – É muito difícil precisar sua quantidade, pois os países têm autonomia para decidir os critérios que qualificam uma organização como terrorista. Dados de 2014 mostram um total de 170 organizações que são apontadas como terroristas no mundo, mas a ONU reconhece apenas 34 delas como tal. Os Estados Unidos listam um total de 70 organizações e o Reino Unido é o país que possui a lista mais longa, com 74 grupos. As fontes de financiamento do terrorismo são diversas: grupos mais organizados conseguem apoio inclusive de governos estrangeiros interessados na desestabilização do regime local, além de se beneficiarem das redes de apoio e proteção social estabelecidas para viabilizar ajuda internacional à população local e, em alguns casos, da exploração de atividades econômicas em regiões onde exercem controle político. Já os grupos menores e independentes se valem de contrabando, tráfico de drogas e outros crimes para se financiar, além de contar com apoio irregular das mesmas redes que suportam os grupos mais bem organizados.

Desenvolvimento – Em que medida o estado consegue controlar a possibilidade de distúrbios ou ataques, considerando o fenômeno da globalização?

Edison – A globalização de fato torna o enfrentamento do terrorismo um problema muito mais complexo, posto que a capacidade de monitoramento, planejamento e intervenção dos governos não tem se ampliado na mesma velocidade com que as redes terroristas conseguem se valer da integração econômica e institucional dos países para estender o alcance de suas ações. Contudo, esse cenário também constitui um incentivo aos governos para intensificarem a cooperação internacional no campo da segurança, por meio do compartilhamento de informações e melhores práticas, do auxílio aos países mais pobres ou institucionalmente fragilizados, etc.

Desenvolvimento – A Guerra ao Terror desrespeitou vários tratados internacionais de tratamento humanitário em tempos de guerra, de respeito aos direitos humanos. Os protocolos internacionais estão defasados?

Edison – Infelizmente ainda inexiste uma regulação internacional efetiva e suficientemente abrangente para assegurar um modelo homogêneo de enfrentamento do terrorismo no mundo. A exemplo da legislação penal, cada país também possui liberdade para definir seu próprio conceito de terrorismo e como esse crime será tratado pelas instituições judiciárias locais. Na ausência de uma definição unânime do que é terrorismo, o que se pode avançar e que se tem de fato avançado é no combate aos seus meios de organização e financiamento e na prevenção de seus crimes, por meio de ações de inteligência que frequentemente envolvem a cooperação com outros países.

Desenvolvimento – Como o senhor vê a união dos grupos Estado Islâmico e Boko Haram, anunciada recentemente? Quais os riscos?

Edison – Na minha opinião, por enquanto trata-se mais de um evento de propaganda, do que uma cooperação efetiva entre esses grupos. É sabido que o Estado Islâmico tem vínculos com diversos grupos que operam na Líbia e Egito, mas a ligação desses grupos com aqueles que operam na Nigéria (caso do Boko Haram) ou no Mali (onde a França interveio em 2013) ainda é débil, e o Estado Islâmico permanece focado principalmente no Oriente Médio. Contudo, se continuar a deterioração política nos países do norte da África, cujo principal foco de instabilidade hoje é a Líbia, pode ocorrer uma aliança de grupos extremistas que de fato amplifique sua capacidade de atuação, pondo em
risco a estabilidade de outros países e a segurança de suas populações.

Desenvolvimento – São frequentes as mortes de civis no combate ao terrorismo e as violações de direitos humanos. As intervenções em países que praticam violações de direitos humanos são justificáveis?

Edison – Quando observados os aspectos legal e moral, sem dúvida. Mas essa intervenção deve ser planejada e executada de modo a minimizar o sofrimento da população civil. Além disso, frequentemente a pressão política se mostra o meio mais adequado para alcançar o objetivo de reduzir essas violações, em vez da intervenção militar. Isso porque, para além dos seus danos colaterais, a ação militar gera a destruição do aparato estatal local, que é então substituído por grupos opositores cuja luta pelo poder frequentemente causa ainda mais violações de direitos humanos que o regime anterior. Então a justificativa legal ou moral não é suficiente para legitimar a intervenção.

Desenvolvimento – Qual a posição do Brasil nesse cenário?

Edison – A Constituição Brasileira é clara ao repudiar o terrorismo, mas não há uma definição sobre o que se entende por essas práticas. Não existe tipificação do crime de terrorismo. O Brasil condena o terrorismo em âmbito mundial, mas internamente se mostra cauteloso em adotar uma legislação específica sobre o tema, em virtude principalmente do receio de criminalizar movimentos sociais cujas demandas são consideradas legítimas por grande parte da sociedade, além de prejudicar o trabalho de mediação feito pelo Brasil para incentivar o diálogo político de grupos em conflito com o governo nos países vizinhos.

 

“Foram gastos trilhões de dólares em nome de determinada concepção. O espantoso dessa ação pós-11 de setembro é que as agências de inteligência foram criando aparatos sem desativar aqueles que supostamente já estavam obsoletos. Os EUA controlam o ar, o mar, as ondas eletromagnéticas e a moeda. A espionagem americana, inclusive de países aliados, é de um etnocentrismo profundo e terrificante. É hipocrisia usar o terrorismo para justificar tudo. Evidente que havia também interesses estratégicos nesse monitoramento. O Snowden colocou os esqueletos fora do armário”, opina o professor da Coppe/UFRJ e coordenador do Grupo de Estudos Estratégicos da instituição, Domício Proença Junior.

