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Sociedade - A vida no campo melhora

2004. Ano 1 . Edição 1 - 1/8/2004

A pobreza diminui no interior

A taxa de pobreza na zona rural caiu 9,8 pontos porcentuais em dez anos, graças ao pagamento da aposentadoria.

Paulo Julio Clement

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O catarinense Camargo e a família: investimento com que sobra da
aposentadoria

No município de Nova Olinda, sertão do Cariri,Ceará, o casal Pedro Fernandes da Silva, 74 anos, e Maria Félix, 70 anos, prepara-se para erguer uma casinha ao lado daquela onde mora, num terreno doado pela prefeitura. O dinheiro para o material virá da aposentadoria que recebem. Nada mal para quem vive numa região pobre e passou a vida de enxada na mão.A milhares de quilômetros dali, em São José do Cerrito, oeste de Santa Catarina, vive o casal de agricultores Adão Camargo, 62 anos, e Maria Neuza, 61 anos.Uma parte da aposentadoria que recebem é investida em sua propriedade na qual ainda trabalham. O dinheiro da Previdência faz uma diferença enorme na vida dos dois casais, cujos casos são uma amostra da grande transformação que vem ocorrendo no campo, em todo o Brasil. A chave da mudança é a aposentadoria rural, estabelecida pela Constituição de 1988 e regulamentada por lei em 1991.A partir desse ano os homens com 60 anos e as mulheres aos 55 passaram a ter direito a receber um salário mínimo, mesmo sem terem contribuído para a Previdência.A novidade configurou um maciço programa de transferência de renda, embora tenha contribuído para o aumento de déficit do sistema previdenciário.

O impacto sobre a redução da pobreza foi expressivo, como revela uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e divulgada em janeiro: a taxa de pobreza na área rural caiu 9,8 pontos percentuais em dez anos, pois 59% dos trabalhadores viviam abaixo da linha de pobreza em 1992 e em 2001 esse porcentual caiu para 49,2%.No caso dos considerados extremamente pobres o porcentual caiu de 33% para 25,3%.A linha de pobreza no meio rural varia de região para região. Em média, quem tinha renda familiar per capita menor do que 102 reais em setembro de 2001 era considerado pobre e quem tinha renda mensal inferior a 51 reais era tido como extremamente pobre.

No mesmo compasso, registrou-se um salto na qualidade de vida das pessoas. O estudo, denominado Pobreza Rural e o Trabalho Agrícola no Brasil ao Longo da Década de 90, foi feito pelos pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Mirela de Carvalho e Samuel Franco, do Ipea do Rio de Janeiro. Na avaliação de Barros,o dinheiro da Previdência Social é responsável por cerca da metade da elevação da renda per capita dos habitantes do campo."Para padrões internacionais, uma queda de um ponto percentual por ano na taxa de pobreza é um resultado extraordinário", diz Barros.Na América Latina, apenas Brasil e Panamá conseguiram resultados semelhantes.


A vida da população rural mudou com o dinheiro da Previdência. Além de ajudar na subsistência, essa renda está fluindo para outras áreas da economia, como o comércio, a construção civil e a própria agricultura. Segundo o Ministério da Previdência, a mudança estabelecida pela Constituição de 1988 significou uma injeção de 1,06 bilhão de reais no campo em abril de 2004. Atualmente beneficia 4,4 milhões de pessoas (42% a mais do que em 1992). Parece pouco dinheiro quando se olha para os números da economia brasileira,mas em áreas de grande pobreza, em comunidades afastadas dos grandes centros industriais, o efeito é sensível. No período pesquisado pelo Ipea o Coeficiente de Gini (que mede a desigualdade numa escala em que zero é a igualdade perfeita e um é a desigualdade absoluta) caiu pouco, de 0,55 para 0,54 na área rural. E isso não é tudo. Nesse período, a renda domiciliar mensal per capita na zona rural subiu de 114 reais para 144 reais. Desse aumento, 15 reais vieram da Previdência. Os números da miséria no campo ainda são muito altos, sem dúvida,mas a pesquisa mostra que a pobreza se reduz a um ritmo rápido. "Se partimos do pressuposto de que a Previdência deve combater a pobreza rural, as coisas estão bem razoáveis", avalia Barros.

