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Hora de revirar o baú

2015 . Ano 12 . Edição 83 - 19/06/2015

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Livro escrito por economistas do Grupo de Estudos de Conjuntura do Ipea resgata boletins trimestrais do Instituto desde 1988

Caetano Manenti

Sabe aquela sensação nostálgica de folhear velhos álbuns de fotos ou revirar baús de cartas antigas, de um tempo no qual ainda guardávamos essas coisas? Pois bem: um livro que está sendo editado pelo Ipea vai dar aos brasileiros a chance de relembrar os mais significativos momentos dos últimos 26 anos da economia do país – nem sempre com nostalgia, é claro. Não se trata propriamente de um livro de fotos ou cartas, mas há aí uma semelhança, sim. O livro reúne e reinterpreta os Boletins de Conjuntura do Ipea desde quando eles começaram a ser produzidos pelo Instituto, no já longínquo ano de 1988. Atualmente, o documento trimestral, que segue sendo elaborado pelo Grupo de Estudos de Conjuntura do Ipea, é chamado de Carta de Conjuntura, um material precioso que tenta (e aí está o paralelo) fotografar a atual situação da economia brasileira.

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É claro que essas fotos não estão sortidas aleatoriamente. Uma após a outra, elas formam a sinuosa jornada da economia brasileira ao longo das últimas duas décadas e meia. “É como se a análise de conjuntura fosse uma foto, mas nós analisamos essa foto dentro de um filme. Se algo está acontecendo agora é porque coisas aconteceram atrás ou ainda porque coisas não aconteceram atrás. Essa foto pode levar ao final do filme de uma ou de outra maneira”, compara Maria Andreia Lameiras, uma das autoras do livro.

Experiência em analisar

O boletim trimestral do Ipea é o mais tradicional documento de análise de conjuntura econômica elaborado no país. Desde o fim da década de 1980, ajuda governos, mercado e população – os documentos sempre foram públicos – a entender melhor o que se passa na economia nacional. O economista Paulo Levy, outro autor do livro, já foi coordenador do grupo, no qual trabalha há 21 anos. Ele explica os motivos que tornaram o material do núcleo tão relevante no Brasil: “A análise de conjuntura surge de uma necessidade dos formuladores de política em Brasília, numa época em que não havia computador e internet, de saber o que estava acontecendo com a economia do Brasil. Brasília era um lugar isolado e todos queriam conversar com industriais, comerciantes e pessoas do mercado de trabalho para, assim, poderem tomar suas decisões”.

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Divulgação - Os autores do livro (da esquerda para direita): Estêvão Xavier,
Maria Andreia, Leonardo Mello, Fernando Ribeiro e Paulo Levy

Hoje em dia, muitas outras instituições também produzem análises de conjuntura, como os próprios bancos e as agências de investimento. Embora respeitados, são relatórios que costumeiramente passam uma visão otimista da situação econômica, interpretações que não pretendem desencorajar os clientes a investir. Desde sempre, as análises de conjuntura do Ipea mantêm um perfil mais rigoroso, crítico, com uma extensa conferência de dados. É o que reforça o atual coordenador do grupo, o economista Fernando Ribeiro: “O esforço fundamental é compilar o máximo de informação, de indicadores, de dados. Isso permite montar o quadro mais fiel possível do que está acontecendo. A gente trabalha com os dados fundamentais, mas sempre agrega o máximo de outros dados também. Não há tanta preocupação em fazer uma análise ultrarrápida, como, por exemplo, os bancos fazem”.

Cinco períodos

Os 26 anos analisados no livro foram repartidos em cinco períodos, em cinco capítulos, cada um sob a responsabilidade de um dos cinco analistas que hoje formam o grupo de conjuntura. Paulo Levy ficou (na opinião de todos) com o período mais difícil, aquele que vai do início de 1988 até julho de 1994, ou seja, até o Plano Real. Era difícil para a população sobreviver no caos econômico da inflação alta e do desajuste fiscal. O trabalho dos analistas, claro, também não era nada fácil. “Havia uma dramaticidade no ar. E isso aparece claramente nas análises do Grupo de Conjuntura naquele momento. Ao mesmo tempo há uma sensação de impotência dos analistas. Eles diziam: ‘olha, nós estamos caminhando para o desastre, para o abismo, e não conseguimos ver mecanismos para impedir que a gente siga nesta direção’”.

