2004. Ano 1 . Edição 1 - 1/8/2004
"Entender a passagem para a vida adulta requer a análise da emergência de novos estilos de vida e dos variados modos de entrar na fase adulta"
Ana Amélia Camarano*
Nossa pesquisa analisa algumas formas de transição para a vida adulta, considerando as dimensões da escola, do trabalho e da família dos jovens brasileiros. Baseia-se nos dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (Pnad) de 1982 e 2002. O pressuposto é que esse processo não é mais marcado pela linearidade do modelo tradicional, não sendo mais possível prever as idades em que as etapas ocorrem, como foi no passado. Isto traz conseqüências para a formulação de políticas públicas.
A literatura aponta para duas perspectivas que têm sido adotadas na análise da transição para a vida adulta.A primeira refere-se ao trânsito da escola para o trabalho. A segunda assume um caráter mais amplo e considera todo o processo de emancipação do jovem.A transição para a vida adulta não é vista apenas como a passagem da escola para o trabalho,mas como parte de um processo complexo que envolve a formação escolar, a inserção profissional e familiar. Entender a passagem para a vida adulta requer a análise da emergência de novos estilos de vida e dos variados modos de entrar na fase adulta. Partindo destas perspectivas, buscou- se explorar as múltiplas formas de transição para a vida adulta considerando os jovens que se tornaram independentes saindo da casa dos pais e os que nela permanecem.
Dentre as modalidades em que as transições se processaram, observou-se a prevalência do modelo tradicional. Ou seja, os que a fizeram tornaram-se chefes de família, com ou sem cônjuges, deixaram a escola e ingressaram no mercado de trabalho. Novas modalidades parecem estar emergindo. Elas caracterizam-se pela continuidade dos estudos e por novos padrões de arranjos familiares, como os de mulheres chefes de família com filhos.
Observou-se que o aumento da escolarização e a difícil inserção no mercado de trabalho contribuem para o adiamento da saída da casa dos pais. Do total de jovens, cerca de 75% aí se encontram. Levanta-se uma hipótese de que a transição para a vida adulta pode estar ocorrendo mesmo na casa dos pais, o que se denomina transição parcial.Nesse grupo encontram-se os jovens que deixaram a escola, ingressaram no mercado de trabalho,mas moram com os pais.
Outra hipótese considerada é a de que a 'independência' econômica pode não ser condição única para a transição para a vida adulta. Os jovens mais velhos que não saíram de casa estão em melhores condições socioeconômicas que os jovens chefes mais novos. Eles têm maior escolaridade,bem como maior renda, o que lhes possibilita contribuir com aproximadamente 36% da renda do domicílio de seus pais.Residir com os pais pode indicar uma relação de dependência em duas direções: dos filhos com os pais e também dos pais com os filhos.Nesse último caso a dependência pode ser tanto financeira quanto de apoio emocional e afetivo.
Os resultados enfatizam a multiplicidade de situações em que as transições para a vida adulta podem ocorrer. Sugere-se que os processos são marcados por trajetórias não lineares das fases da vida, podendo, por exemplo, os filhos virem antes do casamento, o casamento antes da inserção no mercado de trabalho e assim por diante.Na mesma direção, considera-se que essa transição pode ocorrer em novos arranjos familiares que não passem pela saída da casa dos pais.
As etapas do processo de transição carregam ainda possibilidades de reversão. Assim, o jovem de hoje pode ter maior disponibilidade para situações que suscitem movimentos de idas e vindas entre a casa paterna e a sua própria.
Ana Amélia Camarano é pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), no Rio de Janeiro
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