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Metas do Milênio O direito à vida - Brasil precisa investir ainda mais no combate à mortalidade materna

2005. Ano 2 . Edição 12 - 1/7/2005

Exemplo mundial no combate à Aids, o Brasil desliza nos cuidados a gestantes e bebês e se arrisca a não cumprir todos os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ligados à saúde
 
Por Marina Nery, de Brasília

Em setembro do ano 2000, quando 190 países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovaram oito metas fundamentais para a diminuição da pobreza no planeta até 2015, eles dedicaram quase a metade delas - isto é, três - a questões ligadas à saúde. As metas ficaram mundialmente conhecidas como Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) porque foram definidas justamente no início do terceiro milênio, e as que tratam de saúde propõem a redução da mortalidade infantil, a melhoria da qualidade da saúde materna e o combate a Aids, malária, tuberculose e outras doenças que atingem grande parte da população. Ainda faltam dez anos para a data final do compromisso, mas existem divergências quanto à capacidade do Brasil de cumprir as metas de saúde. Indicadores atuais e exercícios feitos por especialistas no assunto estimam que o Brasil possa alcançar alguns dos objetivos, tais como conter a transmissão de doenças como a Aids e reduzir a mortalidade infantil.

Luiz Fernando de Lara Resende, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e coordenador do Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, avalia que as políticas de vacinação, reidratação oral, visitas domiciliares dos agentes de saúde e programas de educação materna tiveram um impacto bastante positivo nos indicadores brasileiros de saúde nos últimos anos. Por isso, o país conseguiu bons resultados em segmentos como o de mortalidade na infância. A taxa de óbitos infantis por 1.000 nascidos vivos menores de 1 ano, que era de 48 em 1990, estava na casa dos 25,1 em 2002 e existem estimativas de que possa chegar próxima a 16 em 2015 - a meta estipulada pela ONU. Resende enfatiza que para a estimativa se concretizar são necessários investimentos, em particular na assistência ao pré-natal, ao parto e à criança nas primeiras semanas de vida.

E se não ocorrerem tais investimentos? A situação realmente se complica, tanto que há outros especialistas mais descrentes quanto ao cumprimento das metas, como Ana Elizabeth Reymão, coordenadora do relatório de Saúde, que faz parte da Coleção de Estudos Temáticos sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). "Embora a meta do milênio seja reduzir o número de 48 mortes entre 1.000 nascidos vivos, registrado em 1990, para 16, acredito que tal dado não diminua o suficiente até 2015 ", analisa.

Porém, mais que dinheiro, o Brasil precisa encontrar uma forma de combater o velho fantasma da desigualdade a fim de solucionar seus problemas de saúde pública. As extremas diferenças brasileiras transportam-se também para regiões geográficas. O semi-árido é um exemplo nítido, mas não único, de concentração de óbitos de crianças e mães devido à falta de condições estruturais de educação, alimentação, saneamento, informação e leitos hospitalares, entre outros itens que envolvem políticas públicas. Resultado? A taxa média de mortalidade infantil nessa região é de aproximadamente 65 por 1.000 crianças nascidas vivas, mais que o dobro da média nacional, segundo o relatório "Crianças e Adolescentes no Semi-Árido Brasileiro - 2003 ", do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef, da sigla em inglês).

O efeito das desigualdades faz com que o Brasil apresente aspectos sociais constrangedores que nos posicionam ao lado de nações com as piores condições sanitárias, falta de políticas de prevenção e de atendimento hospitalares do planeta. Por exemplo, há doenças infecciosas e parasitárias, como malária e tuberculose, que continuam a representar problemas de saúde pública, principalmente em regiões específicas. Nos últimos anos, houve queda no número de exames positivos de malária, mas a doença ainda está bastante concentrada na Amazônia Legal, com 99% dos casos na região Norte, além dos estados de Maranhão e Mato Grosso. Neste último estado, há uma boa notícia: uma significativa redução, de cerca de 198 mil exames positivos, em 1992, para 5 mil em 2003, resultado de intenso trabalho de controle.

A tuberculose, que já constituía um sério problema, passou a ter suas modestas taxas de redução refreadas pela associação com a Aids. Nos anos 90, as regiões mais atingidas eram Norte e Nordeste, mas o Sudeste passou a concentrar 48,24% dos casos em 2001. No total, estima-se que existam 85 mil novos casos e 3 mil mortes por tuberculose a cada ano.

Em relação às doenças de elevada disseminação, o maior sucesso foi obtido na luta contra a Aids, cuja taxa de letalidade nos primeiros anos de epidemia era de 100% (1995) e diminuiu para 50% (1999). "Entre os indicadores positivos para as Metas do Milênio estão justamente as políticas relacionadas ao combate à Aids, como, por exemplo, a boa distribuição de medicamentos ", ressalta Ana Elizabeth Reymão. Os números de casos de Aids estabilizaram-se devido às campanhas e à mobilização da sociedade, com o uso de camisinha e o não-compartilhamento de seringas. "O Brasil tem sido referência no tratamento de Aids no mundo todo ", enfatiza Resende, para quem o Objetivo 6 (Aids) será atingido.