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Divulgação

Foi em um boletim do final de 1989 que Paulo encontrou o debate fundamental que geriu o Plano Collor. “Era uma discussão relativamente nova no Brasil, que tomou como ponto de partida o reconhecimento de que a inflação era um problema de estoque”. Todos sabem: o plano que congelou aplicações financeiras, inclusive os depósitos bancários, não deu certo. Os motivos do fracasso foram investigados à exaustão pela equipe do Ipea. Paulo, então, mostra satisfação ao lembrar que o grupo foi um dos primeiros no país a mostrar como a política fiscal do Collor passou a se “beneficiar” da inflação. “Às vezes, aparentava-se uma situação de equilíbrio fiscal, mas claramente isso só acontecia porque havia uma inflação muito elevada que reduzia o valor real dos gastos, o que acabava criando um equilíbrio ruim, um equilíbrio falso na economia brasileira”.

As palavras de Paulo ganham vida na história de trabalho de pessoas como José Temporão, de 92 anos – 51 deles dedicados ao restaurante Mosteiro, no centro do Rio. Português, ele lembra, com a expressão preocupada, da época em que a inflação não lhe dava sossego: “A inflação foi terrivelmente muito séria. Era um trabalho de aumentar, aumentar, aumentar, todo o dia. Segunda, terça, quarta, quinta e sexta, eu mudava os preços do menu. O filé mignon entrava mais caro, o peixe entrava mais caro, as frutas entravam mais caras. Tudo era mais caro e eu tinha que atualizar todo o dia. Eu batia o menu na máquina. Não tinha nem condição de ter um cardápio”.

rd83rep02img005O livro

Por ocasião do cinquentenário do Ipea, celebrado em 2014, o Grupo de Análise de Conjuntura decidiu, então, lançar-se em uma missão inédita: revisitar todos os boletins, de 1988 a 2013. São 26 anos de trabalho, quatro publicações por ano. O resultado? 104 boletins para ler, reler e repensar. “A gente viveu esta história parte como analista, parte como cidadão. As partes nas quais eu já era adulto ou estudante foram emocionantes para mim. Como diz a Miriam Leitão sobre seu livro A Saga, não se trata da história econômica, é História”, explica Estêvão Xavier.

Ao basear a publicação nos boletins, o livro vai além da história objetiva em si, descreve também a evolução da análise econômica. É a oportunidade para o público, os analistas e os estudantes refletirem sobre as transformações que a própria teoria econômica sofreu nos últimos anos. Paulo Levy exemplifica: “A discussão sobre inflação inercial (índice que soma inflação passada à expectativa futura) era algo superimportante no final da década de 1980. Hoje em dia já não se dá tanto peso a isso”, obseva Estêvão Xavier.

As avaliações da época acerca de fatos marcantes da nossa história econômica – alguns com interpretação consensual hoje – também podem surpreender quando revisitadas agora, 25 anos depois. Segundo Estêvão, é o caso do Plano Collor, de março de 1990. “O Plano Collor, que é visto como um absurdo completo agora, na época não era tanto assim. O desespero com a inflação era tão grande que as pessoas estavam topando quase qualquer coisa que prometesse uma solução. O plano foi aprovado no Congresso. Alguns fatos são vistos agora de uma maneira estereotipada. Mas, olhando mais de perto, como a gente pôde fazer nesse livro, é possível perceber que era diferente no calor da hora”.