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João Americo/Secom/MPF

Edward Snowden foi funcionário terceirizado da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA) e revelou, em 2013, o amplo alcance da espionagem americana, que atingiu não só as comunicações domésticas, mas as de vários países, inclusive do Brasil. Além de Snowden, hoje exilado na Rússia, o site Wikileaks publicou, em 2010, milhares de documentos militares dos EUA com evidências de crimes de guerra cometidos pelas tropas internacionais no Afeganistão e no Iraque. Só no Iraque foram torturadas mais de 300 pessoas. Na documentação havia ainda denúncias de coação e assassinatos de mais de 100 mil iraquianos, sendo 70 mil civis, segundo o site.

100
mil iraquianos

foram coagidos e assassinados durante
a invasão dos EUA ao Iraque

“Os ataques de 2001 se concentraram em cidades e edifícios que simbolizam o poder econômico, político e militar dos EUA, potência hegemônica no pós-Guerra Fria, o que significa dizer que o terrorismo passou a produzir efeitos e a ser foco de atenção e combate em nível mundial. A decisão dos EUA de levar adiante a guerra ao terror teve um alto custo, não só financeiro, mas de restrição às liberdades individuais e do poder do Estado de agir de forma arbitrária”, lembra o pesquisador André de Mello e Souza.

O subprocurador-geral da República,Carlos Eduardo Vasconcelos, concorda: “Parece que o século XXI realmente se inicia com o ataque às torres gêmeas. Ele mudou o mundo. Mas acho que o que mudou o mundo de verdade foi menos o ataque do que a reação do governo dos Estados Unidos a ele. O sentimento de pânico, um dos objetivos essenciais do terrorismo, passou a estar presente em todas as iniciativas do Estado, a justificar o endurecimento dos meios de repressão e de restrição das liberdades individuais, inclusive a invasão indiscriminada da privacidade das pessoas”.

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AP - Em 2002, foram levados para a base militar de Guantánamo, em Cuba,
186 prisioneiros acusados de ligação aos grupos Taliban e Al Qaeda,
capturados no Afeganistão

Para Domício Proença Junior, os EUA cometeram um erro estratégico ao “declarar guerra a um fenômeno”. Foram gastos trilhões de dólares em confrontos travados no Iraque e Afeganistão e o terrorismo só fez aumentar seu poder de fogo.

“É preciso sempre lembrar que a Al Qaeda de Osama Bin Laden (morto em 2011, no Paquistão) emergiu de apoio americano, para dar conta da Rússia, quando ela invadiu o Afeganistão. Depois da retirada soviética do país, em 1989, vários veteranos da guerra desejaram lutar novamente pelas causas islâmicas e os EUA viraram alvo – o mesmo que pode ter ocorrido com o exército do Iraque que os Estados Unidos tentaram criar e com as forças contrárias ao presidente Bashar al-Assad, na Síria, produzindo o assim chamado Estado Islâmico. A resposta dos EUA ao ataque do 11 de setembro foi irrefletida: não se podia declarar guerra a um fenômeno; e ainda que a invasão do Afeganistão pudesse ser vista como legítima defesa, com apoio da maioria dos países da ONU, a invasão do Iraque revelou-se uma armação que custou muito caro aos Estados Unidos”, afirma Proença Junior.

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Divulgação

“Desde então, com a caça aos assim chamados alvos de alto valor, o governo americano não se deu o trabalho de legitimar sua ação. Gastou muito dinheiro e matou milhares de pessoas, inclusive cidadãos americanos. A partir de 2006, a Al Qaeda respondeu ao que se fazia e virou uma espécie de franquia assassina, mas mais eficaz do ponto de vista de seus objetivos que o sistema anterior de células conexas. A Al Qaeda aparentemente deu muito dinheiro a quem quisesse executar atentados em nome do grupo. Isso ampliou o raio de ação e a intensidade dos ataques”, analisa o pesquisador. Nesse ambiente em que o combate ao terror justifica tudo, os mecanismos internacionais não conseguiram fazer valer legislações que tratam de direitos humanitários e da soberania dos países.

Em 2002, foram levados para a base militar de Guantánamo 186 prisioneiros acusados de ligação aos grupos Taliban e Al Qaeda, capturados no Afeganistão, e houve denúncias de tortura e manutenção de detentos sem acusação formal e direito a julgamento. Além das Convenções de Genebra, que estabelecem normas de humanidade em tempos de guerra, o governo americano desconheceu vários tratados internacionais, incluindo o protocolo da ONU contra a tortura.

Para os pesquisadores, será preciso muito debate para propor novos instrumentos que deem conta dessa nova realidade, na qual o terrorismo inova suas ações e os países regridem no respeito à soberania dos Estados e às liberdades individuais. Um problema enorme que ainda está em curso e de difícil resolução.

 
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