Vida real Histórias como a da dona-de-casa Francineide Silva mostram que o Brasil é um país de contrastes - nos problemas e nas soluções. Aos 26 anos, ela deu à luz a pequenina Gabriella, que nasceu, com apenas 38 centímetros de comprimento e pouco mais de 1 quilo de peso, alguns dias antes de completar o sétimo mês de gestação. No dia 12 de abril, ao olhar para a filhinha, tão indefesa, com dreno no pulmão esquerdo, Francineide conta que só sabia chorar. Ela não tinha noção de que, nos dois meses seguintes, a filha corria sério risco de transformar-se em mais um número na estatística de 25,1 crianças mortas com menos de 1 ano de idade por 1.000 nascidas vivas. O Japão, um exemplo de estatísticas positivas no campo da infância, apresenta números bem diferentes: 3,2 óbitos por 1.000 crianças nascidas (2000). Já o Chile registra 7,8 óbitos por 1.000 nascidos vivos (2002).

 

É bem verdade que a mortalidade infantil - no primeiro ano de vida -, na média, decresceu no Brasil nas últimas duas décadas, porém ainda apresenta graves problemas no período neonatal. Dois terços das mortes até o primeiro ano de idade ocorre até os 27 dias de vida, isto é 16,4 óbitos por 1.000 nascidos vivos. Um contraste em relação ao período pós-neonatal (de 28 a 364 dias de vida), com 8,5 óbitos por 1.000 nascidos vivos. Essa concentração no período neonatal é o grande desafio das próximas décadas. "Conclui-se que as políticas públicas precisam se dedicar às causas da mortalidade infantil relacionadas às condições da gestante, do parto e do recém-nascido ", informa Adson França, coordenador do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal. Logo, a tendência da mortalidade neonatal deverá ser um dos aspectos prioritários para que seja atingida a meta de 2015. A situação melhora ao analisar-se as crianças maiores, até 5 anos, lembrando que, conceitualmente, elas são contabilizadas no que chamamos de Taxa de Mortalidade na Infância, ao contrário da Taxa de Mortalidade Infantil, que se refere apenas às crianças com menos de 1 ano. Na década de 90, caíram bastante as mortes de crianças até 5 anos graças às maciças campanhas de vacinação e técnicas de prevenção. O caso do sarampo é emblemático. Principal causa de mortalidade na infância até a primeira metade da década de 80, a doença provocou, somente em 1980, 3 mil óbitos de crianças com menos de 5 anos. Esse número caiu para 400 em dez anos, depois que a cobertura nacional por vacina contra sarampo passou de 79% para excepcionais 100% em 2000.

As políticas públicas tiveram impacto também na queda das taxas de mortalidade na infância causadas por diarréias e infecções respiratórias agudas. Foram as bem-sucedidas campanhas do "soro caseiro " - que orientaram os pais a fazer a reidratação oral - as grandes responsáveis pela diminuição de 59% na mortalidade por doença diarréica e de 45% por infecções respiratórias em menores de 5 anos de idade, entre 1990 e 2001.

Mas infecções respiratórias e diarréias ainda contribuem muito - além, é claro, das condições de atendimento hospitalares - para aumentar os óbitos no período neonatal. Os mais atingidos são os nascidos com baixo peso e os prematuros. Ambas as condições ocorreram com a pequenina Gabriella. A mãe, Francineide, estava em sua casa, no Guará, cidade-satélite do Distrito Federal, quando acordou no meio de uma poça de sangue. "Pronto, perdi minha filha ", pensou. A partir de então, correu para o hospital e quase passou por um procedimento médico incorreto, o que só não aconteceu porque ela aprendeu, durante o pré-natal, que precisava de uma ultra-sonografia para saber se o bebê estava bem, ao contrário do que dizia a médica, que só de auscultar a barriga declarou que ela havia perdido a filha.

Exemplo do país de contrastes, a mãe que recebeu informação de qualidade não tinha, porém, infra-estrutura à disposição. "O hospital não estava equipado com a máquina de ultra-sonografia e saímos atrás de outras unidades ", lembra. Ela não sabia que, naquele momento, entrava para mais um grupo estatístico, aquele que aponta a freqüente peregrinação de gestantes por diversos hospitais até conseguir atendimento. "A inexistência de leitos e de um sistema de referência formalizado para o parto obriga as mulheres a perambular em busca de vagas ", afirma França.