Melhoria no IDH Para além das estatísticas, o que se pode observar é o efeito da aposentadoria rural em comunidades pequenas, em que a economia depende fundamentalmente da produção do campo.O dinheiro gera consumo para o comércio e os serviços - e reativa as lavouras. O que se pode esperar é uma reanimação que beneficie a todos,inclusive a quem não recebe aposentadoria. No caso da cidade de São José do Cerrito,em Santa Catarina, os aposentados rurais são 2.630, na conta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais - cerca de 25% da população total. A renda do município depende,hoje,basicamente dessas pessoas. "Elas fazem girar cerca de 700 mil reais por mês, o que significa duas vezes o total da arrecadação da cidade", diz o prefeito José Maria Branco. Em comparação, o Bolsa Família, do Ministério do Desenvolvimento Social, proporciona apenas 25 mil reais por mês para 361 famílias do município.

Em Cerrito, só 1.800 pessoas moram na área urbana. Há apenas 30 lojas, que empregam 100 pessoas. A cidade está na 281ª posição entre os municípios de Santa Catarina , de acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - 20% dos habitantes não dispõem de luz elétrica e a rede telefônica não suporta mais de 20 ligações simultâneas. A população está praticamente isolada das cidades vizinhas.A BR 282 que a liga a Lajes,um município próspero, é um trajeto de alto risco. São 14 quilômetros de terra e de pedra. A estrada para a cidade de Vargem, com 70 quilômetros, é um outro pesadelo.Nela vê-se uma placa que alerta o motorista para os perigos da viagem.


Cerrito já foi maior.Tinha 18.000 habitantes há 20 anos.Mas os jovens foram embora, num processo tão conhecido pelos brasileiros nas últimas décadas. No entanto, se muitos problemas permanecem, alguma coisa mudou no município nos últimos anos.Um exemplo: na farmácia de dona Bernardina Aparecida Muniz, que estava perto de fechar, a busca por medicamentos aumentou. São principalmente remédios para clientes da terceira idade. Desde que os agricultores começaram a receber a aposentadoria, os negócios têm prosperado e novas lojas foram abertas. "Foram sete lojas nos últimos dez anos", diz Carlos Alberto Muniz Machado, presidente do Clube de Dirigentes Lojistas local. Um exemplo é Fernando Heller, empresário de 40 anos que nasceu na cidade e estudou Administração de Empresas em Florianópolis. Agora está de volta. Tem uma loja de eletrodomésticos."Vendo, em média, dez televisores por mês", conta. Há um crescente engajamento da população em atividades não agrícolas e declínio da pobreza no campo.

É em Cerrito que o agricultor Adão Camargo, aposentado há dois anos,mostra sinais de prosperidade. Ele já investiu dois mil reais em sua casa de três cômodos e na casa onde moram a filha e a neta.Camargo cria galinhas e porcos, e planta feijão,milho e fumo.Atrás da casa há uma antena parabólica.

Djanira de Souza, 56 anos, aposentada,moradora na comunidade de Santo Antônio do Pinhal, em Santa Catarina, improvisou uma modesta fábrica de queijo em sua propriedade. Faz oito quilos por dia e vende aos moradores da cidade."Dá para fazer mais de 200 reais por mês", garante.

Em Nova Olinda, no Ceará, região bem longe de Santa Catarina e com características tão diferentes, o agricultor Pedro Fernandes da Silva quer aumentar o espaço onde vive, uma casa de dois cômodos que divide com a mulher, o filho e a mãe. Em sua casa atual, a sala é decorada com retratos do padre Cícero.A família dorme em redes e a mobília é escassa.Com a aposentadoria, Pedro projeta um empreendimento. Vai construir uma nova casa.O comércio de Nova Olinda também ganhou. Segundo Maria do Socorro Sampaio, dona de uma venda na cidade, é a receita, vinda dos aposentados de Nova Olinda e de outras cinco cidades próximas que dá vida a seu negócio. Ela só lamenta o fato de o pagamento dos benefícios estar concentrado nos cinco primeiros dias úteis de cada mês: "Depois dos dias de pagamento ninguém compra", diz.