“Entusiasta, fã incondicional do Plano Real”, segundo suas próprias palavras, Estêvão Xavier ficou encarregado de recontar o período entre julho de 1994 e o fim de 1998, tempo que abrange o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso. Segundo Estêvão, as análises do Ipea souberam reconhecer os avanços do Plano Real sobre a instabilidade brasileira, mas nunca deixaram de ter uma visão crítica sobre outros aspectos importantesda política econômica, como, por exemplo, a falta de um ajuste fiscal mais rigoroso: “Houve ajuste fiscal nos cinco anos anteriores ao Plano Real, mas, ao longo do primeiro mandato do FHC, não houve novos avanços. E essa questão é muito atual também. A falta de maior solidez na área fiscal acaba sobrecarregando a política monetária. A gente está assistindo ao mesmo filme hoje”, diz. Se faltou ajuste fiscal no primeiro mandato de FHC, o mesmo não se pode dizer do segundo. É o que assegura Fernando Ribeiro, responsável pelo período entre 1999 e o fim de 2003, que também inclui o primeiro ano do mandato de Lula. “Se tivéssemos que dar um nome para o período seria ‘ajustes’. Foi nessa fase que, finalmente, foram ouvidos os antigos apelos do grupo por uma política fiscal mais duradoura no país. “O governo FHC começa um trabalho para valer de controle das contas públicas. Também houve a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000. E aí a gente começa a ver aquela mudança de regime fiscal, que se discute desde os anos 1980. Começam as mudanças institucionais”.

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Divulgação

Coube a Maria Andreia Lameiras escrever sobre o “período mais fácil”, entre 2004 e 2008. É tempo de boas notícias, de crescimento, das contas públicas ajustadas e da queda expressiva do desemprego. Mesmo assim, à época, o grupo mantinha o tom crítico no desejo de que o crescimento fosse sustentável e que a felicidade não fosse passageira. “É recorrente, nas análises, a necessidade de melhorar os gargalos de infraestrutura, de diminuir o custo Brasil. É um período em que há ganhos de rendimentos reais. E quando há um ganho de rendimento muito acima de um ganho de produtividade, começa a haver uma pressão de custos na produção, que é um dos problemas da crise da indústria brasileira, que explode com mais força a partir de 2008 e 2009.”

rd83rep02img007Divulgação

O último capítulo do livro reconta os tumultuados fatos vividos entre 2009 e 2013, um tempo recheado de crises internacionais. Missão para o economista Leonardo Mello de Carvalho. Ele ressalta que o governo brasileiro usou o mesmo receituário para superar tanto a crise financeira internacional do fim de 2008 quanto a crise dos países europeus em 2011.

Qual seja: incentivar a demanda, mais especificamente o consumo, através da desoneração fiscal e do aumento do crédito. “Em meados de 2011, a gente chamou a atenção que existia também um problema de oferta. Só que as coisas foram caminhando para uma segunda, para uma terceira aposta do governo, que sempre preferiu o incentivo à demanda. Naquela época, nós já chamávamos a atenção para onde as coisas estavam caminhando. E, infelizmente, elas caminharam para isso. Hoje a gente tem uma situação muito mais grave.”

rd83rep02img008A serenidade com a qual Estêvão fala do presente também estampa a face de José Temporão, o dono do Mosteiro. “Agora mesmo, estamos numa crise, mas o Brasil tem muito recurso para sair de uma crise. O Brasil é um continente, o Brasil é o país do futuro, meu amigo. A todos os estrangeiros, eu digo: venha para o Brasil que você vai se dar bem”.No entanto, não é com esse sentimento pessimista que os autores estão terminando o trabalho. Eles garantem, embasados nos boletins, que houve uma melhora significativa na economia do país .

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“Não só a economia, mas também a visão da economia pela população, em geral, mudou para melhor. Muitas coisas que antes eram restritas, digamos, ao grupo pequeno dos economistas, e incompreendidas pela maioria da população, hoje já se espalharam. Vou dar dois exemplos: a aversão pela inflação, a ciência de que ela é algo que deve ser evitado. E a questão fiscal: a visão de que o governo não é uma força inesgotável de recursos. Essa noção de que você não pode querer tudo está mais clara”, diz Estêvão Xavier.


O texto dos cinco capítulos já foi concluído e agora vai para a edição. O lançamento do trabalho deve ser acompanhado por um seminário com interessados no tema e ex-coordenadores do grupo. Será a oportunidade perfeita para revirar o baú.

 
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