Maternidade A morte de uma mulher em conseqüência de gravidez, aborto ou parto foi durante muito tempo considerada uma fatalidade. Mas hoje está bastante claro que esse tipo de óbito pode estar diretamente ligado à deficiência da qualidade dos serviços de saúde. "Os índices de mortalidade materna são uma vergonha nacional, pois a maior parte deles, talvez 80%, é evitável. Isso é uma agressão aos direitos humanos ", destaca França.

Os cálculos dos indicadores referentes à mortalidade materna são bastante problemáticos tanto no Brasil quanto em todo o mundo, pois apresentam sérios desvios no momento da notificação dos óbitos. "Na verdade, o sistema de indicadores do Brasil está entre os melhores do mundo, mas ainda tem falhas em alguns pontos, como no caso da mortalidade materna, que depende de um diagnóstico preciso da causa do óbito e de sua notificação às autoridades de saúde por parte do médico ", adverte Resende, do Ipea. Contudo, ainda assim, ele defende ser viável alcançar o objetivo, dependendo da constância do nível de investimento nos próximos anos. "Precisamos trabalhar para obter indicadores mais consistentes que permitam um correto acompanhamento do problema e o estabelecimento de uma adequada atuação ", adverte.

 

A professora Reymão concorda. "Há muita dificuldade em identificar as causas de óbitos de mulheres ", alerta. Em outras palavras, o índice de mortalidade materna é alto no Brasil, mas, na prática, é ainda maior porque as estatísticas sofrem uma espécie de desvio devido a um tipo de sub-registro de mortes, como o preenchimento inadequado da declaração de óbito. Tanto é que vários institutos utilizam técnicas para aproximar os números oficiais da realidade. Os dados calculados nos sistemas de informação do Ministério da Saúde indicam a taxa de aproximadamente 50 mortes para 100 mil nascidos vivos. A esses dados se aplica um fator de correção, o que eleva a referida taxa para 74,5 óbitos por 100 mil nascidos vivos.

No caso de Francineide Silva, quando a médica informou que sua criança estava morta no ventre, houve um erro de diagnóstico. A pequenina Gabriella tinha apenas 29 semanas de gestação quando veio ao mundo. "Foi um sufoco na UTI ", lembra a mãe. Mesmo com uma cesariana, a menina sofreu hemorragia cerebral de terceiro grau e o parto colocou em risco a vida de Francineide.

O pré-natal realizado pela dona-de-casa totalizava cinco consultas. "Na década de 90, o pré-natal computou 2,2 consultas, em média, número que subiu vertiginosamente para 5,1 em 2003. É uma vitória, um salto quantitativo. Só que ele não veio acompanhado de um salto de qualidade. É bom lembrar que a Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza um mínimo de seis consultas ", alerta França. "No Brasil, faz parte do cotidiano das gestantes consultas rápidas, sem exames clínicos e laboratoriais adequados, além da falta de identificação da gravidade do risco gestacional para acompanhamento apurado, predispondo-as ao óbito materno e neonatal. "

Não é de espantar que as taxas de mortalidade materna nas regiões em desenvolvimento tenham sido 20 vezes maiores que nas regiões desenvolvidas - diferença de 440 mortes para 20 óbitos em cada 100 mil nascidos vivos (Unicef, 2000). As causas diretas mais freqüentes de óbito materno são as doenças hipertensivas (eclâmpsia e pré-eclâmpsia, entre outras), hemorragias e infecção puerperal. As causas indiretas são doenças prévias da mãe que são desenvolvidas ou agravadas na gravidez. "Os profissionais de saúde muitas vezes não pedem nem mesmo o exame de urina, capaz de identificar infecções ascendentes, que podem levar à ruptura da bolsa amniótica e ao parto prematuro, uma das principais causas de óbito neonatal no Brasil ", informa França.

É paradoxal que a mulher, ao trazer uma nova vida ao mundo, acabe perdendo a própria. Mas, quando sofreu a cirurgia de emergência para que Gabriella nascesse, Francineide só pensava na saúde da menina. "Meu maior desespero foi pensar que ela nunca viria para os meus braços ", recorda. A sorte dela é que, depois da peregrinação, havia finalmente chegado a um hospital público de primeira linha, o Hospital Materno-Infantil de Brasília (HMIB), com a maior Unidade de Terapia Intensiva infantil da América Latina - 44 leitos - e premiado pelo Unicef como Hospital Amigo da Criança. Foram dois meses de luta para o bebê após o nascimento, mas tudo acabou bem. No último dia 10 de junho, acompanhamos a alta de Gabriella, que finalmente pôde conhecer sua casa. E o que é melhor: sem seqüelas. Se o país se comprometer a melhorar os indicadores de saúde e cumprir os Objetivos do Milênio, o final será feliz para quase todos.

 
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