Por onde se anda, no interior pobre e rural do Brasil, pode se captar reflexos do que a aposentadoria para o trabalhador rural está provocando. À primeira vista podem ser até mesmo efeitos modestos,mas deve-se levar em conta que a lei foi mudada em 1991 e o prazo é muito curto para que se coloque em marcha um processo econômico de maior porte. O certo é que a nova lei está puxando muita gente para fora da miséria. Em Triunfo, um paupérrimo distrito de Nova Olinda, há pouco mais de uma década Francisco Rodrigues de Souza,de 69 anos, e sua mulher, Francisca Celestino Costa, de 68, estariam destinados a uma velhice sofrida.Continuam pobres, é verdade,mas vivem com alguma dignidade.Com a aposentadoria e o que colhem da terra, compraram duas casas para acomodar a família de nove pessoas. Francisco e Francisca nunca tiveram (e nem têm) terra para plantar. Usam a terra dos outros. A diferença é que, antes, também não tinham casa.Viviam em assentamentos.

O uso do dinheiro da aposentadoria varia de região para região. Segundo Guilherme Delgado, pesquisador do Ipea em Brasília, 71,2% das famílias do Nordeste dependem única e exclusivamente do dinheiro vindo da Previdência, enquanto no Sul a porcentagem cai para 41,5%. "No Sul há a alternativa do investimento na propriedade, que gera novas receitas", explica Delgado. Ao lado de José Celso Cardoso, Delgado pesquisou profundamente a situação da previdência rural e seu histórico desde a implantação do primeiro sistema de aposentadoria rural, criado em 1972. Do trabalho saiu o livro A Universalização de Direitos Sociais no Brasil, que contou com textos de outros pesquisadores e foi atualizado recentemente com dados deste início de século.O estudo se fixou nas regiões Nordeste e Sul, mas segundo Delgado dá um panorama claro da situação dos aposentados rurais.

A situação no campo não está mudando apenas em função da nova lei previdenciária.Nos últimos 20 anos o Brasil vem experimentando melhorias de escala e de qualidade na agricultura e na pecuária. O trabalho do Ipea sobre pobreza rural mostra que houve redução dos postos de trabalho agrícolas e da massa salarial de 1992 a 2001. Apesar disso, a remuneração cresceu, graças ao aumento da qualificação dos trabalhadores, reflexo da modernização produtiva no campo.Mas o estudo é taxativo:"O principal fator que explica a redução da pobreza ocorrida na década de 90 é o aumento da renda de transferências e de outras fontes não vinculadas ao trabalho". Apesar de mexer com a vida de quase cinco milhões de brasileiros, de ter sido aprovada na Constituição de 1988, e de estar funcionando efetivamente desde 1992, a aposentadoria ainda tem caráter de excepcionalidade, porque os segurados só têm direito ao benefício se comprovarem ter trabalhado em atividades rurais por pelo menos 15 anos.

O governo deu prazo até 2006 para que a questão seja resolvida. O projeto está na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara.O deputado Doutor Rosinha (PT-PR), relator do projeto, diz que a solução acontecerá rapidamente: "Até outubro teremos uma proposta formatada e tentaremos fazer com que seja votada em regime de urgência ainda esse ano na Câmara.Assim teremos a votação no Senado em 2005 e estaremos dentro do prazo estabelecido pelo governo".

A tendência, revelada na votação da Reforma da Previdência no ano passado, é de estabelecimento de um único regime, válido para todos os trabalhadores, que terão de contribuir para receber benefícios.Mas o exemplo da aposentadoria rural, considerada como um programa de transferência de renda, que tem um sistema capaz de cadastrar, controlar e fazer o dinheiro pingar no bolso dos aposentados, nos mais diversos rincões do Brasil, mostra que programas como o Bolsa Família, quando estruturados, têm o poder de mudar o mapa da pobreza no país.

 
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